Título: Ibama libera Belo Monte com 40 exigências
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 02/02/2010, Brasil, p. A3

Depois de mais de duas décadas de discussão, o governo federal autorizou ontem o leilão da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, que deverá ocorrer no começo de abril. A licença ambiental foi emitida com 40 condicionalidades e a exigência de investimentos extraordinários de R$ 1,5 bilhão por parte dos construtores. Esse valor poderá elevar o custo da energia gerada na usina, previsto anteriormente por bancos de investimento em cerca de R$ 70 por MWh .

Os recursos serão destinados a minimizar impactos ambientais da construção e para dar contrapartidas sociais à população. Essa quantia poderá elevar o valor total das medidas compensatórias para além dos R$ 2,5 bilhões antes previstos pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para os custos socioambientais do projeto. Há previsões de outros custos socioambientais no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que não o R$ 1,5 bilhão. Soma-se, ainda, um valor fixo, definido em lei, de 0,5% do total da obra, referente à compensação financeira. Esse é um percentual que os empreendedores devem repassar ao Estado do Pará, onde se localizará a usina, e aos municípios afetados pela obra. O Ministério de Minas e Energia prevê, atualmente, investimentos totais de R$ 20 bilhões para que a hidrelétrica comece a gerar em 2015.

A usina de Belo Monte aprovada ontem é apenas uma sombra do projeto original, da década de 80. Quando concebida, seria um complexo de quatro usinas no rio Xingu, com uma área alagada de 1,2 mil km2. A hidrelétrica que recebeu a aprovação prévia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) tem capacidade de 11.233 megawatts (MW), mas com a área alagada de 516 km2 gerará ao longo do ano apenas 4.428 MW de energia firme.

Com isso, apesar do porte, a usina de Belo Monte terá um reservatório menor - e, por consequencia, gerará menos energia - em relação à sua capacidade instalada - 0,05 km2 por MW.

Para o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, a decisão final do governo foi um meio do caminho, sem vencedores ou perdedores entre ambientalistas e técnicos da área energética. "Do ponto de vista energético, o projeto não é ótimo, mas é melhor gerar pouco do que ter de acionar térmicas, que poluem mais."

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, disse ontem, em entrevista coletiva, que a liberação da licença prévia de Belo Monte e a a redução do desmatamento da Amazônia eram os maiores desafios do ministério. "É a maior obra do PAC [Plano de Aceleração do Crescimento] e a mais polêmica."

Segundo Minc, a cobrança de R$ 1,5 bilhão transferirá aos empreendedores um custo que, se não fosse calculado, ficaria para a população. "O presidente colocou como pré-condição melhorar a qualidade de vida da população local." Segundo Roberto Messias Franco, presidente do Ibama, serão 12 mil famílias desalojadas ou afetadas indiretamente. "E R$ 1,5 bilhão não vai inviabilizar a obra."

O valor extraordinário de investimento socioambiental - que também foi previsto no licenciamento das usinas do rio Madeira, Jirau e Santo Antônio - prevê gastos em habitação, saneamento básico e proteção ambiental, para mitigar os impactos sobre a fauna e flora locais. Segundo Minc, a licença prévia antecipou uma série de exigências que poderiam ser feitas nas licenças de instalação (para início das obras) ou operação (para acionamento da usina).

O processo de análise da licença no Ibama foi bastante conturbado. Ontem, Minc lembrou de seus atritos com o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, que chegou a marcar data para a divulgação da licença. Ao longo do embate, o diretor de licenciamento do instituto, Sebastião Custódio Pires, e o coordenador-geral de infraestrutura de energia, Leozildo Tabajara, pediram demissão do cargo. Ontem, o novo diretor, Pedro Bignelli, disse que os técnicos do instituto nunca pensaram em inviabilizar o projeto, que deverá ser um dos atrasos mais destacados no próximo balanço do PAC.

Para Cristiano Amaral, vice-presidente da Abiape, associação que reúne os autoprodutores de energia, R$ 1,5 bilhão parece ser um valor alto considerando um investimento estimado pelas empresas de R$ 30 bilhões. A compensação ambiental corresponderá a 5% do custo da usina. "Compromete o projeto, a energia pode ficar mais cara", diz. A preocupação do dirigente em relação ao preço tem uma razão. Diferentemente dos outros investidores, que passarão os custos à tarifa, os autoprodutores serão consumidores diretos, e energia mais cara significa perda de competitividade. (Colaborou Samantha Maia, de São Paulo)