Título: Desembolso com recurso da poupança vai a R$ 34 bi
Autor: Cotias , Adriana
Fonte: Valor Econômico, 22/01/2010, Finanças, p. C6

Enquanto as operações de crédito imobiliário com "funding" da poupança bateram recorde pelo segundo ano consecutivo, com a liberação de R$ 34 bilhões em 2009 - expansão de 13,3% sobre 2008 -, os desembolsos com recursos livres limitaram-se a R$ 3,4 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) e do Banco Central (BC).

Do estoque total de financiamentos informados na rubrica "habitação" do BC, que chegou a R$ 88,9 bilhões, só R$ 6,8 bilhões, ou 8%, eram de aplicações voluntárias, o que inclui o dinheiro das cooperativas habitacionais.

Esses números evidenciam que, apesar de os bancos terem colocado o financiamento imobiliário na prateleira, ainda falta muito para que essas carteiras ganhem representatividade entre as demais linhas ofertadas. Para efeito de comparação, o crédito pessoal respondia sozinho por R$ 159,8 bilhões em dezembro, enquanto o saldo de empréstimos destinados à aquisição veículos e outros bens totalizava R$ 103,5 bilhões.

O direcionamento obrigatório de 65% dos recursos captados na poupança é que inibe qualquer esforço das instituições de buscar outras formas de captação, segundo o presidente da Abecip, Luiz Antônio França, também diretor de crédito imobiliário do Itaú Unibanco. "A poupança ainda oferece o "funding" mais barato e, por enquanto, supre as necessidades do mercado imobiliário." Mas essa dinâmica, admite, vai ter de mudar porque há vários anos os desembolsos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE) crescem a um ritmo mais acelerado do que as captações líquidas. No ano passado, as cadernetas atraíram R$ 23,8 bilhões, com crescimento de 71% em relação a 2008.

A crise deflagrada no segundo semestre de 2008 e a redução da Selic adiaram por alguns tempo uma solução de mercado para o financiamento imobiliário - houve menor velocidade na contratações e a poupança ganhou atratividade. A previsão de França é de que os recursos do estoque da poupança, de R$ 253,6 bilhões, e as novas captações sejam suficientes para mais três ou quatro anos de crédito direcionado. Só neste ano, a entidade estima que as liberações crescerão 50%, a R$ 50 bilhões. "Quando a produção estiver em R$ 300 bilhões ou R$ 400 bilhões ao ano não dá para pensar no FGTS subsidiando esse segmento e precisará haver uma decisão de mercado que não passa também pela caderneta."

As Letras Financeiras (LF), títulos de dívida financeira semelhantes a debêntures, no radar do BC, e instrumentos de securitização como fundos imobiliários e de recebíveis e as Cédulas de Recebíveis Imobiliários (CRI) são algumas das opções de captação de longo prazo que tendem a ser viabilizadas.

Até aqui, a Caixa Econômica Federal sozinha tem uma participação superior a 70% no crédito à habitação. Pelos dados do BC, o sistema financeiro público responde por R$ 65,486 bilhões do saldo do sistema e o Banco do Brasil só recebeu autorização do Conselho Monetário Nacional (CMN) há cerca de um ano e meio para endereçar 10% dos recursos da poupança ao crédito imobiliário.

O banco fechou 2009 com uma carteira de R$ 1,6 bilhão, já contando os volumes herdados da Nossa Caixa. Para este ano, a previsão é de um incremento de R$ 2,1 bilhões, segundo o diretor da área de empréstimos e financiamentos, Nilson Martiniano. Ele conta que hoje o banco tem R$ 7 bilhões em recursos para emprestar, suficientes para expansão dos volumes nos próximos dois anos, sem considerar qualquer adicional de captação. "O crédito imobiliário ainda representa pequena parcela no PIB, há novos tomadores ingressando e o mercado todo vai ter de se preparar."

Mais adiante, acrescenta o gerente executivo da área no BB, Sérgio Augusto Kurovski, será necessário o sistema desenvolver um mercado secundário de títulos lastreados em crédito imobiliário. O banco estuda, por exemplo, a estruturação de fundos imobiliários. Para expandir seus domínios num ramo em que ainda é novato, o foco do BB serão os convênios de folha de pagamento de servidores federais, que compõem uma base de mais de 2,8 milhões de clientes. Para esse público, o banco consegue emprestar a um custo efetivo total de 9,5%, mais a TR.

O Itaú, que fechou o terceiro trimestre de 2009 com um saldo de R$ 7,8 bilhões, não abre seus custos. Segundo França, foi a customização das taxas segundo o perfil de risco, valor da entrada, prazo e volume financiado que possibilitou que alcançasse lugar de destaque entre os privados no segmento. Ele também credita o avanço na área a parcerias com as imobiliárias Lopes e Coelho da Fonseca e à validação de contratos em até 15 dias para clientes e não clientes.

No Bradesco, os desembolsos em 2009 atingiram os R$ 5 bilhões, mais do que o orçado e para 2010 a ordem é atender integralmente a demanda, diz o superintendente-executivo de crédito imobiliário, Cláudio Borges. "Temos agências no Brasil todo e nenhuma restrição de praça para operar." Por enquanto, a irrigação trazida pela caderneta é suficiente para fazer frente às contratações, mas se houver algum desequilíbrio o banco vai recorrer a outros instrumentos. O plano B inclui a emissão de CRIs e fundos imobiliários. A agilidade na aprovação de crédito também é arma para avançar no segmento. Segundo o executivo, em 24 horas, é possível fornecer ao tomador uma carta de crédito equivalente a 20 vezes o valor da renda.