Título: Chesf tem alternativas para possível saída da Queiroz Galvão do consórcio
Autor: Goulart, Josette; Lima, Marli
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2010, Brasil, p. A4

de Brasília

Única empresa a se manifestar abertamente como vencedora do leilão de Belo Monte, a Chesf viu sua situação política mudar da água para o vinho em apenas um dia. Funcionários da estatal e políticos do Nordeste foram os que mais reclamaram da perda de autonomia das subsidiárias com as reformulações recentes no sistema Eletrobras, incluindo a marca. Agora, a subsidiária nordestina tem 49,98% da maior usina a ser construída no país, embora possa perder uma parte dessa participação para a Eletronorte. Para o presidente da Chesf, Dilton da Conti, "ninguém é insubstituível" entre as empresas do consórcio Norte Energia, que venceu o leilão.

Valor: Qual a situação da Chesf hoje, em relação às outras grandes subsidiárias da Eletrobras?

Dilton da Conti : Em termos de lucro, ela é a melhor atualmente. Temos R$ 5 bilhões de receita operacional bruta. Em 2008, o lucro da Chesf sozinha foi de R$ 1,437 bilhão. Em 2009, foi de R$ 764,4 milhões. A empresa tem capacidade de alavancagem muito grande. A dívida representa apenas valor insignificante, 0,04% da geração de caixa. Quando precisamos de R$ 25 milhões para fazer alguma obra pequena, muitos chegam querendo nos emprestar R$ 300 milhões. Eu tenho que dizer "não quero tudo isso, não". Para quem tem capacidade de alavancagem, não só o BNDES está oferecendo uma boa linha de crédito hoje.

Valor: Como foram estabelecidas as condições para participar da concorrência em Belo Monte?

Conti : Em qualquer leilão, as controladas têm limites de taxa interna de retorno (TIR), para termos um fluxo de caixa mínimo. Atendemos diretrizes que são colocadas pela controladora. Temos a informação dessas diretrizes que têm de ser atendidas. Mas as condições finais são definidas com o consórcio. Nós somos empresa estatal, mas isso não quer dizer que não vamos pensar em resultado. Somos uma empresa com meta sustentável, portanto temos de trabalhar nessas condições. Nesse leilão, fomos líder. A Eletrobras estabelece [as condições] às controladoras, mas elas não aceitariam deságio inoportuno ou inadequado. Ela não chega para nós dizendo que o lance tem de ser de tanto. Quem discute com os parceiros e empreiteiros é a subsidiária. O valor final só decidimos no próprio dia. O preço foi definido ali na sala fechada, momentos antes do leilão. Não tinha celular nem nenhum metal ali dentro. Todos participaram do processo e, quando surgiu um valor, ele era o valor do consórcio.

Valor: Mas algumas empresas parecem não ter ficado satisfeitas com a definição final.

Conti : Aí é uma questão de avaliação de cada uma. Na nossa verificação, [o preço] batia em cima. O resultado ratificou a validade do nosso modelo. O conjunto teve papel participativo amplo na decisão final, mas evidentemente a Chesf teve de entrar um pouco mais por sua experiência. Se um membro do consórcio entende da questão ambiental, ele dá essa referência. Se temos experiência em engenharia e controle, a posição da Chesf passa a ser significativa. A somatória disso levou a um referencial. Se A, B, C, D ou F estão dizendo algo diferente, eu ainda tenho minha própria opinião.

Valor: Mas e se esses grupos efetivamente saírem do consórcio?

Conti : Eles têm o direito de sair. Há possibilidade de a empresa se retirar. Se eu aceito TIR de X e ele aceita só TIR de X mais 2%, ele está fora. Mas em um empreendimento nessa escala, a competição existiu e a definição foi bem consistente. Se a empresa anunciou que pode sair, nada impede que as pessoas em determinado momento tomem uma posição e depois a revejam. Se a Queiroz Galvão, que já trabalhou muitas vezes conosco, não quiser continuar, eu diria que não houve nada contra nenhum dos participantes. Gostaríamos que fosse mantida a estrutura inicial do consórcio, mas, se não for, temos alternativas. Ninguém é insubstituível. A Queiroz Galvão é uma excelente empresa, idônea e tem porte para a obra. Para o consórcio, ela seria muito boa. Mas, se por um motivo qualquer ela fizer análise e achar que não será possível participar, procuraremos outros parceiros.

Valor: Como a empresa ainda pode aperfeiçoar esses cálculos financeiros para enfrentar esse desafio de construir Belo Monte?

Conti : Estamos no modelo 70, 20, 10. Ou seja, 70% da energia será vendida no mercado cativo a R$ 78 o Megawatt-hora (MWh). Para 20%, vamos vender a preço de mercado, que é maior do que o valor definido no ambiente regulado. Para os 10% restantes (que têm de ser destinados a consumidores de energia que fazem parte do consórcio), há várias alternativas. Podemos contratar outro grupo para se associar ou contar com sócios que fariam uma distribuição proporcional entre seus coligados.