Título: Volume de chuva foi o maior da história
Autor: Magalhães , Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2010, Especial, p. A14

O desabamento generalizado de encostas, um problema recorrente na cidade do Rio de Janeiro e na região metropolitana sempre que chove com mais intensidade, é produto de falta de planejamento, de investimentos e de vontade política, segundo o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio de Janeiro (Crea-RJ), Agostinho Guerreiro. "Equipamentos, tecnologia e projetos (para resolver o problema) existem em abundância", afirmou.

Segundo a Prefeitura do Rio, a chuva, que começou no fim da tarde da segunda-feira, foi a maior que o Rio já registrou. Em menos de 24 horas, foram 288 milímetros de precipitação, acima dos 245 milímetros da chuva que destruiu a cidade em 1966. "Foi o maior volume de chuvas relacionadas a enchentes já registrado em nossa cidade. Tivemos a chuva forte somada à maré alta e ressaca, o que agravou a situação", disse o prefeito Eduardo Paes (PMDB). Os dados foram atribuídos ao Alerta Rio, sistema da prefeitura que começou as medições em 1997. A informação gerou polêmica, porque haveria registros de índices pluviométricos maiores em 1988.

Somente no bairro histórico de Santa Teresa (região central), cujas encostas estão totalmente ocupadas por favelas, as primeiras informações indicavam ocorrências de 14 mortes, seis delas em um só deslizamento, na favela do Morro dos Prazeres. Segundo Paes, o deslizamento no local, pela sua dimensão, seria comparável ao que ocorreu na virada do ano em Angra dos Reis e na Ilha Grande, no sul do Estado, quando morreram mais de 60 pessoas. Houve deslizamentos também em outros morros da capital, como Borel, Turano, dos Macacos e Andaraí, todos na Zona Norte.

Os deslizamentos não foram limitados a morros ocupados por favelas. No Humaitá, zona sul da capital, desabou parte de uma encosta ocupada por mansões, no mesmo local onde ocorrera outro deslizamento em fevereiro de 1988. O deslizamento ameaçou a Casa de Espanha, tradicional clube da colônia espanhola no Rio. Na zona sul de Niterói, um motorista que passava com a família morreu quando seu carro foi atingido por outro deslizamento em área de mansões, no bairro de São Francisco (Zona Sul). No Joá, outro bairro de alta renda, um deslizamento provocou interdição parcial da via que liga a Zona Sul à Barra da Tijuca (Zona Oeste).

Segundo Guerreiro, no auge do período de urbanização da sociedade brasileira, entre as décadas de 1950 e 1970, cerca de 90% da cobertura de Mata Atlântica do Rio de Janeiro foi destruída, acabando com a proteção natural contra as chuvas intensas que, por si, só já são perigosas em qualquer circunstância. Ele disse que foi acumulado muito conhecimento técnico ao longo das últimas décadas, sem as correspondentes intervenções por parte das autoridades.

Segundo ele, no fim da década de 1980 foram mapeados no Rio cerca de 600 pontos de alagamentos, sendo 20% deles classificados como de "extrema gravidade", incluindo a famosa Praça da Bandeira, ponto central da ligação da Zona Norte com o Centro e a Zona Sul, que ficou totalmente alagada no temporal de ontem. "Junto com o diagnóstico foram apresentados projetos e sugestões, mas não houve recursos para obras de prevenção e de manutenção (das galerias)."

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estava ontem no Rio, prometeu "ajuda material", mas disse ser necessário esperar que seja feito um levantamento para saber o que será preciso. "A ajuda material está pronta, à disposição, mas não parece que seja o caso, o Estado do Rio está preparado", afirmou Lula. O prefeito Eduardo Paes disse que pediu a Lula a inclusão de 4 mil moradias no programa Minha Casa, Minha Vida. A iniciativa seria uma forma de retirar pessoas que hoje moram em áreas de risco no município. "Não é mais admissível as pessoas permanecerem em áreas de encostas", disse Paes. (CS e FG)