Título: Chuva versus cidadania
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 29/06/2010, Brasil, p. 10

Documentos como históricos escolares e prontuários, alguns fundamentais para o recebimento de benefícios, somem nas enchentes. Autoridades apelam para a sensibilidade do governo federal

Enviada especial

Santana do Mundaú ¿ O temporal que destruiu cidades no interior de Alagoas levou também parte dos registros oficiais das prefeituras. Autoridades perderam todo o controle referente a programas sociais, licitações, históricos escolares, prontuários médicos, entre outros documentos. Esses dados são fundamentais na transferência de recursos, por exemplo, do maior programa social do governo federal, o Bolsa Família. Além disso, é com base nesses documentos que é feita a análise das contas dos municípios. Autoridades municipais e estaduais buscam encontrar uma forma de minimizar os prejuízos. Durante todo o dia, equipes da secretaria de assistência social de Santana do Mundaú percorriam as ruas cadastrando famílias e anotando os benefícios sociais a que tinham direito. O grupo teme que essas pessoas, em situação ainda mais vulnerável depois das chuvas, percam direitos já adquiridos pela falta de documentação.

¿Perdi a bolsa. A água levou tudo. Até o cartão do Bolsa Família¿, lamenta Diva da Silva, que recebia mensalmente R$ 90 e conta com esse dinheiro para comprar comida e roupas para os dois filhos.

O governo do estado é responsável pelo envio da frequência escolar, um dos requisitos do Bolsa Família. A secretaria de Educação busca, com o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), uma saída para recuperar os dados e garantir a manutenção do programa para aquelas famílias que perderam os documentos. A ação também caracteriza condicionalidade para o repasse da verba as informações de saúde.

A agente comunitária Daiana de Lima, 25 anos, passou o fim de semana trabalhando. Com um caderno na mão, visitou todas as famílias da sua área de atuação. ¿Estou recuperando os dados dessas pessoas e, principalmente, tentando regularizar a distribuição de medicamentos¿, explica. O número de pacientes com problemas cardiovasculares e de hipertensão é grande nessa região. Daiana estava preocupada também com o transporte de pessoas que precisam de hemodiálise. ¿Não sabemos ao certo quem são e onde elas estão agora¿, diz. As famílias atingidas pelas chuvas foram distribuídas em abrigos provisórios. Entretanto, muitos preferiram ir para casas de parentes ou mesmo para outras cidades.

O prefeito de Rio Largo, Antônio Filho (PSB), cobra ¿sensibilidade do governo federal¿ para lidar com a situação. ¿Precisamos resgatar a dignidade dessas pessoas.¿ Ontem técnicos do MDS, prefeitos e o governador do estado se reuniram para tentar traçar um plano de trabalho.

Tragédia repetida Branquinha é uma cidade sem história. Segundo dados do Tribunal de Contas de Alagoas (TCE-AL), os documentos e informações sobre as origens do município foram destruídos por uma enchente, em 1949, quando a prefeitura foi parcialmente inundada. Sessenta e um anos depois, a sede do poder Executivo foi completamente destruída e a cidade perdeu os registros. Segundo os historiadores, só em 1962 o município foi emancipado e desmembrado de Murici. O Rio Mundaú já provocou outras enchentes e a cidade precisou ser reconstruída.

A prefeitura já disse que quer mudar a cidade de lugar. O secretário de administração Renato da Purificação vai consultar o Incra para verificar a possibilidade de desapropriar terras na região. ¿Perdemos os nossos dados, mas sei que temos vários assentamentos por aqui.¿

Estou recuperando os dados dessas pessoas e, principalmente, tentando regularizar a distribuição de medicamentos¿