Título: Paulo Octávio desiste da renúncia
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 19/02/2010, Política, p. A6
O governador interino de Brasília, Paulo Octávio (DEM), pediu o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para evitar a intervenção no Distrito Federal e se manter no cargo até a posse do novo governador a ser eleito em outubro - o titular José Roberto Arruda está preso na Polícia Federal sob a acusação de coagir testemunhas da prática de corrupção no governo local. Lula, no entanto, respondeu que acatará a decisão a ser tomada pelo Judiciário sobre a intervenção. Octávio deixou o Palácio do Planalto disposto a renunciar e convencido de que a chegada do interventor é questão de tempo.
A disposição de Paulo Octávio não durou uma tarde. Depois de conversar com Lula, comunicar aos dirigentes do DEM que renunciaria ao mandato por falta de sustentação política e de redigir a carta de renúncia, o vice voltou atrás, sob a alegação de que sua permanência no cargo é uma forma de resistência à intervenção. "Aguardo mais alguns dias, como me recomendou o presidente Lula", afirmou.
Segundo o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, o presidente não garantiu apoio político a Octávio e disse que não poderia se posicionar em relação à crise até a Justiça tomar uma decisão.
Octávio contava com o fato de a intervenção possivelmente não interessar ao governo federal. Em sua vigência, o Congresso não pode votar emendas constitucionais, por exemplo. Lula e os tribunais superiores devem seguir um mesmo roteiro - se for confirmada, será a primeira intervenção federal, após a redemocratização, decretada pelo Poder Judiciário em uma unidade da federação.
A intervenção é uma hipótese para os juízes desde que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) expediu a ordem de prisão do governador. Por isso o tribunal decidiu levar a decisão para sua instância mais alta, em vez de deixá-la apenas sob a responsabilidade do relator, ministro Fernando Gonçalves.
Numa outra ponta, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) mantém a ofensiva que desencadeou contra autoridades do Distrito Federal envolvidas nos escândalos, o que inclui toda a linha sucessória do DF. Arruda, o governador licenciado, contratou dois advogados do conselho federal da OAB pensando que seria possível controlar o ímpeto da entidade, segundo apurou o Valor, mas a situação em nada mudou.
Em resposta ao recuo de Octávio, a Câmara Legislativa acelerou a tramitação dos pedidos de impeachment contra ele. A Comissão de Constituição e Justiça acolheu, por unanimidade, três pedidos de afastamento Paulo Octávio.
As denúncias contra o governador Arruda e aliados são as mais bem documentadas da história política. Ao todo, a Polícia Federal tem 120 vídeos gravados pelos acusadores de Arruda. Há insegurança em toda a cadeia de comando do governo do Distrito Federal. E até fora. O mais provável candidato da oposição ao governo, o ex-ministro dos Esportes Agnelo Queiróz (PT), também foi atingido por estilhaços do escândalo, ao admitir que vira as fitas de vídeo no ano passado, mas não denunciou o caso.
Em caso de intervenção federal em Brasília, processo ainda em tramitação na Justiça, o nome em cogitação para interventor, no Palácio do Planalto, é o do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sepúlveda Pertence. O nome do advogado Sigmaringa Seixas, ex-deputado do PT, também é mencionado, mas joga contra sua indicação o fato de ainda manter atividade partidária em Brasília. Pertence também cogitou disputar o governo distrital, mas permaneceu no STF até se aposentar, em 2007.
Para se manter no cargo, Octávio conta com a hipótese de a intervenção, um instrumento traumático, não ser conveniente ao governo federal e à maioria da classe política de Brasília. O argumento de seus aliados é que uma eventual renúncia precipitaria a decisão do STF a favor da intervenção. Mantendo-se no posto de Arruda, ao contrário, seria mais difícil para o Judiciário dar o passo seguinte - após a prisão do governador, a decretação da intervenção.
É uma hipótese, mas os juízes não têm demonstrado que podem vir a ser condescendentes com os protagonistas do escândalo brasiliense - prova disso é que os advogados de Arruda devem desistir do pedido de habeas corpus para o governador, pois avaliam que podem perder no julgamento. O pedido será refeito em outras bases.
Arruda perdeu o apoio da direção nacional do seu partido, cujos dirigentes estão incomodados com o desgaste do partido com o escândalo no DF, chamado de "mensalão do DEM". Os senadores Demóstenes Torres (GO) e José Agripino (RN) e o deputado Ronaldo Caiado (GO) estavam dispostos a pedir sua expulsão, mas Octávio já avisou ao partido que pretende desfiliar-se e, assim, evitar o processo partidário. Embora Octávio não apareça em vídeo recebendo dinheiro, como Arruda, os demistas acham que a opinião pública não diferencia o governador do vice, em meio à crise.