Título: Lula dá posse aos ministros e provoca Serra
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 01/04/2010, Política, p. A10

A cerimônia de posse dos dez ministros do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que assumiram ontem para substituir os políticos que vão se candidatar nas eleições de outubro, foi palco de discursos de campanha, sem números ou balanços de planos de governo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desafiou a oposição, afirmando que ela vai ter que se desdobrar para vencer as eleições de outubro. "Os ministros estão saindo e eu vou continuar aqui trabalhando como um desgraçado. Quem quiser me derrotar, vai ter que trabalhar mais do que eu", declarou.

Lula também fez críticas indiretas ao governador de São Paulo, José Serra (PSDB): "Quem quiser dormir até às 10h, quem quiser achar que tem que fazer relação com um formador de opinião pública para me derrotar, vai ter que botar o pé no barro, vai ter que viajar este país, vai ter que correr", afirmou, numa referência indireta ao hábito do ex-governador que prefere trabalhar madrugada adentro e não acordar cedo.

Segundo o presidente, o povo brasileiro aprendeu, graças ao seu governo, a gostar de si próprio. Respondeu aos críticos que o atacaram por causa das viagens ao Oriente Médio para tentar negociar a paz. "Eles perguntavam quem é esse baixinho metido? Eu sou baixinho, mas o povo brasileiro não é. O povo brasileiro é grande", afirmou o presidente.

A permanência ou não no cargo do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ainda é a grande dúvida no governo. Ontem, o presidente fez um apelo para que Meirelles ficasse no BC até o fim do mandato. O presidente da instituição pediu 24 horas para uma definição. Encontrou-se ontem com Lula, mas adiou por mais 24 horas o anúncio de sua decisão.

Depois de agradecer individualmente a todos os ministros que deixam suas Pastas, Lula reservou as palavras finais do discurso para a candidata do PT a presidente, Dilma Rousseff. Não por ser ela a única mulher a deixar o cargo ontem, mas porque "a Dilma é parte integrante do sucesso de tudo que esses "meninos" fizeram de bom, tudo", completou.

O presidente admitiu que não há pessoas insubstituíveis, mas afirmou que Dilma é uma figura que vai fazer falta no governo. "Eu acho que a Dilma foi de uma competência extraordinária, com sua capacidade de articulação e a capacidade de trabalho". Para o presidente, poucas vezes a Casa Civil trabalhou com a competência que caracterizou a gestão de Dilma Rousseff.

"A tua saída é um prejuízo para o país, mas a tua saída é dentro de uma perspectiva de que você seja mais do que chefe da Casa Civil. Então, a esperança é a motivação da tua saída", completou o presidente. "O Brasil, Dilma, deve a ti muitas coisas. E eu acho que a Erenice (Guerra, nova ministra da Casa Civil) tem uma responsabilidade imensa pelo que vai acontecer daqui para a frente, na continuidade dos trabalhos que nós fizemos", acrescentou.

Escalada para ser a estrela da festa, Dilma foi a porta-voz dos ministros na solenidade de exoneração coletiva. Trocou o tradicional discurso frio, com números de governo, por uma emocionada declaração da capacidade de Lula em governar para os mais pobres. Pontuou sua fala com exemplos concretos de pessoas carentes beneficiadas por programas como Luz Para Todos, Minha Casa, Minha Vida e PAC Saneamento e Habitação.

Dilma afirmou que a solenidade proporcionava-lhe uma sensação estranha. "É uma alegria triste, melancólica. Mas, ao mesmo tempo, a alma está cheia de esperança, otimismo e fé". Dilma disse que o governo do presidente Lula conseguiu coisas muito além das sonhadas pela geração de 68. "E olha que nós sonhávamos alto. O seu governo mostrou que o desenvolvimento social é filho da democracia e irmão da liberdade".

"O povo brasileiro nos ensinou a sermos fortes, pois deixou de ser coadjuvante e passou a ser protagonista de sua própria História. Já o governo nos ensinou a sermos persistentes e com o senhor, presidente Lula, aprendemos a ser corajosos", enalteceu Dilma em seu discurso.

Ela destacou que o mesmo presidente capaz de conversar com líderes mundiais sobre a crise econômica, o desenvolvimento ambiental sustentável e o processo de paz no Oriente Médio, jamais abandonou os catadores de papel, os hansenianos, os deficientes. "O povo brasileiro sempre acredita no futuro. O senhor nos ensinou a construí-lo. Sob sua inspiração e com tudo que estamos fazendo, estamos prontos para fazer mais e melhor".

Para a ex-ministra, cada um que agora deixa o cargo para ser candidato "tem um patrimônio na biografia: o de ter feito parte da era Lula. E que todos os que tiveram esse privilégio deixam o governo melhor do que entraram". E cedeu de vez espaço para o discurso eleitoral. "Agora, temos de ampliar aquele futuro que chegou no presente".

Na entrevista concedida logo após a cerimônia, Dilma disse estar preparada para a campanha eleitoral. Afirmou que "eleição é um momento bom, é o exercício da democracia". Ela negou que o fato de jamais ter disputado uma eleição possa atrapalhar seu desempenho. "A minha vida nunca foi fácil. Muito mais difícil é aguentar a ditadura".

Mesmo sendo o centro das atenções, a ministra afirma que não é fruto de um projeto solo. "É um projeto meu e de cada um dos companheiros que aqui estão, saindo ou permanecendo no governo. Participei de todos os grandes momentos desde 2005, quando assumi a chefia da Casa Civil. Ao deixar o cargo, uma parte do governo sai junto comigo", reconheceu a ministra.

Dilma não acredita na possibilidade de uma campanha eleitoral de baixo nível. "Não precisamos ser duros, mas temos que ser firmes, para mostrar as realizações dos dois governos ao eleitor".