Título: Lula retoma críticas a extinção da CPMF
Autor: Lima , Vandson
Fonte: Valor Econômico, 26/03/2010, Política, p. A7

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomou ontem a crítica ao fim da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), derrubada pela oposição em 2007, no Senado. Ao lado dos dois principais candidatos à Presidência, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), e o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), Lula foi veemente ao dizer que o tema terá que ser discutido pelo próximo presidente.

"Fiquei muito magoado e ofendido quando a minha oposição no Senado roubou a CPMF. Não conheço um empresário no Brasil que reduziu o preço de seus produtos em 0,38%, que é o que a gente pagava no cheque", reclamou o presidente, em referência à CPMF. "Quem quer que seja presidente depois de mim vai ter que discutir mais dinheiro para a saúde. Não tem alternativa", afirmou ontem, em Tatuí, no interior de São Paulo. Lula participou da entrega de 650 ambulâncias da rede de atendimento móvel de urgência (Samu) para 573 municípios do país.

Ao discursar ao lado de Serra, Dilma disse que "a esperança, mais uma vez, vem vencendo o medo", relembrando a expressão usada durante a campanha presidencial de 2002, quando Lula derrotou o tucano.

Serra, em discurso comedido, exaltou o Sistema Único de Saúde (SUS) como o melhor sistema de saúde das Américas. "O dinheiro vai pelo SUS também é uma forma de transferência de renda", disse. Dilma e Serra sentaram-se lado a lado e pouco conversaram. No evento estavam também o senador Aloizio Mercadante (PT), pré-candidato ao governo paulista, Michel Temer (PMDB), presidente da Câmara e cotado para vice de Dilma, e o ministro da Saúde, José Temporão.

O evento em Tatuí foi o primeiro de uma maratona vivida por Lula e Dilma em São Paulo. Às vésperas de deixar o ministério para concorrer à Presidência, a candidata do PT reforçou a agenda no Estado comandado por Serra, seu rival eleitoral.

Nos eventos, Lula demonstrou preocupação com a Justiça Eleitoral, depois de levar duas multas: uma de R$ 5 mil, na semana passada, e a outra ontem, de R$ 10mil, por propaganda eleitoral antecipada, e evitou citar diretamente a candidatura de Dilma. O presidente, no entanto, destacou a ampliação dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com o PAC II, e destacou o programa Minha Casa, Minha Vida, duas das principais bandeiras da ministra.

Em Osasco, na região metropolitana de São Paulo, Lula disse que seu governo está fazendo o que gestões anteriores não fizeram aos mais carentes e afirmou que esse "processo de reparação vai continuar". Em seguida, declarou que não poderia falar quem daria continuidade às obras, para não ser punido. A plateia, então, gritou "Dilma, Dilma". "Se for multado, vou trazer a conta para vocês", disse, ao participar da entrega de habitações construídas com recursos do PAC. "Quem é que vai pagar a minha conta? Levanta a mão ai para eu ver quem vai pagar a minha multa. Eu vou cobrar, viu?".

À população carente de Osasco, o presidente anunciou o "compromisso" de o governo federal construir "mais 2 milhões de casas nos próximos quatro anos". Lula disse que não existe uma cidade no Brasil que não tenha uma obra do governo federal" e que são poucos os municípios que não têm "um projeto habitacional do governo."

Ao discursar com o microfone na mão, Lula dominou o plateia. O presidente defendeu a independência financeira da mulher, que deve "trabalhar e não ficar dependendo do salário do marido". "Não tem nada mais humilhante do que chegar de manhã e falar: "amorzinho, me dá R$ 10?" Se ele estiver de bom humor e for um cara como eu, dá logo e não pergunta para quê. Mas se não estiver de bom humor, vai falar: "outra vez? O que você vai fazer com R$ 10?" Como se ela tivesse que explicar", comentou, sob aplausos. "A mulher trabalhar é uma coisa sagrada para sua independência, porque quando o marido for brigar, ela vai falar: "ô baixinho, não como às tuas custas não. Vivo com você porque gosto de você. Agora não fala grosso não porque eu não preciso." Esse é o mundo ideal que precisamos construir."

Momentos antes, Lula divertiu a população ao falar que briga com as construtoras para que as moradias entregues pelo governo tenham varanda. "A quantia de dinheiro a mais é insignificante diante da importância que tem uma varanda na vida das pessoas. Em vez da mulher ficar batendo no marido com chinelo, com a concha de pegar feijão, é melhor trancar ele do lado de fora. Ele fica na varandinha, refrescando a cabeça", disse. "Uma varandinha é o mínimo que a gente pode oferecer."

O tom de brincadeira foi bem diferente do que marcou o discurso de Dilma, anterior ao de Lula. A ministra tentou ser menos séria ao lembrar desse gosto do presidente pelas "varandinhas, mas não conseguiu os risos da plateia. Ela manteve o tom de voz sério de quando defendeu temas como direitos iguais a todos.

No terceiro evento do dia, em São Bernardo do Campo, a ministra tentou aproximar-se do eleitorado feminino, ao participar da abertura do 2º Congresso das Mulheres Metalúrgicas do ABC, ao lado do presidente. O 1º congresso ocorreu há 32 anos, no mesmo ano em que Lula assumiu a presidência do sindicato e iniciou o movimento de greves na região. Dilma tem diminuído sua diferença em relação a Serra, mas o tucano tem a preferência das mulheres.

"As mulheres têm muita importância na sociedade, no trabalho, na família e agora, na política", afirmou Dilma. A ministra citou que as mulheres são maioria no país (52% da população) e reforçou que elas são capazes de dirigir e de serem boas líderes. Dilma citou os feitos do governo, como a criação de uma secretaria especial para tratar das desigualdades da mulher, a aprovação de lei que torna crime a violência contra a mulher, a criação de creches na próxima fase do PAC e o estimulo ao consumo interno, com o aumento da oferta de crédito e da renda real. "No governo Lula, aumentou o consumo da máquina de lavar, do aspirador de pó, isso melhorou a vida das mulheres", disse. Depois dos três eventos, Lula e Dilma participaram, ainda, da celebração do Dia Nacional da Comunidade Árabe no Brasil.