Título: Governo vira fábrica de planos em ano eleitoral
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 12/02/2010, Opinião, p. A12
Em um ano de eleições, o governo demonstra um grande ativismo na produção de planos. Há um plano nacional de banda larga prestes a entrar em cena, cogita-se mudar o modelo de concessões para ferrovias ("Folha de S. Paulo", 9 de fevereiro) e estão quase a caminho do Congresso três projetos de lei que estabelecem um novo Código de Mineração e criam uma agência reguladora para o setor (Valor, 10 de fevereiro). Pela intenção do Planalto, os vitais projetos que mudam o modelo de concessão do petróleo e fixam um esquema de repartição de recursos para o pré-sal já deveriam ter sido aprovados a toque de caixa. Em breve virá a Consolidação das Leis Sociais, em um ou dois blocos, e sabe-se mais o quê. Planos dessa envergadura precisariam ser debatidos no Congresso rotineiramente e não de afogadilho, já que os atuais governantes tiveram oito anos para encaminhar suas prioridades. A pior época para isso é o período eleitoral, especialmente quando a Presidência da República está em jogo.
Esse ativismo não é inócuo, mesmo que o Congresso, como quase sempre ocorre em anos eleitorais, não vote muita coisa relevante. Na pior das hipóteses para o governo, os projetos servem de bandeira eleitoral. Na melhor, eles podem ser aprovados naqueles arrastões em que se vota de tudo em uma só noite, sem que os deputados e senadores prestem atenção em quase nada. Para o Brasil, porém, a conta pode sair cara e a abdicação usual do Congresso de suas responsabilidades torna ainda mais perigosa uma correria para mudar o jogo dos negócios em setores de grande importância, como petróleo e mineração, por exemplo.
O projeto para modernizar o Código de Mineração é um exemplo de uma iniciativa necessária que veio em hora errada. Pretende-se mudar a tributação dos minérios de forma a corrigir distorções, por um lado, e de outro incentivar produtores de minérios de ferro a fabricarem aço no país, em vez de apenas exportar matéria-prima. A ideia em si é bastante polêmica e surgiu como uma obsessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos últimos tempos.
É possível sentir os ares eleitorais nos objetivos anunciados de um plano de conceder incentivos para nacionalizar a produção de fertilizantes, que constará dos projetos para reformar as regras da mineração. O Brasil, um dos maiores celeiros de grãos do mundo, importa praticamente dois terços dos adubos que consome. Os artífices das propostas pretendem acabar com essa dependência quase histórica e transformá-la em autossuficiência em nada mais nada menos que três anos. Nunca na história deste país isso foi viável, nem será agora.
A autossuficiência tem um custo e ele pode ser bem mais alto do que o da dependência das importações. É recomendável que essa dependência diminua, especialmente no caso do potássio, do qual o Brasil importa 90% do consumo. É surpreendente que com um mercado consumidor tão grande e em expansão nenhuma iniciativa nesse sentido tenha sido tomada até agora. É importante haver garantia de fornecimento nacional, mas não a qualquer preço. O Brasil tem boas chances na produção dos fosfatados, que, no entanto, ainda está longe de dispensar as importações. O caso do potássio é mais grave. A jazida da Petrobras no Rio Madeira, herdada da Petrofértil, pode ter o potencial para ser uma das maiores do mundo, embora a única certeza que há hoje é a de que sua exploração traria enormes e quase insolúveis problemas ambientais. Não é apenas pelo investimento necessário, estimado em US$ 2 bilhões - uma bagatela para a estatal - , que nada é feito por lá. No caso dos nitrogenados, que dependem do gás natural, tudo depende de uma definição da Petrobras sobre as prioridades do uso do combustível. A estatal precisaria construir uma nova unidade de processamento de gás e já há pressão eleitoral para localizá-la em Minas Gerais.
Um projeto mais modesto e realista para ampliar a produção nacional de fertilizantes é imprescindível. A autossuficiência proposta para o setor levará, primeiro, ao subsídio e, depois, a preços domésticos mais caros que os internacionais. Um de seus efeitos será o contrário do que se pretendia: a redução da competitividade das exportações agrícolas.