Título: Consumo do do início do ano fica acima do previsto
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 17/02/2010, Brasil, p. A3

O ano começou forte para o comércio varejista, embalado pelo bom momento do mercado de trabalho e pela ampla oferta de crédito. As vendas superaram as previsões das grandes redes, tanto em janeiro como em fevereiro, com altas de 15% a 27% em relação ao mesmo período do ano passado. A base de comparação é fraca, devido ao auge do impacto da crise global, mas mesmo assim o resultado é muito expressivo, pois o comércio registrou uma retração bem mais modesta no começo do ano passado do que a indústria. Enquanto nos 12 meses encerrados em em novembro do ano passado, a indústria ainda acumulava queda de 9,7% na produção, as vendas do varejo estavam 5,3% maiores, considerando os 12 meses anteriores.

Diante do bom desempenho registrado, algumas redes aumentaram o volume de encomendas para o trimestre. A demanda continuou forte mesmo após o fim da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para eletrodomésticos da linha branca no fim de janeiro - as redes formaram estoque com o produto a um custo mais baixo para retardar o aumento do preço ao consumidor.

Na Lojas Cem, o começo do ano tem sido "excepcional", conta o supervisor-geral, José Domingos Alves. Em janeiro, as vendas cresceram 27% em relação ao mesmo mês do ano passado, com destaque para as vendas de televisores de LCD. Ele esperava alta de 15%, mas foi surpreendido positivamente no primeiro mês do ano. Até o dia 10 de fevereiro, a alta se manteve forte, na casa de 25% sobre o mesmo período de fevereiro do ano passado. Segundo ele, houve algumas promoções depois do Natal, como vendas em até dez vezes sem juros, mas não uma queima de estoques.

A empresa encomendou para o primeiro trimestre 20% a mais do que planejava na virada do ano. O consumidor segue confiante, segundo ele. No começo do ano, Alves projetava alta de 10% do faturamento em 2010, mas acha que é possível chegar a 15%, dado o bom resultado no começo do ano. A empresa ainda não repassou "quase nada" da elevação do IPI para os preços da linha branca, já que ainda tinha produtos comprados com alíquota mais baixa. Na semana que vem, pode haver algum repasse, com a perspectiva de redução do estoque desses produtos.

A Fnac também experimenta um ótimo começo do ano, segundo o diretor comercial, Benjamin Dubost. Em janeiro, as vendas superaram em 25% o registrado no mesmo período de 2009, mais que os 20% que ele projetava no começo do ano. "Em fevereiro, o crescimento segue nesse mesmo patamar", afirma Dubost, que não chegou, porém, a elevar as encomendas além do que estava programado no começo do ano.

Um ponto importante, diz ele, é que as vendas não se concentram apenas em televisores, que devem ter um bom ano por causa da Copa do Mundo. "O consumidor também tem comprado diversos outros produtos, como câmeras digitais." Dubost diz que a entrada de novas tecnologias, como as televisões de LED, contribui para o aumento de vendas, o que também é impulsionado pela elevada confiança do consumidor.

No Nordeste, a rede Eletroshopping comemora os resultados de janeiro e demonstra otimismo para o restante do primeiro trimestre. Segundo o gerente-comercial, Cristiano Vilar, no primeiro mês do ano as vendas cresceram 15,5% (considerando as mesmas lojas) em relação a janeiro de 2009, puxadas pela expectativa do fim do IPI reduzido para os produtos da linha branca. "O movimento foi muito forte nos últimos dias e acabamos por superar uma projeção de crescimento de 8% em janeiro."

De acordo com Vilar, fevereiro registrou um pequeno desaquecimento, comum neste mês no varejo nordestino. Ainda assim, as vendas estão 14% superiores às de igual mês de 2009. Para o conjunto do trimestre, a Eletroshopping, que tem 117 lojas espalhadas em seis Estados do Nordeste, continua trabalhando com a programação de encomendas feita no ano passado para a indústria, baseada em uma previsão de crescimento de 8% em relação aos três primeiros meses de 2009. No entanto, diz Vilar, a procura por televisores, motivada pela proximidade da Copa, e a demanda por produtos da linha branca pós-fim do IPI, poderão gerar mudança nas encomendas.

As compras pela internet ou por catálogo também cresceram com força. O grupo Hermes, formado pelo site de vendas Comprafacil.com e pela empresa de vendas por catálogo Hermes, ficou tão animado com o comportamento das vendas em janeiro que, embora considere cedo, já estima que as duas empresas irão aumentar suas vendas em cerca de 50% este ano. No ano passado, as vendas cresceram 42,6%, passando de R$ 820 milhões para R$ 1,17 bilhão.

Segundo Gustavo Bach, diretor de marketing do grupo, o bom resultado foi liderado pelas vendas do site Comprafacil.com. Quando a estatística anual inclui janeiro deste ano, Bach disse que o aumento das vendas chega a 60%. P

Números da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) mostram um resultado menos exuberante. Em janeiro, a média diária das consultas ao Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), termômetro das vendas a prazo, subiu 4,6% em relação ao mesmo mês de 2009. Já no Usecheque (que mede o desempenho das vendas à vista), a alta foi de 7,9%. "O ano começou bem, mas os números não mostram uma disparada nas vendas", diz Alfieri, para quem é possível que o resultado de janeiro tenha sido prejudicado pelas chuvas intensas que marcaram o período. Em fevereiro, números preliminares indicam alguma aceleração das consultas ao SCPC e alguma desaceleração no Usecheque, mas nada que mude dramaticamente a tendência registrada até agora.

Luiz Rabi, economista da Serasa Experian, avalia que o consumo neste semestre não deve repetir o ritmo verificado nos últimos seis meses do ano passado. Entre julho e dezembro de 2009, segundo dados da Serasa, o comércio varejista cresceu 6,2%, acelerando-se em relação aos 4,6% registrados no primeiro semestre. "Vamos repetir o ritmo do primeiro semestre de 2009. Parte relevante do consumo foi antecipado por meio da política de isenção fiscal", diz Rabi.

O comércio varejista na região metropolitana de Belo Horizonte registrou crescimento de 5% em janeiro deste ano na comparação com o mesmo mês em 2009, segundo a economista da Associação Comercial de Minas (AC Minas), Claudia Volpini. Ela classificou o resultado como "tímido", uma vez que a base de comparação é baixa. "É um resultado próprio de uma economia que ainda não reagiu totalmente, depois do pico da crise iniciada em 2008. Não parece ter havido uma reação pronunciada no nível do emprego", disse Claudia. A economista avalia que os segmentos de eletrodomésticos, material de construção e material escolar puxaram o consumo no mês passado. Nestes três setores, as vendas cresceram em torno de 7%.

O consumo vem em ritmo forte, mas, para Fábio Silveira, economista da RC Consultores, segue o esperado. Silveira calcula que o volume de vendas do comércio varejista deve se expandir entre 8,5% e 9% em 2010 sobre o ano passado, podendo alcançar taxas de dois dígitos. "Não há problema algum crescer 10%, num ritmo chinês, porque temos margem para ampliar a oferta interna e a disponibilidade dos importados".