Título: Brasil quer garantia contra "protecionismo verde
Autor: Chiaretti , Daniela
Fonte: Valor Econômico, 10/12/2009, Especial, p. A10

O Brasil quer uma cláusula específica que proíba protecionismo relacionado às mudanças do clima, mas os Estados Unidos, temendo perda de competitividade, preferem um texto mais vago e genérico. Este embate tem sido travado em uma das salas do Bella Center, em Copenhague, durante a CoP-15 e, em alguns rounds, envolve também a União Europeia. Fica claro que a discussão climática cada vez mais envolve aspectos econômicos.

Na terça-feira, quem ouvia os negociadores falarem no grupo de trabalho dos impactos da mitigação dos gases-estufa entendia que ali se discutia comércio internacional. O negociador brasileiro, Leandro Waldvogel, rebatia a posição dos delegados americanos que querem manter o artigo 3.5 da Convenção do Clima e não acrescentar nada mais a ele. "Não se pode transferir o custo da mitigação para outro país", dizia Waldvogel, interpretando o impacto da proposta americana.

Por esse artigo da Convenção do Clima (a UNFCCC, na sigla em inglês) , "as medidas adotadas para combater a mudança do clima, inclusive as unilaterais, não devem constituir meio de discriminação arbitrária ou injustificável ou restrição velada ao comércio internacional".

Os EUA querem manter este texto porque ele veta a discriminação "arbitrária e injustificável". O problema é que o argumento é subjetivo e os países ricos poderão dizer que suas eventuais tarifas de carbono contra produtos de países emergentes não são nem arbitrárias nem injustificáveis. É o chamado "protecionismo verde".

O Brasil acredita que nenhum país que assina a Convenção de 1992 deve adotar medidas comerciais unilaterais com o objetivo de combater a mudança do clima. Tais medidas comerciais, além disso, devem ser adotadas com consentimento mútuo, segundo a posição brasileira.

"Queremos evitar que este debate contamine a discussão do clima e fique no âmbito da OMC", disse Sergio Serra, um dos negociadores brasileiros. Quando isso não é possível, o Brasil assume uma posição defensiva: "Caso contrário, nossas exportações podem se complicar". Serra reforça, no entanto, que os produtos brasileiros são fabricados a partir de matriz energética limpa, o que reduz sua pegada de carbono e se traduz em vantagem competitiva.

Este debate, no entanto, avança pelos textos do acordo climático. A Europa, por exemplo, não cede na sua posição sobre o que fazer com as emissões da aviação. O bloco europeu quer uma regra global que envolva todas as empresas aéreas do mundo - e aí não importa se são de países desenvolvidos, com metas obrigatórias de redução, ou de países em desenvolvimento.

Os setores aéreo e marítimo respondem por cerca de 5% das emissões de gases-estufa. Esta é uma das matemáticas mais difíceis de serem computadas no acordo do clima. É fácil entender o motivo. Em um voo de uma companhia aérea francesa entre o Brasil e a Alemanha, as emissões são da companhia aérea, do Brasil ou da Alemanha? E quando o avião passa sobre o Atlântico?

A posição europeia é que todas as companhias aéreas sejam submetidas à mesma regra. E já avisa que, se isso não ocorrer, irá impor, a partir de 2012, às empresas estrangeiras medidas que as enquadrem nas mesmas condições que as suas. Poderia, por exemplo, fazer com que as empresas estrangeiras tenham que comprar permissões de emissão se quiserem voar para a Europa. Isto nada mais é do que uma taxa de carbono com outro nome.

Nos últimos meses, o termo "border tax" tem aparecido com mais regularidade. A taxa ou imposto de fronteira é uma expressão nova nessa discussão, que surge quando se discutem os impactos da lei de energia e clima dos Estados Unidos ou algumas medidas europeias. Trata-se de uma taxa de carbono que alguns países ricos querem impor a produtos de países em desenvolvimento que não adotarem metas de emissões.

"Já estamos muito alertas para que as medidas de proteção às mudanças climáticas, que são absolutamente legítimas, não se transformem em protecionismo disfarçado", disse Luis Alberto Figueiredo Machado, o chefe dos negociadores brasileiros. "Se um país industrializado começar a taxar o produto que importa de um país longínquo porque houve emissão, isso poderá causar impacto na economia dos países exportadores." Segundo ele, alguns países africanos já estão sentindo esse efeito.

A jornalista viaja a Copenhague com bolsa da Climate Change Media Partnership