Título: Inflação mostra sinais de pressão mais generalizada
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 27/01/2010, Brasil, p. A5

Os primeiros índices de preços divulgados em janeiro mostraram pressões mais generalizadas do que nos meses anteriores, acendendo algumas preocupações quanto à tendência da inflação. No Índice de Preços ao Consumidor Amplo - 15 (IPCA-15) deste mês, o percentual de itens em alta ficou em 66,4%, o maior desde junho de 2008. No primeiro mês do ano, costuma haver um número maior de produtos com variação positiva, como os 67,2% de janeiro de 2008, mas algumas elevações de preços no IPCA-15 não parecem ter caráter apenas sazonal. Além dos reajustes mais fortes de alimentos e tarifas de ônibus, houve aumentos significativos de alguns serviços pessoais - não só empregado doméstico, mas também barbeiro e costureira, por exemplo - e de aparelhos eletroeletrônicos.

São sinais de que a demanda aquecida, num cenário de mercado de trabalho forte e ampla oferta de crédito, pode abrir espaço para alguns reajustes mais salgados de preços, embora os analistas não vejam uma trajetória explosiva para a inflação nos próximos meses.

O economista-chefe do J. P. Morgan, Fábio Akira, chama a atenção para o comportamento da variação acumulada em 12 meses dos núcleos de inflação, que já estão acima do centro da meta perseguida pelo Banco Central (BC), de 4,5%. Ao excluir os itens mais voláteis ou as maiores e menores altas, essas medidas servem para captar a tendência principal dos índices de preços, tentando "limpá-los" de ruídos ocasionais.

Nos 12 meses até janeiro, o novo núcleo por exclusão do IPCA-15, por exemplo, subiu 4,7%, mais que os 4,61% de dezembro e os 4,44% de novembro. Calculado pela nova metodologia do Banco Central (BC), esse indicador expurga dez itens do grupo alimentação no domicílio e dois preços administrados (combustíveis para veículos e combustíveis para uso doméstico, como gás de botijão ), com peso de cerca de 15,5% na cesta do IPCA.

"Eu prefiro olhar a taxa acumulada em 12 meses porque ela não fica sujeita às oscilações de um mês ou outro. E, nessa base de comparação, os núcleos já estão um pouco acima da meta, o que aponta para riscos inflacionários crescentes." O novo núcleo por dupla ponderação, que diminui a importância dos preços mais voláteis, mas sem excluí-los, subiu 4,82% nos 12 meses até janeiro, depois de bater em 4,38% em novembro de 2009.

Para Akira, os juros reais baixos para padrões brasileiros, a ampla oferta de crédito, os estímulos fiscais e o mercado de trabalho robusto impulsionam a demanda, o que tende a empurrar os preços para cima. Na segunda prévia do Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) de janeiro, também houve uma alta mais generalizada dos preços industriais no atacado - 56,62% dos itens subiram, bem mais que os 47,83% do mês anterior, segundo a LCA Consultores.

Os preços de serviços também mostraram uma alta mais forte em janeiro no IPCA-15, indicador que mede a inflação entre a segunda quinzena do mês anterior e a primeira do mês de referência - o IPCA capta os preços no mês fechado. O item empregado doméstico subiu 1,05%, já refletindo em parte o forte reajuste do salário mínimo, de 12%. Mas não foi apenas esse serviço pessoal que subiu com força. O item barbeiro, por exemplo, teve reajuste de 3,38%, e costureira, de 2,3%. Em momentos de demanda aquecida, em que há aumento de emprego e renda, esses serviços costumam avançar bastante, segundo analistas como Basiliki Litvac, da MCM Consultores Associados. Ela acredita em alta forte dessas cotações neste ano, de 6%, um pouco abaixo dos 6,4% de 2009.

Os aparelhos eletroeletrônicos também tiveram altas mais salgadas, segundo o IPCA-15 de janeiro. O aumento do grupo foi de 0,83%, com refrigeradores subindo 2,03%, mesmo com a prorrogação para o fim de janeiro da redução da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para eletrodomésticos da linha branca que poupam mais energia. Para Akira, a alta desses produtos é outro reflexo da demanda aquecida, que sanciona reajustes mais elevados.

Como reflexo da alta mais forte do IPCA-15, os analistas elevaram as previsões para o IPCA em 2010. Na pesquisa semanal divulgada pelo BC na segunda-feira, as expectativas do mercado subiram de 4,5% para os 4,6%. Para a economista Priscila Godoy, da Rosenberg & Associados, esse movimento é um dos fatores que devem levar o BC a elevar os juros em abril, para evitar uma deterioração adicional das projeções.

No regime de metas de inflação, é importante manter ancoradas as expectativas, lembra Basiliki - que, como Priscila, acredita em alta da Selic em abril. Akira espera elevação dos juros um mês antes, em março. Para a reunião de hoje do Comitê de Política Monetária (Copom), a aposta dos analistas é de manutenção dos juros em 8,75% ao ano, com a possível sinalização de alta nos próximos meses.

O economista-chefe do Barclays Capital, Marcelo Salomon, é mais cauteloso, e acredita que o grosso das pressões inflacionárias ainda vem dos alimentos e bebidas, que subiram 0,81% no IPCA-15 de janeiro. "É preciso ficar atento à trajetória dos preços, mas ainda acho cedo para falar em altas mais disseminadas", acredita ele, que aposta em aumento da Selic em julho.