Título: Começa a corrida pela placa eletrônica
Autor: Borges , André
Fonte: Valor Econômico, 12/04/2010, Empresas, p. B3

Foi dada a largada. Depois de um longo período de testes e definições técnicas, o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) chegou à versão final do padrão tecnológico que será usado na instalação de chips de identificação em todos os veículos do país. A decisão era aguardada pelos fabricantes de equipamentos, que agora poderão desenvolver sistemas baseados nas normas estabelecidas pelo Denatran.

A tecnologia da "placa eletrônica" - como ficou conhecido o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos (Siniav) - foi criada pelo Centro de Pesquisas Avançadas Wernher von Braun, de Campinas (SP), com o apoio de empresas especializadas em sistemas de rastreamento. Com a instalação dos chips nos carros, será possível ampliar o controle fiscal de veículos em situação irregular - com atraso de multas, IPVA e seguro obrigatório -, aprimorar a gestão do trânsito e monitorar carros que tenham sido roubados.

Nas próximas semanas, o Denatran divulgará uma relação de laboratórios que farão a homologação de equipamentos dos fabricantes. O próprio von Braun já está preparado para isso. As regras de segurança do projeto - uma lista com mais de 150 itens - incluem exigências como o intercâmbio automático de informações entre diferentes Estados, independentemente de quem seja o fornecedor da tecnologia adotada por cada Detran. A etiqueta com o chip (tag) também deverá ser instantaneamente inutilizada em casos de tentativas de remoção. Isso impedirá, por exemplo, que um chip seja clonado, evitando que carros roubados ou em situação irregular transitem livremente. Para fazer a captura dos dados, serão instaladas milhares de antenas em estradas e avenidas (ver quadro acima).

Segundo Alfredo Peres da Silva, diretor do Denatran, o custo de implantação do projeto - desde a instalação dos chips nos carros até a montagem da infraestrutura para receber os dados - deverá ser bancado pelo Detran de cada Estado, por meio do caixa acumulado com as multas de trânsito. "São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, já sinalizaram que não vão cobrar nada do cidadão", diz.

O valor de cada etiqueta com chip pode variar de R$ 2 a R$ 10, dependendo do grau de sofisticação do componente, mas segundo Silva, o custo também dependerá da frota de cada região e da negociação com o fornecedor.

A expectativa do Denatran é de que as primeiras licitações para compra de equipamentos ocorram nos próximos meses. Em São Paulo, onde a inadimplência no pagamento de taxas atinge cerca de 30% da frota, o governo estadual já realizou testes com uma tecnologia parecida à desenhada pelo órgão federal. A ideia é que a instalação do chip ocorra em situações como a inspeção veicular, atualmente realizada no Estado paulista e no Rio. "Nos demais Estados, uma opção seria instalar a etiqueta no momento de licenciamento dos veículos", diz Silva.

Uma extensa lista de fabricantes nacionais e estrangeiros está de olho na frota nacional de 51 milhões de veículos. Durante a fase de estudos do projeto, ao menos 23 fabricantes submeteram suas tecnologias a testes. Entre estes estão companhias como 3M, Firit, Freescale, Kapsch e NXP Semicondutores. Também acompanham o andamento do projeto a Enternet, Q-Free, Texas Instruments e Transcor. No ano passado, essa disputa também foi engrossada pelo Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), estatal vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT).

Apoiado pelo MCT, o Ceitec vem mantendo um relacionamento estreito com o Denatran para projetar-se como o principal fornecedor dos chips de identificação. Eduard Weichselbaumer, presidente do Ceitec, afirmou que a estatal tem estrutura suficiente para produzir 100 milhões de chips de identificação por radiofrequência (RFID, na sigla em inglês) por ano.

Sejam quais forem os fornecedores, diz Dario Sassi Thober, diretor do Centro de Pesquisas Avançadas Wernher von Braun, a decisão por criar um padrão nacional vai garantir ao país a independência tecnológica, além da ausência de pagamento de royalties. "Testamos a tecnologia até a exaustão e chegamos a um padrão com patente nacional", afirma. Desde a criação do Siniav, lançado há exatamente quatro anos, o governo federal defende a bandeira de priorizar o desenvolvimento nacional de sistemas e componentes, com o propósito de não ter de pagar pelo uso de propriedade intelectual de terceiros. "Hoje temos um sistema de nível internacional, uma tecnologia que pode ser usada por qualquer país do mundo", comenta Thober.

No mês passado, o Denatran conseguiu aprovar outra medida relacionada a componentes de rastreamento de veículos. A resolução que trata da obrigatoriedade de instalação de um dispositivo antifurto em veículos novos havia sido revogada por uma liminar do Ministério Público Federal de São Paulo, que acusou a medida de violar preceitos constitucionais de privacidade e intimidade. Para aprovar o projeto, o Denatran retirou a função do rastreamento dos dispositivos, deixando apenas as funções de bloqueio e localização do veículo somente com a contratação do serviço e a expressa autorização do proprietário. O projeto passa a valer a partir de julho.