Título: Governo consegue anular convocação de Dilma
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 25/02/2010, Política, p. A5

Numa mobilização bem sucedida de sua base aliada no Senado, o governo conseguiu ontem anular a convocação da ministra Dilma Rousseff pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, para falar sobre o polêmico Plano Nacional de Direitos Humanos. Os governistas aprovaram requerimento do líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), substituindo a convocação da ministra chefe da Casa Civil pela do secretário de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi.

Foi uma reação à derrota sofrida no dia 9 de fevereiro, quando, em reunião com baixo quórum governista, a oposição aprovou na CCJ requerimento da senadora Kátia Abreu (DEM-TO) convocando a ministra. "Não vamos permitir postura eleitoreira. Vamos reagir toda vez que a oposição exacerbar", disse Jucá. "Senão, vira um vale-tudo neste ano eleitoral", completou.

Segundo o presidente da CCJ, Demóstenes Torres (DEM-GO), Dilma recebeu na terça-feira o ofício com a convocação. Disse que a decisão tomada anteriormente pela CCJ foi "ato jurídico perfeito" e invalidá-la significaria "desmoralização" da comissão e medida sujeita a recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A reunião de ontem foi marcada pelo embate eleitoral entre governo e oposição. Jucá disse que a convocação de Dilma havia sido um "golpe", porque o requerimento de Kátia Abreu foi aprovado sem estar previamente incluído na pauta.

No dia da reunião, o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), estava no Senado. Avisado da intenção dos integrantes da CCJ - presidida por um demista - de convocar a ministra, dirigiu-se à sala da reunião, mas não chegou a tempo de impedir a aprovação do requerimento.

Ontem, Mercadante não estava em Brasília. Jucá mobilizou os senadores da base, que lotaram a CCJ e ficaram no plenário da comissão durante toda a reunião, inclusive no período em que a oposição tentava ganhar tempo. Primeiro, Demóstenes indeferiu o requerimento de Jucá, que recorreu ao plenário.

Seu requerimento trocando Dilma por Vannuchi foi aprovado após cerca de três horas de reunião. No restante do tempo, Demóstenes colocou em votação nove propostas consideradas de pouca relevância.

A votação do requerimento de Jucá foi simbólica e, à exceção de Demóstenes, estavam presentes apenas senadores governistas (16). Parlamentares do DEM e do PSDB haviam se retirado "em protesto" à ação do governo para invalidar uma decisão da própria CCJ. A derrota era anunciada, já que os governistas estavam em maioria.

Durante a discussão, líderes e senadores da oposição apresentaram argumentos para justificar a necessidade de a ministra explicar o PNDH. Um deles, o fato de competir à Casa Civil dar a palavra final sobre todas as propostas que chegam à mesa do presidente. Citaram, ainda, a vinculação da Secretaria de Direitos Humanos à Presidência como justificativa para a ministra ser responsabilizada pelo plano.

O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), disse que a anulação da convocação seria um "precedente gravíssimo", abrindo brecha para que futuros convocados deixem de comparecer, apostando na anulação do ato. Para o líder do DEM, José Agripino (RN), "o governo está com medo de debater sua proposta com a sociedade e a ordem é proteger Dilma", para não prejudicar sua pré-candidatura a presidente.

Criado por meio de decreto do presidente no fim do ano, o plano causou constrangimentos ao governo e divergências entre ministros. Prevê a criação da Comissão da Verdade, para apurar torturas e desaparecimentos durante a ditadura (1964-1985), o que irritou o comando das Forças Armadas. O plano trata, ainda, de temas como legalização do aborto, mudança nas regras de reintegração de posse em invasões de terras, união civil homossexual e "critérios de acompanhamento editorial" de meios de comunicação.

Tasso Jereissati (PSDB-CE) afirmou que os governistas estão seguindo "cegamente um plano de marketing do Planalto", segundo o qual a ministra deve ser apontada como responsável por tudo de positivo que acontece no governo e deve sumir em situações negativas.