Título: Belo Monte pode ter pesos-pesados
Autor: Goulart, Josette; Lima, Marli
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2010, Brasil, p. A4

de Brasília

Até 23 de setembro, o governo e a Eletrobras vão tentar convencer algumas empresas a entrar no consórcio vencedor do leilão da usina hidrelétrica de Belo Monte, realizado na terça-feira. O plano é conversar com pelo menos três grupos pesos-pesados de capital nacional - CSN, Gerdau e Braskem. O governo teme que algumas empresas do consórcio vencedor desistam do negócio por causa do lance de R$ 77,97 por Megawatt-hora (MWh) feito no leilão, considerado pelos sócios agressivo demais e, portanto, com retorno muito limitado. Novos sócios são bem-vindos, desde que aceitem os parâmetros dados. Ainda que ninguém deixe o grupo, no mínimo ele mudará com a entrada da Eletronorte e de uma indústria, que terá que responder por 10% do consumo da energia assegurada usina - de 4.571 Megawatts.

O consórcio Norte Energia, vencedor, é composto por Chesf-Eletrobras (49,98%), 4 (10,02%), Gaia Energia (10,02%), J Malucelli (9,98%), Galvão Engenharia (3,75%), Mendes Junior (3,75%), Serveng-Civilsan (3,75%), Contern (3,75%) e Cetenco (5%). Perderam Neoenergia, Andrade Gutierrez, Vale e Companhia Brasileira de Alumínio (CBA).

Enquanto o grupo perdedor apresentou preço apenas R$ 0,10 abaixo do teto de R$ 83 por MWh, o vencedor teve lance 6,02% abaixo do limite máximo. Após o anúncio da vitória, porém, não foi consensual a felicidade entre os componentes do consórcio Norte Energia. Antes do resultado, o sócio de uma empresa do Norte Energia confidenciou a um colega na sede da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que perder não seria mal. "Se ganharmos, aí é que haverá um problema", disse ele. A conclusão se daria pelo fato de o preço definido para tarifa apresentar taxa interna de retorno bastante reduzida, principalmente para os padrões privados. Após o resultado anunciado, o diretor de Engenharia da Chesf, José Aílton de Lima, disse que a Queiroz Galvão "pediu uns dias para pensar" na participação. Na Casa Civil, porém, a análise seria de que se trata de pressão das empresas, que, em vez de querer desistir do projeto, estariam pleiteando maior participação e garantias de que atuarão ativamente na construção da usina. Por isso, o governo ameaça indicando que Camargo Corrêa e Odebrecht ainda podem ser contratadas como construtoras da empreitada. O governo não descarta, porém, que algumas das empresas participantes do grupo vencedor vendam parte de suas cotas, até para ter já um lucro garantido com isso. Lima, da Chesf, informou na entrevista coletiva após o leilão que os fundos de pensão também deverão integrar o consórcio. Petros, da Petrobras, e Funcef, da Caixa Econômica Federal, participaram das negociações para composição final dos dois grupos. Para honrar o consumo de 10% da energia gerada em Belo Monte a partir de 2015, o grupo Norte Energia já fez sondagens com grupos industriais. A Gerdau teria se comprometido em fazer parte do grupo - e, por consequência, instalar uma planta nos arredores do rio Xingu (PA). Mas o consórcio ainda pode avaliar propostas de outras companhias do mesmo porte, como CSN e Braskem. Uma surpresa considerada seria se a Gaia, do grupo Bertin, anunciar investimentos que significassem consumo dessa energia. A entrada de novos grupos também daria maior musculatura financeira para o consórcio vencedor. Quanto melhor for a capacidade financeira dessas empresas e o desenho elaborado para a construção, melhores serão as condições de crédito do BNDES, que financiará até 80% do empreendimento, previsto oficialmente em R$ 19 bilhões. Lima, da Chesf, não informou qual a previsão de custo da obra para o Norte Energia, mas assegurou que, com o lance apresentado, é possível construir a usina e ter lucro. Pelo resultado do leilão, o consórcio receberá em 30 anos receita de R$ 62 bilhões, referente ao 70% da energia gerada a ser vendida no mercado cativo. É com os 30% restantes que o consórcio buscará elevar ao máximo sua receita anual. Segundo relato de presentes, o consórcio Belo Monte Energia sofreu uma cisão momentos antes de apresentar a proposta. A Vale e as estatais teriam indicado que aceitariam tarifa menor, na linha da apresentada pelos concorrentes. Mas a CBA e a Neoenergia não aceitaram a revisão. No caso do Norte Energia, a adoção de ágio de 6% foi preponderante, embora tenha suscitado críticas. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que, em hipótese nenhuma haverá readequação econômico-financeira da controladora de Belo Monte. "Se for bom, é bônus do construtor, se for ruim, é ônus do construtor."