Título: Setor privado pressiona Obama a evitar sanção
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 17/03/2010, Brasil, p. A3

Enquanto os setores privados discutem qual seria a compensação possível para o Brasil não retaliar os Estados Unidos na briga por causa dos subsídios ilegais ao algodão, o governo do presidente Barack Obama continua sem dar sinais de que apresentará uma proposta ao governo brasileiro nos próximos dias.

"O cenário é ruim, o pessimismo cresce", disse uma fonte do setor privado ontem, em meio às articulações de empresas em Brasília na tentativa de evitar a sanção, que aumentará tarifas de importação de produtos, quebrará patentes etc. "Não há negociação enquanto os Estados Unidos não colocarem uma proposta de compensação na mesa." O problema é a inação americana, a recusa do Congresso e do Executivo em aceitar compromisso para por fim aos subsídios ilegais condenados, e também uma certa irritação com a posição brasileira sobre o Irã, por exemplo.

Autoridades americanas nunca falaram explicitamente em compensação e nem mostraram disposição de fazer isso, segundo fontes do governo brasileiro. Publicamente, acenam com a tentativa de resolver o confronto, mas a quatro paredes a atitude é bem mais reservada. No máximo, acenaram com alguma ação se o Brasil não retaliar, mas sem qualquer detalhe e limitando-se às boas intenções, o que Brasília não tem como aceitar, porque perderia credibilidade.

Já os setores privados continuam se articulando para evitar barreiras que só reduzirão o comércio. Uma delegação americana encontra-se em Brasília, formada por dois membros do Fórum Empresarial Brasil-EUA, de um representante da Câmara de Comércio Americana em São Paulo e de uma representante dos produtores americanos de trigo.

A delegação discutiu, ontem, formas possíveis de efetuar a compensação com o presidente da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), Haroldo Cunha, e vai procurar hoje o Itamaraty.

O grupo sinalizou que a criação de um fundo com recursos americanos para o algodão, Embrapa e agricultura é mais aceito no governo de Barack Obama do que no Congresso americano. O governo brasileiro já mencionou também uma compensação através da redução de barreiras sanitárias, menor taxa sobre o etanol, entre outras alternativas.

Se a possibilidade do fundo existe, outra dificuldade persiste para um acordo entre Brasília e Washington: a recusa dos Estados Unidos de se comprometerem com a implementação da decisão da Organização Mundial do Comércio (OMC) para por fim aos subsídios ilegais a seus cotonicultores. A Casa Branca resiste em oferecer um compromisso de reforma estrutural mesmo apenas em 2012, já que isso depende do Congresso, hostil em boa parte a entendimento nessa área.

Membros do Comitê de Agricultura do Senado americano insistiram junto ao governo para que funcionários que participem do Fórum Empresarial Brasil-EUA, em Brasília, não apareçam com propostas de compensação.

A delegação do setor privado disse na Abrapa, em todo caso, que o setor privado está pressionando para que o governo Barack Obama formalize uma proposta de compensação ao Brasil antes do dia 7 de abril, que é o prazo fixado pelo governo brasileiro para deflagrar a retaliação. O setor americano de produção de trigo é um dos mais engajados pela compensação, para evitar a fixação de tarifa maior na entrada de seus produtos no Brasil.

Cunha, da Abrapa, avisou aos americanos que um fundo para ajudar na melhora da competitividade do algodão precisará ter algumas centenas de milhões de dólares "para ser condizente com o tamanho da retaliação (de US$ 829 milhões)". O que não dá, disse, é ter um fundo simbólico, e recheado apenas de boas intenções, que afetaria a credibilidade do Brasil nas disputas comerciais.

O presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisas (Interfarma), Antonio Brito, que quer evitar a retaliação, admitiu que a conversa bilateral entre os setores privados se intensificou e espera que Washington se mobilize proximamente.