Título: Inflação volta a ameaçar
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 19/06/2010, Economia, p. 16

Recuo no valor dos alimentos não elimina a pressão de 32,61% do minério de ferro, que deve aparecer em julho

Apesar da redução dos preços alimentícios, experimentada nas últimas semanas, o dragão da inflação continua a ser nutrido pelo minério de ferro, produto que tem liderado a pressão sobre os custos ao produtor. O insumo ficou 32,61% mais caro, segundo registrado pela segunda prévia de junho do Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M), e deve influenciar todas as cadeias produtivas das quais faz parte já a partir de julho.

De acordo com o economista da Ativa Corretora Henrique Santos, os aumentos de preço do minério coletados tanto na primeira como na segunda prévia do indicador devem deixar de aparecer na apuração do próximo mês, em função de efeito estatístico. Em compensação, o repasse para outros produtos, que até agora tem sido marginal, deve ficar mais evidente. ¿O preço mais alto ainda não bateu em cheio na cadeia do minério, mas acreditamos que isso ocorra a partir de julho¿, considerou.

A alta do minério, sozinha, representou cerca de 0,8 ponto percentual no avanço de 1,06% registrado pelo IGP-M divulgado ontem. De acordo com a Fundação Getulio Vargas (FGV), as matérias-primas brutas, grupo que compõe os preços ao produtor, apresentaram inflação de 4,75%, ante a alta de 3,92% registrada no mesmo período de maio. No ano, esse grupo acumula a maior elevação de preços, de 13,21%, do indicador cheio.

O preço do ferro deve continuar empurrando a inflação para cima no decorrer do ano. Mesmo com o alívio que deve ser observado em julho, uma nova rodada de ajustes de tarifa deve começar a ser captada pelo IGP-M a partir de agosto. Contudo, para o economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles, essa nova leva será de menor intensidade. ¿O indicador deve captar algo entre 20% e 25%, mas não deve ultrapassar os 30%, como tem ocorrido agora¿, previu.

Balança Na contramão dos insumos industriais, os produtos alimentícios devem prosseguir balanceando o IGP-M. O grupo levou o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), componente do IGP-M cheio, a registrar deflação de 0,20%. De acordo com o economista da corretora Gradual Investimentos André Perfeito, a deflação de alimentos já detectada por outros levantamentos de preços ao consumidor, e agora pelo IGP, deve ser confirmada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) dos primeiros 15 dias do mês, indicador que baliza a política monetária do Banco Central. A queda desses preços pode surpreender ¿ caso venha mais forte ¿ e influenciar positivamente as projeções futuras de inflação. Isso garantiria uma pequena folga ao BC, para suavizar a elevação de juros.

O preço mais alto ainda não bateu em cheio na cadeia do minério, mas acreditamos que isso ocorra a partir de julho¿

Henrique Santos, economista da Ativa Corretora

Efeito da construção

O indicador de preços da construção também pesou na inflação registrada pelo Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M) na segunda prévia de junho. De acordo com a Fundação Getulio Vargas (FGV), o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) avançou 2,09%, ante a alta de 0,66% no segundo decêndio de maio. Os custos com mão de obra foram os que mais pressionaram o indicador e, ao todo, se elevaram em 3,21% no período, ante 0,81% registrado em maio. No ano, a inflação no segmento já acumula 7,78%.

O aumento é explicado pelo acúmulo de dissídios salariais pagos no período aos trabalhadores. Para o economista da Ativa Corretora Henrique Santos, a pressão inflacionária também reflete a escassez de profissionais qualificados que o setor enfrenta atualmente. ¿É natural que a junção desses dois fatores cause impactos nos custos¿, comentou. O ajudante especializado foi o profissional que mais encareceu o custo na construção. Sozinho, registrou inflação de 3,41% na segunda prévia de junho, enquanto o custo de um servente avançou 2,87%. Contratar um pedreiro também ficou mais caro e representou avanço de 2,97% nos custos, segundo a FGV.

O indicador de preços dos materiais, equipamentos e serviços da construção também registrou avanço de 1,04% na segunda medição de junho e acumula alta de 3,64% no ano. Apesar de o próprio setor já identificar diversos gargalos de produção, para Santos, a aceleração dos preços está mais relacionada ao aquecimento do mercado e ainda não reflete a falta de produtos no mercado. Apesar do avanço no indicador cheio, alguns materiais utilizados para acabamento apresentaram deflação no período, contribuindo para puxar para baixo o IGP-M. Ferragens para esquadrias tiveram queda de 0,62%, enquanto ladrilhos e placas para pisos registraram declínio de 0,3%. (GC)