Título: Meirelles pode permanecer no BC, caso Dilma vença eleições
Autor: Costa , Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 05/04/2010, Política, p. A9

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, desistiu de disputar um mandato eletivo, em outubro, em troca da possibilidade de ficar mais quatro anos no comando do BC, em eventual governo da candidata do PT às eleições, Dilma Rousseff. Meirelles queria ser indicado candidato a vice-presidente na chapa de Dilma, mas não conseguiu viabilizar seu nome no PMDB, partido ao qual caberá designar o companheiro de Dilma em 3 de outubro.

O presidente do BC anunciou a decisão de ficar na tarde da quinta-feira, após uma série de frustradas tentativas para se tornar o vice da candidata do PT. Meirelles saiu desgastado do processo, num momento de tensão inflacionária ao qual o BC deve responder com aumento da taxa de juros. Aumento que já deveria ter ocorrido na última reunião de diretoria do banco, segundo alguns analistas do mercado.

O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse a Meirelles que dificilmente ele seria indicado pelo PMDB para a vice de Dilma. O partido, que deve integrar a coligação governista ao Palácio do Planalto na condição de aliado preferencial, por mais de uma vez deixou claro a Lula e a Meirelles que pretende indicar para o cargo o presidente da sigla, deputado Michel Temer (SP).

Meirelles, na realidade, nunca esteve nos planos do PMDB. Sua indicação ganhou algum alento no início de março quando o PT e o Planalto esperavam que Dilma ultrapassaria o candidato do PSDB, José Serra, nas pesquisas de intenção de voto a presidente. Ocorreu o contrário: o tucano abriu vantagem no fim do mês, segundo pesquisa Datafolha.

A sondagem esfriou um movimento na campanha de Dilma e no Palácio do Planalto para diminuir o poder da direção do PMDB na escolha do candidato a vice. Se depender de Lula, o companheiro de chapa de Dilma será outro que não o deputado federal Michel Temer, preferido do partido mas com um longo histórico de arestas com o presidente.

O prazo para a formalização da coligação PT-PMDB e para a escolha do vice de Dilma é o fim de junho. Meirelles, no entanto, precisava tomar agora a decisão - para disputar um mandato eletivo, ministros devem deixar o cargo até seis meses antes da eleição, prazo que se encerrou no sábado, 3 de abril.

A opção de Meirelles era deixar o Banco Central e tentar viabilizar sua candidatura no PMDB até junho. Mas sua única chance era que Lula e Dilma conseguissem, desde já, impor seu nome ao partido. Meirelles é "cristão-novo" no PMDB. Diante da insistência do presidente do BC, um integrante do núcleo da campanha de Dilma reagiu com ironia: "Tudo bem, ele sai e disputa a convenção do PMDB com o Michel Temer".

Meirelles filiou-se ao PMDB no ano passado. À época, além da Vice alimentava também a ideia de se candidatar a presidente da República, na hipótese de Lula não viabilizar um nome do PT. Ele dispunha da alternativa de concorrer ao Senado, mas preferiu ficar com a perspectiva de permanecer no cargo em eventual governo de Dilma Rousseff. O argumento é que o presidente do BC funcionará como uma espécie de garantia de que nada mudará na política monetária. Mesmo argumento usado para "vender" sua candidatura a vice.

Ao anunciar que permaneceria no cargo, Meirelles disse que, na realidade, nunca tivera "ambições políticas", mas reconheceu que ficar "não foi uma decisão fácil, foi difícil". Disse ainda que ficava para atender um pedido do presidente Lula. Convocada para por um fim ao suspense, a entrevista do presidente do BC serviu para Meirelles tentar amenizar o desgaste provocado por sua frustrada - e atrapalhada - incursão na seara política.

"Decidi ficar para colaborar para a perenização da estabilidade econômica", disse Meirelles. "Considerei, sim, a hipótese política, mas conclui por continuar à frente do BC. Vou comunicar agora ao PMDB. Espero que ele aprove a minha decisão", disse, referindo-se ao deputado Michel Temer. Dirigentes pemedebistas disseram a Meirelles que ele será a principal indicação do partido para o ministério de um eventual governo Dilma Rousseff.

"Eu resolvi ficar no Banco Central porque conclui ser onde eu poderia melhor contribuir para a continuidade dessa racionalidade econômica", disse Meirelles, insistindo na tecla de que é uma espécie de aval à manutenção da política monetária. Questionado diretamente, afirmou que não cogita continuar no cargo, caso a candidata do PT à sucessão de Lula ganhe as eleições e lhe faça o convite. O Valor apurou, no entanto, que o assunto foi tratado por Meirelles tanto com o presidente Lula como com Dilma Rousseff.

Com Meirelles no BC, o presidente Lula reúne hoje, na Granja do Torto, o ministério com a configuração de depois da saída dos dez ministros que serão candidatos nas próximas eleições.