Título: Casa nova, velhos problemas
Autor: Branco, Mariana
Fonte: Correio Braziliense, 30/06/2010, Cidades, p. 35

Estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo revela que cresceu 600% a média mensal de reclamações e pedidos de ajuda de pessoas que compraram imóveis na planta

Muita gente pensa que adquirir um imóvel na planta, novo em folha e mais barato do que o pronto para morar é garantia de bom negócio. Entretanto, são muitas as armadilhas que a compra de uma casa ou apartamento ainda longe de existir na realidade pode abrigar. Com o superaquecimento do mercado imobiliário e as facilidades de crédito oferecidas graças a programas e medidas de estímulo do governo federal, o cuidado deve ser redobrado. O alerta está no balanço divulgado pelo Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), organização não governamental (ONG) sediada em Brasília. A entidade, que orienta e presta serviços jurídicos a consumidores, registrou alta de nada menos que 600% na média mensal de reclamações e pedidos de auxílio de pessoas que tiveram problemas após fechar negócios com construtoras. Os atendimentos saltaram de 20 para aproximados 120 por mês.

José Geraldo Tardin, presidente do Ibedec, explica que a alta impressionante na média de atendimentos foi registrada depois de janeiro deste ano. Os números dizem respeito a consultas por e-mail feitas por pessoas residentes no DF, e a visitas à sede da instituição, na Asa Sul.

Tardin, que é advogado especialista em direito do consumo, diz não ter dúvidas de que o boom imobiliário no país contribuiu para o aumento das reclamações e busca por orientação. Para ele, o dado relativo ao aumento deve ser encarado por um prisma mais positivo do que negativo.

¿Não se trata apenas de as pessoas estarem comprando mais, de ter maior oferta. Elas estão mais conscientes, tendo maior acesso a informações e, portanto, reclamando e tirando dúvidas. A compra de imóveis é um assunto que está em evidência, a mídia tem divulgado muito¿, analisa. O presidente do Ibedec acrescenta que o programa Minha Casa,Minha Vida colocou as unidades novas como vedetes do mercado.

Daí o fato de dúvidas e denúncias girarem em torno deles.

Além do crescimento de 600% na média de atendimentos feitos a moradores de Brasília e região, consultas via internet feitas por habitantes de outras unidades da Federação à entidade, que tem atuação nacional, também aumentaram.

Até o fim do ano passado, eram cerca de nove a 10 e-mails diários vindos principalmente do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.

Hoje, são 30 a 40 consultas por dia feitas pelos consumidores de fora do DF. Portanto, houve alta média da ordem de 400%.

Mas, afinal, o que pode dar errado com os imóveis na planta? A maioria das reclamações e consultas ¿ cerca de metade delas, de acordo com José Geraldo Tardin ¿ referem-se ao atraso na entrega das chaves. É comum as construtoras não cumprirem o prazo estipulado em contrato.

¿Elas fazem uso de um período de prorrogação de até 180 dias, em geral acordado com o cliente, mas a Justiça tem entendido que só se houver motivo de força maior, isso é permitido¿, explica Tardin.

Segundo ele, quando houver demora na entrega, o dono do imóvel pode receber o equivalente a um aluguel da unidade em questão por mês, até poder ocupá-la.

Alvo de menos reclamações por falta de conhecimentos dos consumidores, os contratos com índices de correção monetária e juros indevidos são comuns. A prática de cobrar juros compostos do cliente é uma das mais frequentes.

Trata-se da cobrança de taxa adicional calculada não sobre o valor regular da parcela, mas sobre aquele acrescido de juro pago no mês anterior. ¿Isso vai contra o Código de Defesa do Consumidor, que proíbe a uma parte obter vantagem excessiva sobre a outra¿, afirma o presidente do Ibedec. Más condições na estrutura do apartamento ou casa, tamanho inadequado da garagem e outras questões também constituem dor de cabeça para quem realiza o sonho do imóvel próprio.

O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF (Sinduscon), Elson Ribeiro e Póvoa, disse considerar ¿natural¿ a alta nas reclamações registradas pelo Ibedec. ¿Se você aumentou o número de apartamentos no mercado, isso vai acontecer. As empresas têm que ser responsabilizadas.

O sindicato é sempre pela legalidade¿, afirmou.