Título: Indústria multiplica por 20 ritmo de novidades
Autor: Madureira , Daniele
Fonte: Valor Econômico, 22/02/2010, Empresas, p. B3

Poucas indústrias no país passaram por uma transformação tão profunda nos últimos dez anos quanto a de eletroeletrônicos. A antiga "linha marrom", de áudio e vídeo, deixou de existir, cada vez mais integrada ao universo de tecnologia e telecomunicações, que faz com que um único aparelho ofereça diferentes recursos. Ávido por novidades, o consumidor passou a ter acesso a diferentes linhas de crédito, que lhe permitiram obter com facilidade o aparelho dos sonhos - que já não precisa durar tanto, mas apresentar um design arrojado e reunir várias funções. As fabricantes aceleraram o ritmo de lançamentos: a Samsung passou de 10 para 200 novos produtos ao ano, chegando à renovação completa do portfólio a cada 365 dias. A LG, também com 10 lançamentos no início da década passada, hoje apresenta 120 novos modelos ao ano. A Sony, por sua vez, entre produtos e acessórios, praticamente dobrou o volume anual de novidades, para 2,1 mil itens.

Para dar conta da velocidade de lançamentos, o processo produtivo foi adaptado: o projeto de um novo televisor que demorava dois anos e meio, por exemplo, agora deve ser concluído em apenas seis meses. Com o objetivo de integrar as novas tecnologias e atender ao aumento da demanda, os investimentos do setor na Zona Franca de Manaus quase duplicaram em seis anos: de US$ 1,4 bilhão em 2004 para US$ 2,6 bilhões no ano passado, envolvendo máquinas, equipamentos e capital de giro. Em um cenário de competição acirrada, ganha espaço quem é mais rápido. Não por acaso, o setor virou de ponta-cabeça e a posição dos principais players foi completamente invertida. Se, no início da década passada, Philips, Philco e Gradiente dominavam o mercado, agora as líderes são as coreanas LG e Samsung, que estavam começando a diversificar o portfólio na época.

O ano de 2010 será o grande teste para os maiores competidores, que veem na Copa do Mundo a chance de abocanhar uma fatia da concorrência. A grande vedete é a TV, em especial a de LCD, cujo consumo deve crescer 70% este ano, segundo a consultoria GfK, motivado pela migração de tubo para tela plana. O principal produto do setor se beneficiou da sofisticação tecnológica, que lhe agregou valor. Segundo a Euromonitor, o varejo de televisores no Brasil somava vendas de US$ 1,5 bilhão em 1999, cifra que passou a US$ 6,9 bilhões em 2009. As vendas da indústria como um todo também cresceram. De acordo com a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), o faturamento do pólo eletroeletrônico na região saltou de R$ 7,5 bilhões em 2000 para R$ 16,5 bilhões ano passado.

"O crescimento da oferta de crédito e o aumento da renda do consumidor levaram essa indústria a um novo patamar de consumo, nunca visto antes", diz Antonio Corrêa de Lacerda, diretor do departamento de economia da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Apesar de todos os investimentos dos últimos anos, Lacerda ressalta que o setor ainda é deficitário no país. Em componentes elétricos e eletrônicos, o "coração dessa indústria", diz ele, foram exportados US$ 2,5 bilhões e importados US$ 12,9 bilhões no ano passado. "Para competir com China e Índia, o Brasil precisa atrair mais recursos das multinacionais e se tornar uma base de pesquisa e desenvolvimento, aumentando a exportação", diz.

O Brasil, porém, já vem ganhando status dentro do universo das gigantes de eletroeletrônicos. Especialmente depois da crise, quando os mercados europeu e americano foram particularmente afetados. "Entre as subsidiárias da LG, o Brasil já é a segunda maior, só perdendo para os Estados Unidos", afirma Roberto Barboza, diretor de vendas da LG. A posição foi conquistada na última década, uma vez que a coreana, presente hoje em 53 países, só iniciou a fabricação local em 1997. A televisão continua como o produto líder de vendas (35% do total), mas atualmente divide espaço com o celular, que tem a mesma participação e nem era produzido aqui em 2000.

Para Barboza, o ano de 2005 foi um marco nesse mercado, com a introdução das TV de telas de plasma e LCD. "O produto continua sendo desejo de consumo, mas se tornou bem mais acessível", diz. Em 2005, por exemplo, o modelo top de linha em plasma custava R$ 30 mil, enquanto que hoje o produto mais caro sai por R$ 13 mil.

"Este ano, as telas finas devem se tornar maioria no mercado de TVs, com 55% de participação", afirma Fernanda Summa, gerente de produtos de TV da LG. A empresa inovou em 2007 ao lançar a TV com HD interno, que permite gravar a programação. "Nós fizemos uma adaptação do produto para o Brasil, mudando o agendamento da programação, de segunda a sexta para segunda a sábado, por conta da novela", diz Fernanda. Uma demanda mais recente tem sido observada no Nordeste: a região é a que responde pelo maior aumento de vendas da TV com conversor digital. "Acreditamos que, como há baixa penetração de TV a cabo no Nordeste, o consumidor local quer ganhar com imagem e som de melhor qualidade", diz Fernanda.

A Sony também precisou aprender com o gosto do brasileiro. "O consumidor daqui tem as suas idiossincrasias", diz Lucio Pereira, gerente de comunicação e propaganda da Sony Brasil. No Japão, sede da companhia, explica, a linha de micro-áudio é muito importante. "Quanto menor, melhor, porque não há espaço", diz Pereira. Mas aqui o brasileiro gosta de som alto e bom. "Produzimos caixas maiores no país", afirma.

A busca incessante por novas tecnologias pode causar confusão. Recentemente, a Sony precisou alertar os consumidores que buscavam aparelhos portáteis MP 10, MP 15 ou MP 36 no seu site que essas definições não passavam de marketing. "Só existe tecnologia de armazenamento de áudio e vídeo em MP3 e MP4", diz Pereira.

Para Walter Duran, principal executivo de tecnologia da Philips no Brasil, o consumidor busca produtos que agreguem mais recursos, mas não necessariamente os utilizam. "Em geral, as pessoas compram a possibilidade de usar, não o que vão efetivamente usar".