Título: Apesar de recorde de exportação no mês, saldo de fevereiro é o menor desde 2002
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2010, Brasil, p. A3

O crescimento superior a 50% nas importações brasileiras, especialmente de insumos para a indústria e de bens de consumo duráveis como automóveis, garantiu em fevereiro um recorde em compras no exterior para o mês, e baixou o saldo comercial para o nível mais baixo desde 2002. Resultado do aquecimento no mercado interno, do mau desempenho econômico nos paises desenvolvidos e da valorização do real em relação ao dólar, o aumento nas média diária das importações chegou a quase 164% para utensílios domésticos e 116% para automóveis. Na média, as importações de bens de consumo duráveis cresceram 82%.

O saldo positivo no comércio exterior, de US$ 394 milhões (US$ 228 milhões, no bimestre) só foi obtido porque as exportações, em fevereiro, tiveram crescimento também recorde para o mês, surpreendendo analistas. As vendas ao exterior foram puxadas pelas vendas de automóveis, partes e peças, mas também de commodities ou semicomodities, como açúcar em bruto, celulose, ferro-ligas, laminados planos, alumínio e carnes.

"O resultado das exportações foi muito bom, a média diária ficou até acima da registrada no segundo semestre de 2009", comentou o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Embora o fraco desempenho das exportações em fevereiro de 2009 faça com que os aumentos neste ano pareçam maiores, devido à pequena base de comparação, os indicadores do mês passado mostram que os valores médios diários do comércio exterior brasileiro recuperaram os patamares do início de 2008, disse o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral.

A entrada da safra agrícola, especialmente a safra de soja, que será colhida em volume recorde e preços favoráveis, deverá ampliar a diferença entre exportações e importações, garantindo saldo positivo nos próximos meses, acredita Barral. A recuperação dos principais mercados do Brasil para automóveis, como a Argentina e México, tiveram parte importante nos resultados "notáveis" de fevereiro, avaliou o secretário. A retomada do crescimento na América Latina também beneficiou outros industrializados, como aços laminados planos, que cresceram 91% em valor (165% em toneladas).

"A competição internacional está mais acirrada, mas o Brasil está conseguindo recuperar mercado", disse Barral, que concorda que o desempenho exportador em fevereiro foi surpreendente. "As importações já vinham subindo, estava previsto, o que que mudou foi a rápida recuperação das exportações".

O resultado foi considerado ruim, porém, por economistas do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), que consideraram o aumento de 15% na venda de produtos manufaturados muito inferior ao aumento nas exportações de produtos básicos (como carnes e minério de cobre) e semimanufaturados (principalmente açúcar, óleo de soja e ferro-ligas), que superou 36% . "Enquanto, nos dados de janeiro, ainda pairavam dúvidas sobre o dinamismo das exportações de manufaturados, os resultados de fevereiro mostram, sem sombra de dúvida, desempenho desfavorável", conclui nota divulgada pelo Iedi.

O desempenho das importações preocupa empresários de setores mais afetados pela concorrência, como o de têxteis, que reivindica do governo maior agilidade nas investigações sobre concorrência desleal. "Estamos plantando um problema sério para o futuro. Com moeda forte, legislação complicada e infraestrutura precária, vamos comprometer o setor exportador", diz o secretário-executivo da Associação Brasileira da Indústria Têxtil, Fernando Pimentel.

Pimentel comenta que está crescendo o déficit do setor têxtil, que, em janeiro do ano passado, importou cerca de US$ 2,2 bilhões a mais do que exportou, e, em janeiro deste ano, elevou o saldo negativo para US$ 3,1 bilhões. Os exportadores estão buscando nichos, mas reduzindo o volume vendido ao exterior, diz. "Em 2003, exportamos 22 mil toneladas, ao preço médio de US$ 13,50 o quilo. No ano passado, chegamos a US$ 35 o quilo, mas vendemos menos de 5 mil toneladas."

Algumas empresas passaram a importar produtos que faziam no Brasil, explica o presidente da Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica (Abinee), Humberto Barbato, que teme também pelo mercado externo. "No ano que vem, mercados nossos como Argentina e Venezuela passarão a produzir localmente aparelhos de celular", prevê. Ele teme os feitos da MP 472, em tramitação no Congresso brasileiro, que retira o IPI para eletrônicos importados pelo setor petrolífero. "Estão retirando o diferencial que dá vantagem à produção nacional sobre o importado."