Título: Irã veta entrada de inspetores
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Fonte: Correio Braziliense, 22/06/2010, Mundo, p. 25

Medida atende a uma lei que restringe a cooperação com agência atômica da ONU

Menos de uma semana depois de o Parlamento iraniano ter aprovado um projeto de lei determinando ao governo que reduza a cooperação com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Teerã impediu o acesso de dois inspetores a instalações nucleares. Segundo a explicação oficial, os especialistas teriam prestado informações falsas à AIEA e divulgado dados oficiais sem permissão. A agência defendeu os dois profissionais e reafirmou sua ¿plena confiança¿ no trabalho desempenhado em território iraniano, mas cedeu aos apelos para enviar outros inspetores.

O estopim teria sido o depoimento dos especialistas da AIEA em uma reunião de autoridades da agência em Viena, em 31 de maio, quando foi divulgado que o Irã aumentou o número de centrífugas para enriquecer urânio. ¿Demos à AIEA o nome de dois inspetores da agência que apresentaram informações falsas sobre as atividades nucleares do Irã. Com base no Acordo de Salvaguardas, proibimos sua entrada para inspeções¿, disse o chefe do programa nuclear iraniano, Ali Akbar Salehi, em entrevista à agência de notícias Isna. ¿Esses dois inspetores não têm o direito de vir ao Irã porque (também) vazaram informações antes que fossem oficialmente anunciadas¿, acrescentou.

Salehi, no entanto, descartou a ideia de impedir de vez as inspeções da AIEA. ¿Nós cumprimos com as nossas obrigações internacionais e não ignoramos os nossos direitos¿, disse. Como signatário do Tratado de Não Proliferação (TNP), o Irã se compromete a ser monitorado periodicamente pela agência, mas tem o direito de rejeitar inspetores específicos. Na última quarta-feira, o Majlis (Parlamento) decidiu que o governo deve reduzir a colaboração com a AIEA aos ¿limites mínimos¿ especificados no TNP.

Em um comunicado, o porta-voz da agência, Greg Webb, rejeitou as acusações contra os dois especialistas ¿ os nomes e as nacionalidades não foram divulgados. ¿A AIEA tem plena confiança no profissionalismo e na imparcialidade dos inspetores¿, disse Webb, completando que o relatório sobre a implementação de salvaguardas no Irã, feito pelos dois e divulgado no último dia 31, é ¿completamente preciso¿.

Autoridades em Viena, no entanto, acreditam que a recusa do Irã a receber os dois inspetores se deve mais às sanções aprovadas há duas semanas no Conselho de Segurança da ONU do que às informações divulgadas pela AIEA. Segundo um funcionário da agência ouvido pelo jornal americano The Washington Post, a ação de Teerã foi ¿completamente simbólica e, provavelmente, vai soar bem internamente¿. ¿Eles precisam reagir de alguma forma¿ mas, no fim das contas, ainda poderemos realizar nosso trabalho¿, disse a fonte.

Esperança Depois de se reunir em Viena com o representante de Teerã junto às Nações Unidas (e à AIEA), Ali Asghar Sultanieh, o chanceler brasileiro, Celso Amorim, disse que ainda acredita na possibilidade de um acordo para a troca do urânio iraniano. ¿Acho que as sanções tornaram (a negociação) mais difícil, em vez de mais fácil. Mas não acho que a tornem impossíveis. Se houver boa vontade e flexibilidade, ainda será possível encontrar um acordo¿, declarou a jornalistas na capital austríaca. O ministro se disse ¿esperançoso¿ de que a Declaração de Teerã, assinada por Brasil, Irã e Turquia no último mês, sirva de base para um acordo.

Em entrevista ao jornal britânico Financial Times, contudo, Amorim disse que o Brasil não vai mais tomar a frente das negociações entre o Irã e o Ocidente. ¿Queimamos os dedos fazendo coisas que todo mundo dizia serem úteis e, no fim das contas, descobrimos que algumas pessoas não aceitavam `sim¿ como resposta¿, alfinetou, em clara referência ao governo americano. ¿Se precisarem de nós, podemos continuar sendo úteis. Mas não vamos agir de novo por iniciativa própria, a menos que nos peçam.¿

Se houver boa vontade e flexibilidade, ainda será possível encontrar um acordo¿ Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores