Título: Calçadistas e têxteis buscam o mercado interno
Autor: Bueno , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 03/02/2010, Especial, p. A14

As indústrias calçadista e têxtil iniciaram 2010 apostando as fichas no mercado interno pelo segundo ano consecutivo. Enquanto os fabricantes de calçados elevam as vendas com ajuda extra da tarifa antidumping aplicada aos calçados chineses (que ficaram mais caros), o setor têxtil mantém, em parte, a produção do início de 2009, mas com uma parcela maior das vendas dirigidas ao Brasil.

"O mercado interno será o motor, o chassis e a carroceria do crescimento neste ano", afirma o gestor financeiro da West Coast, de Ivoti, Eduardo Schefer. Segundo ele, o primeiro sinal veio em janeiro, quando as vendas alcançaram 180 mil pares, superando em 15% as do mesmo período de 2009, acima da projeção inicial de 8%. Com isso, as vendas domésticas da West Coast devem compensar com folga a queda dos embarques para a Argentina, principal mercado externo da empresa. Conforme o executivo, a participação do mercado interno sobre as vendas deve subir de 70% para pelo menos 80% em 2010.

Na média, a expectativa da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) é que graças a uma leve alta do dólar e à recuperação da demanda em outros países da América Latina e até da Europa, as exportações do setor cresçam 3% em volume em 2010. No ano passado, os embarques físicos caíram 23,7%, para 126,6 milhões de pares e as receitas recuaram 27,7%, para US$ 1,360 bilhão.

Mesmo assim, conforme o diretor-executivo da entidade, Heitor Klein, o mercado interno deve sair-se bem melhor. Com base nas projeções da Associação Brasileira dos Lojistas de Calçados (Ablac), a Abicalçados espera uma alta de 9% no consumo doméstico, dois pontos percentuais acima das estimativas para o desempenho de 2009.

Se as previsões se confirmarem, e descontando os estoques no varejo, a produção brasileira de calçados passaria de cerca de 780 milhões de pares em 2009 para 810 milhões neste ano, calcula a Abicalçados. A entidade conta ainda com a manutenção da taxa antidumping de US$ 12,47 por par de calçado chinês importado para o Brasil, que foi imposta no início de setembro para vigorar até 6 de março de 2010.

A associação espera que a Câmara de Comércio Exterior (Camex) confirme a taxa para os próximos cinco anos, pois entende que ela foi decisiva para reduzir as importações em 2009 de US$ 307,5 milhões para US$ 296,5 milhões e de 39,3 milhões para 30,4 milhões de pares (75% originários da China). Segundo Klein, a medida permitiu a recuperação de 42 mil dos 46 mil empregos que haviam sido perdidos no setor em 2008. "E no primeiro semestre deste ano vamos recuperar a diferença e ainda mais", acredita.

No caso da West Coast, a previsão para este ano é crescer 25% em produção, para 2,5 milhões de pares, e também em faturamento, para pelo menos R$ 160 milhões, adianta Schefer. Em 2009 a produção havia subido 8,5% sobre o ano anterior e a receita, 11%, mas agora o executivo percebe que o mercado interno está otimista com o fim da crise econômica no país.

O cenário também animou a empresa a investir R$ 5 milhões em uma fábrica em Sergipe, que começará a funcionar no dia 1º de março, explica o gestor. Com a capacidade instalada de 12 mil pares por dia de calçados masculinos e femininos da matriz em Ivoti tomada e as vendas fechadas até o fim de março, a nova unidade vai garantir o fôlego para o crescimento nos próximos anos.

As empresas têxteis de Santa Catarina vivem um começo de ano de otimismo, apesar de apresentarem níveis de produção semelhantes aos de janeiro de 2009. A Buettner, de Brusque, manteve no mês passado a marca de 450 toneladas fabricadas. O mercado nacional segurou o desempenho da empresa. De acordo com o presidente, João Henrique Marchewsky, a participação das vendas nacionais no volume de produção da Buettner ficou em 80%, acima dos 72% de janeiro de 2009. "O mercado doméstico está aquecido", diz.

O presidente da Karsten, Alvin Rauh Neto, relata uma situação semelhante. "Foi um início melhor do que em 2009. Notamos que os clientes do varejo estão mais motivados em 2010", diz. Apesar do otimismo, a Karsten mantém a produção estável e o quadro de funcionários em 3,2 mil empregados.

O presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e Vestuário de Blumenau (Sintex), Ulrich Kuhn, diz que as empresas não estão fazendo contratações ou grandes investimentos para ampliação da produção. Mas, de acordo com ele, o clima geral é de que 2010 vai superar os resultados de 2009. "Em demanda, este foi um janeiro de um Brasil que deve crescer 5% em 2010", conta.