Título: Capitalização da Petrobras opõe Levy e Barbassa
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 01/04/2010, Política, p. A7
Enquanto o Congresso Nacional discute assuntos paroquiais relativos à partilha entre os Estados dos "royalties" do petróleo, um aspecto fundamental no novo marco regulatório acontece apenas nos bastidores: quanto a Petrobras vai pagar para ficar com os valiosos blocos do pré-sal. Em jogo, está quem ganha e quem perde com as bilionárias descobertas no subsolo brasileiro - a estatal, o governo ou os investidores privados, sobretudo estrangeiros.
Ontem, uma pontinha desse debate veio à tona em uma acalorada discussão entre o diretor financeiro da Petrobras, Almir Barbassa, e o secretário da Fazenda do Rio, Joaquim Levy, em um dos lobbies do Hotel Plaza de Nova York, palco famoso por ter sediado uma discussão na década de 1980 que levou à desvalorização do iene ante o dólar.
Levy fez rápidos cálculos para mostrar que, dependendo do preço, poderá haver ou a diluição do capital da Petrobras, o que significa na prática a reestatização da empresa, ou a concessão de benefícios imensos aos "investidores de Nova York", onde se encontra a maior parte dos detentores do capital da Petrobras em mercado. "Quem vai ganhar é o dono do Blackrock", disse Levy, referindo-se a Larry Fink, que comanda a gigantesca administradora de recursos que detém 6,6% das ações preferenciais da empresa. "O petróleo é dos brasileiros", disse Levy.
"Qual é o problema?", devolveu Barbassa. "Você está com uma visão socialista, comunista." Levy ironizou: "Sim, sou o Joca, um conhecido socialista..." A discussão aconteceu no intervalo do seminário "Invest in Rio", organizado pelo Valor e pelo "The Wall Street Journal", logo depois de ambos participarem de uma mesa de debates sobre a economia carioca.
Barbassa, num primeiro momento, disse que não contestaria os cálculos feitos por Levy para "não entrar em especulações sobre números". Diante das provocações, porém, ele defendeu o processo de avaliação, afirmando que será transparente, feito com a ajuda de consultores independentes contratados pela Petrobras e pelo Tesouro.
Dentro do novo marco regulatório do pré-sal, está previsto que o governo irá fazer um aporte de reservas de 5 bilhões de barris na Petrobras. A avaliação desses barris de petróleo é fundamental, diz Levy. Se o preço for muito alto, o Tesouro fará um aporte de capital gigantesco e os investidores minoritários não serão capazes de acompanhá-lo na oferta pública que ocorre em seguida.
Levy calcula que, se o preço de cada barril for estimado em 15 dólares, o aporte do Tesouro será de US$ 75 bilhões. Como os investidores minitorários detêm dois terços do capital da empresa, eles teriam que colocar US$ 150 bilhões na companhia em uma oferta pública de ações para não diluir a sua participação no capital da empresa, cifra considerada irreal diante das atuais condições do mercado.
Barbassa respondeu que 15 dólares por barril é uma estimativa exagerada, comparada com os números de analistas do mercado financeiro. "Você não está entendendo as coisas e poderá entender se deixar eu explicar", disse, em meio a interrupções de Levy. O executivo não citou números, mas as estimativas de mercado são de que a Petrobras faça uma captação entre US$ 25 bilhões e US$ 50 bilhões.
Um preço de petróleo mais baixo, argumentou Levy, provoca um problema no outro extremo. Os investidores minoritários pagariam muito barato pelas reservas e se beneficiariam com os lucros das descobertas do pré-sal.
Barbassa explicou que esse ganho não irá ocorrer porque será feito um ajuste em um contrato entre a Petrobras e o Tesouro. Uma das possibilidades é um pagamento da estatal ao governo. Os termos desses contrato, porém, são um mistério. Ele será negociado entre duas partes, sem a participação do Congresso e sem vigilância direta da opinião pública. "Sou um cidadão e tenho direito de saber", disse Levy. "Não é da Petrobras que você tem que cobrar isso", respondeu Barbassa, empurrando o ônus para o Tesouro.
Ver também caderno especial "Investimentos no Rio"