Título: No Fórum, Gabrielli aponta ameaças à Petrobras
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 29/01/2010, Internacional, p. A10

A demora do Congresso em aprovar os projetos do novo marco regulatório do petróleo prejudica a Petrobras, ao influenciar o mercado acionário e criar, na prática, um limite à valorização das ações da estatal, disse o presidente da empresa, José Sérgio Gabrielli, ao Valor, em Davos. Gabrielli garantiu que não há chance de a estatal reduzir o preço da gasolina, apesar da recuperação das perdas que a empresa teve com a alta do petróleo no ano passado. Ele informou, ainda, que a Petrobras negocia com o Tribunal de Contas uma reavaliação, por auditor independente, das obras consideradas irregulares pelos técnicos do tribunal, motivo de crise entre governo e Congresso.

"Nossa divergência com o TCU é, basicamente, como medir custos. Uma refinaria não pode ser medida como se mede uma estrada", comentou Gabrielli, que informou ao Valor ter proposto ao TCU a contratação, "juntas", da Fundação Getúlio Vargas e de firmas de auditoria para obter uma avaliação independente. "É possível superar tecnicamente", afirma, defendendo a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de vetar a parte do orçamento de 2010 que excluía, por irregularidades, quatro obras da estatal da lista de investimentos com execução autorizada neste ano.

Gabrielli argumenta que são obras prioritárias em várias regiões do país. "É a petroquímica do Nordeste, o polo petroquímico no Rio, uma unidade de separação de GLP no Espírito Santo e uma refinaria no Paraná, para melhorar a qualidade de combustíveis, projetos relevantes", insiste. "O presidente, ao vetar, se preocupou com o desenvolvimento do país." A paralisação das obras desempregará, "de imediato", 25 mil trabalhadores qualificados e "desmobilizará atividades importantes" vinculadas aos investimentos, calcula Gabrielli.

O presidente da Petrobras falou ao Valor em um dos raros intervalos em sua participação no Fórum Econômico Mundial, em Davos, onde, neste ano, preside o Conselho de Energia - o que o obrigou a atravessar inúmeras vezes os controles de metais colocados na entrada do Congresso onde se realiza o Fórum e nos principais hotéis que abrigam reuniões paralelas, aonde se chega após caminhar por ruas cobertas de neve, que cai ininterruptamente na cidade. Ele derrubou, impassível, a expectativa de que a recuperação das receitas da Petrobras com o petróleo permita uma redução do preço dos combustíveis para consumidor.

"Desde 2003, mantivemos o preço do GLP; os preços da gasolina e do diesel acompanham o mercado internacional no longo prazo; e não fazemos ajuste de curto prazo nem para cima nem para baixo", argumentou. "Hoje não somente o preço do mercado internacional esta alinhado com o da gasolina no Brasil como a tendência é subir." O preço da gasolina, na refinaria, é de R$ 1, "mais barato do que água", e ele foi reduzido no ano passado, resume Gabrielli.

Recentemente promovida à quarta posição entre as maiores empresas de petróleo do mundo, com base na valorização de suas ações, a Petrobras está limitada em sua valorização pelas incertezas do modelo regulatório, ainda sob avaliação do Congresso, acredita o presidente da empresa. "Há incerteza sobre o valor das ações, isso afeta o valor da companhia", comenta. Ele admite que mesmo após a aprovação dos parlamentares será necessário terminar o processo de avaliação das reservas do petróleo no pré-sal, que servirão de base para a capitalização que o governo fará na empresa, segundo o plano anunciado no ano passado.

"O processo de exploração deve terminar antes da aprovação no Congresso", prevê o presidente, referindo-se à pesquisa nos campos da camada pré-sal ainda sem produção. Ele insiste na necessidade de apressar os projetos do pré-sal (que definem o sistema de partilha, de leilões, a nova estatal para supervisionar a produção e o Fundo Social com os recursos do petróleo a ser explorado). "É preciso que a votação ocorra até junho ou julho, porque depois se entra no período eleitoral", argumenta.

Gabrielli comandou uma entrevista coletiva sobre as perspectivas do setor de energia e provocou surpresa nos executivos ao comentar que, no Brasil, a gasolina se tornou alternativa ao álcool, graças ao programa de etanol combustível. "É a primeira vez que vejo gasolina ser tratada como alternativa", disse, rindo, o especialista Daniel Yergin, que coordenou a mesa. Gabrielli falou, também, da excelente situação da industria de petróleo, que não sofreu interrupção de investimentos durante a crise de 2008 e 2009. "Não há falta de investimentos, há seleção de investimentos, uma fuga para a qualidade, que beneficia as grandes empresas", disse, exemplificando com a captação vultosa da Petrobras, no ano passado.