Título: Irã aposta no Brasil
Autor: Fleck, Isabel
Fonte: Correio Braziliense, 29/06/2010, Mundo, p. 22

Inclusão do país no processo é uma das condições do presidente Mahmud Ahmadinejad para voltar às negociações com as grandes potências. Ele quer também uma ¿posição clara¿ do Ocidente sobre Israel

Disposto a negociar, sim, mas sob as suas condições. Esse foi o recado enviado ontem às potências ocidentais pelo presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, durante entrevista coletiva em Teerã. Entre as exigências do Irã estão a inclusão de Brasil e da Turquia nas conversações, a exposição de uma posição clara do Ocidente em relação ao programa nuclear de Israel e uma definição sobre o que o grupo cinco mais um (os membros permanentes do Conselho Segurança das Nações Unidas mais a Alemanha) realmente quer. Atendidas essas exigências, as negociações podem ser retomadas ¿ mas só no fim de agosto, segundo Ahmadinejad. ¿Nós retardaremos as conversas em razão da má conduta e da adoção da nova resolução (impondo sanções)¿, esclareceu o presidente.

O prazo coincide com o fim do mês de Mordad, no calendário persa. ¿Será uma punição, para que eles aprendam como falar com outras nações¿, disse. Ahmadinejad garantiu que continua disposto a iniciar a troca de urânio conforme previsto na Declaração de Teerã, assinada em maio com Brasil e Turquia. Entretanto, isso só será possível se mudar a ¿composição¿ do grupo negociador. ¿Quem disse que só os países do grupo cinco mais um devem participar das negociações? Outros países também devem estar presentes. Se de um lado estão Rússia, França e Estados Unidos, o Irã irá junto da Turquia e do Brasil¿, argumentou. Outra exigência é que as potências ocidentais apontem quais pontos do Tratado de Não Proliferação (TNP) o Irã não tem cumprido, para ser considerado ¿uma ameaça¿.

Ahmadinejad rebateu declarações do diretor da CIA (agência de inteligência dos EUA), Leon Panetta, de que até 2012 o Irã já teria material para duas bombas atômicas. Disse que seu governo é ¿esperto demais¿ para saber que bombas atômicas são ¿inúteis¿. ¿Armazenar armas nucleares é estupidez, porque essas armas já provaram que não funcionam¿, afirmou.

O presidente iraniano aproveitou o assunto para alfinetar o principal adversário do regime islâmicoo, os Estados Unidos. Ahmadinejad disse que está ¿preocupado com a segurança do povo americano¿, já que o país declarou oficialmente um arsenal nuclear com cerca de 5.600 ogivas. E sugeriu que ¿um governo que não é capaz de estancar um vazamento de petróleo¿ não pode cuidar da segurança de seu material nuclear. Irônico, ofereceu mais uma vez ajuda para conter o derramamento no Golfo do México, que já dura mais de um mês.

Guerra psicológica

Horas antes da coletiva de Ahmadinejad, o porta-voz da diplomacia iraniana, Ramin Mehmanparast, tinha desqualificado as afirmações de Panetta. ¿Esse tipo de declaração faz parte de uma guerra psicológica lançada para passar uma imagam negativa das atividades nucleares pacíficas do Irã¿, disse à agência oficial de notícias Irna. ¿Os dirigentes americanos, e em particular os serviços de inteligência, sabem melhor do que ninguém que o programa iraniano não é, de maneira alguma, militar¿, completou. Segundo Panetta, o Irã tem a quantidade necessária de urânio para produzir dois artefatos atômicos, mas o mineral ainda não está enriquecido à taxa necessária (90%) para fazer a bomba. O presidente russo, Dmitri Medvedev, demonstrou preocupação no domingo diante do anúncio feito pelo diretor da CIA.

Para Ahmadinejad, todas essas acusações não passam de ¿pretextos¿ para justificar um ataque militar ao Irã. ¿Se a questão nuclear não existisse, eles iam criar outra desculpa¿, acusou. ¿As políticas dos EUA e de seus aliados em relação ao Irã, nos últimos 57 ou 58 anos, foram de inimizade¿, acrescentou. Ele reafirmou as ameaças lançadas pelo presidente da estatal Empresa de Navegação da República Islâmica (Irisl), Mohamad-Hossein Dajmar, de que o Irã vai retaliar qualquer medida de inspeção a seus navios por parte de outros países ¿ com base na nova rodada de sanções aprovada pelo Conselho de Segurança.