Título: Mudança nos cálculos pode reduzir valor das elétricas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 10/12/2009, Empresas, p. B8
A proposta de aditivo contratual feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que altera a forma de cálculo das tarifas para neutralizar os ganhos das distribuidoras com o crescimento não previsto de seus mercados, trará forte impacto para a rentabilidade das empresas e o assunto preocupa seus acionistas. Um estudo do Santander realizado com as seis principais elétricas de capital aberto - Eletropaulo, CPFL, Light, Coelce, Copel e Cemig - mostra que o ganho acumulado seria de R$ 2,6 bilhões no atual ciclo de revisão tarifária, iniciado em 2007.
Se levado em conta o último ano do ciclo, que é quando os ganhos são potencializados, o valor seria de R$ 900 milhões ou o equivalente a 8% da capacidade de geração de caixa dessas companhias. Já o ganho acumulado de R$ 2,6 bilhões corresponderia a 5% do valor de mercado dessas empresas. Usando os mesmos critérios do Santander, o Valor acrescentou ainda outras duas companhias ao estudo, EDP e Neoenergia. O ganho acumulado chegaria a R$ 3,4 bilhões. O estudo não leva em consideração os ganhos passados.
De acordo com o analista responsável pelo estudo, Márcio Prado, do Santander, os 5% do valor de mercado das companhias é o potencial de desvalorização das empresas, na média, caso a fórmula de cálculo das tarifas seja de fato alterada. Em seu estudo ele usou como premissa um crescimento de 5% do mercado. As companhias foram procuradas, mas nenhuma delas comentou o assunto. Algumas alegaram que os executivos responsáveis não foram encontrados. Outras, como a Endesa e a CPFL, deram respostas quase idênticas alegando que "não foi erro de cálculo". Nenhuma delas, entretanto, contestou os números apresentados.
Das empresas analisadas, a AES Eletropaulo seria a mais impactada, até por ser só distribuidora e não ter em seus resultados atividades de geração e transmissão. O efeito acumulado seria 9,4% no seu valor de mercado, ou cerca de 12% do seu lucro antes dos impostos, juros, amortização e depreciação (lajida) será gerado pela chamada gordura da parcela A. A Light viria em segundo com quase 10% e a CPFL e a Coelce (Endesa), com 8%. Já a Cemig teria o menor impacto, de cerca de 4,7% do seu lajida no último ano do ciclo.
A chamada "gordura" da parcela A acontece quando o mercado consumidor cresce mais do que o previsto pelas empresas. A cada ano elas aumentam sua receita, mas os gastos com os encargos continuam os mesmos. É como se dez colegas de trabalho se reunissem para comprar o presente para o chefe. O presente custa R$ 100 e cada um tem que pagar R$ 10. Nesse meio tempo outros dois colegas unem-se ao grupo. Mas o administrador da operação cobra os mesmos R$ 10 de cada um dos novos participantes e mantém o mesmo valor para os que já estão participando, mesmo sem o valor do presente ter se alterado.
O ganho de R$ 20 do exemplo fica então com aquele que se dispôs a administrar o grupo e não é distribuído com os participantes. No caso das tarifas de energia, o ganho não é repartido com os consumidores.
No caso das distribuidoras de energia, o ganho não é uniforme durante os quatro anos do ciclo de revisão tarifária. Eles cumulativamente ficam maior a cada ano. Como a fórmula - mesmo que distorcida - é a que está prevista nos contratos das empresas de distribuição, a Aneel entende que não houve erro no cálculo das tarifas, mas também entende que é preciso corrigir essa distorção. As distribuidoras de energia estão tentando se unir por meio da Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia (Abradee), mas a entidade continua não falando com a imprensa. As empresas individualmente, por sua vez, têm tentado uniformizar o discurso, mas não entram em detalhes.
Nesta semana, a Aneel convocou reunião para discutir a audiência pública dos aditivos dos contratos e as distribuidoras não compareceram. Apenas um representante da Abradee e de uma distribuidora estavam presentes, mas não fizeram comentários. A diretora da Aneel Joísa Dutra Saraiva, que durante a audiência criticou a atitude das distribuidoras, diz que na semana que vem será realizada uma reunião com todas elas para discutir o assunto. Da contribuição feita pela Abradee no processo, a diretora chama a atenção para o fato de que a associação dá a entender que esse assunto não é de competência da Aneel. Um outro diretor lembra que as distribuidoras, principalmente as privadas, e que sempre defenderam a independência da agência estão agora, quando lhes é conveniente, atribuir competências ao Ministério da Energia, politizando o assunto.