Título: Supremo aceita denúncia contra Azeredo
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 04/12/2009, Política, p. A7
Após três dias de debates, o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou, ontem, a denúncia contra o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) no caso que ficou conhecido como mensalão mineiro. Por cinco votos a três, os ministros concluíram que o Ministério Público deve aprofundar as investigações para apurar o desvio de pelo menos R$ 3,5 milhões dos cofres de Minas Gerais para a campanha à reeleição de Azeredo ao governo local.
Com o resultado do julgamento, Azeredo terá de responder a ação penal por peculato e lavagem de dinheiro. Há outros 14 acusados, mas eles vão responder ao processo na 1ª instância da Justiça por não terem foro privilegiado.
Ao saber da decisão, Azeredo divulgou nota na qual afirma que a ação no Supremo será "oportunidade para que seja comprovada minha correção como agente público. Ao longo do processo que se inicia, poderei reapresentar minha defesa, confiando no trabalho isento e técnico dos ministros daquela Corte".
O julgamento foi marcado por debates entre ministros que identificaram indícios de crimes por parte de Azeredo e outros que não viram provas da participação direta dele no esquema de desvio de dinheiro para a sua campanha.
"A denúncia não aponta nenhum ato praticado por Azeredo, mas apenas relata conclusões no sentido de terem sido desviados valores oriundos de contratos com o governo de Minas para a campanha", afirmou o ministro Dias Toffoli, que havia pedido vista do processo no dia 19. "A denúncia imputa a ele todos aqueles fatos pela simples circunstância de ele ter sido governador de Minas."
O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, ficou contrariado com o voto de Toffoli e reclamou publicamente. "Vossa Excelência parece que não me ouviu e não leu os autos", disse Barbosa. Ele leu depoimentos de secretárias que viram Azeredo participar de reuniões para o financiamento de campanha com a presença do publicitário Marcos Valério - o mesmo do mensalão petista, que utilizava as suas agências para supostamente lavar dinheiro obtido ilegalmente de empresas estatais: "O acusado participou em tese da etapa do recebimento de recursos publicos de empresas estatais e da etapa de lavagem por meio de empresas de Marcos Valério", continuou Barbosa. "Como governador, ele era o controlador das estatais. Presidentes de estatais vieram a ocupar cargos no comitê de campanha. Ministro Toffoli, isso é grave."
Toffoli preferiu não polemizar e a sessão chegou a ser suspensa. Em seguida, os ministros Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Marco Aurélio Mello acompanharam o voto de Barbosa.
Para Lewandowski, o Ministério Público obteve vários indícios de autoria de Azeredo, como depoimentos, ligações telefônicas, documentos e perícias. "Até para guardar coerência com os votos que proferi anteriormente", disse Lewandowski, que foi favorável à abertura de processo no caso do mensalão petista, "acompanho Barbosa e recebo a denúncia".
"Esse esquema parece até reprise de um filme", completou Ayres Britto. Para ele, Valério "era um agente que não entendia nada de publicidade, mas muito de finanças." "Caixa dois é uma desgraça no âmbito dos costumes políticos eleitorais brasileiros", concluiu Britto. "O Supremo não é cemitério de inquéritos e de ações penais contra quem quer que seja", disse Marco Aurélio.
Já Toffoli foi acompanhado por Eros Grau e pelo presidente do STF, Gilmar Mendes. Para Grau, o MP acusou Azeredo unicamente pelo fato de ele ter sido o maior interessado em obter verbas para a sua campanha. "O fato de Azeredo exercer o cargo de governador, sendo o principal interessado na arrecadação de fundos para a sua campanha, não é por si só suficiente para receber a denúncia", afirmou. Grau ressaltou ainda que, no julgamento do mensalão do goveno Lula, rejeitou as denúncias contra Luiz Gushiken e José Genoino, respectivamente, ex-ministro do governo e ex-presidente do PT, por entender que as acusações se baseavam em ilações. "Não encontrei prova de que o governador tenha enviado ofício a estatais determinando repasses às agências de publicidade", continuou Grau.
Mendes advertiu que o STF não deve atuar como mero carimbador de denúncias do MP e, por isso, fez o exame minucioso em ambos os mensalões. "Receber a denúncia para ter de absolver alguém num processo dessa complexidade, com o ônus político que isso representa, é de extrema gravidade", disse Mendes. Para ele, o MP não trouxe provas suficientes contra Azeredo.
O mensalão mineiro é considerado o esquema embrionário do mensalão petista, inclusive tendo em comum o publicitário intermediador Marcos Valério. Segundo o MP, no esquema mineiro, estatais patrocinavam eventos, pagavam agências de Marcos Valério e, em seguida, o publicitário remetia verbas para a campanha política do governador.
No caso petista, o STF determinou a abertura de ação contra 40 acusados. Um deles - Silvio Pereira, ex-secretário geral do PT - concordou em prestar serviços comunitários e não responde mais ao processo. Os demais devem ir a julgamento no STF, o que só deve acontecer em 2011.
Não há prazo para o julgamento final de Azeredo.