Título: Governo planeja definir preços para uso de redes de fibras ópticas
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 26/04/2010, Empresas, p. B1

Em meio às discussões do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), ganha força no governo federal a tese de que a Telebrás poderá definir preços para o uso da fibra óptica instalada pelas companhias estatais e pelas operadoras privadas de telefonia. O PNBL deverá ser definido nos próximos dias, resultando em um decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com ele, o poder Executivo pretende restaurar a Telebrás e permitir que a companhia atue na infraestrutura de banda larga e até na oferta do serviço, embora essa ação não esteja prevista inicialmente. Ao que parece até agora, a Telebrás será, pelo menos, gestora da espinha dorsal (backbone) e das vértebras (backhaul) do sistema de cabos.

A tese do governo para interferir na formação do preço do serviço pelas operadoras tem base na interpretação de que esses cabos foram instalados pelas companhias telefônicas por exigência dos contratos de concessão e, portanto, podem ter tarifas reguladas. O governo cobraria R$ 230 ao mês pela oferta de 1 megabit por segundo (Mbps) aos provedores de acesso, que poderiam cobrar R$ 350 ao ofertar a mesma capacidade. Como os provedores podem replicar a capacidade para até dez consumidores, seriam cobrados R$ 35 ao mês do usuário. O custo médio hoje é R$ 60, pela interpretação do governo.

Sob esse modelo, a Telebrás, pelas contas de um entusiasta da empresa dentro do governo, atingiria um ponto de equilíbrio financeiro após 3 anos e, por volta do quinto ou sexto ano depois de implantado o PNBL, a estatal de capital aberto poderia ter uma receita operacional líquida de cerca de 40%.

Esse cenário depende de uma série de medidas regulatórias que deverão ser implementadas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), já que o decreto deverá ter caráter genérico. A agência defende a ideia de que o backhaul já instalado pelas operadoras faz parte de um serviço público, embora o texto das normas sobre o assunto abra espaço para controvérsias. A Abrafix, associação que representa as teles fixas, já tem uma ação na Justiça contra essa interpretação, que permite a tarifação do uso do backhaul. Na visão das teles, essa parte da infraestrutura é privada e seu valor é decidido pelo proprietário.

O uso dos cabos das operadoras privadas é fundamental para o sucesso do plano de banda larga porque o governo possui pouco mais de 20 mil quilômetros de rede, enquanto as teles têm mais de 200 mil quilômetros.

Se prevalecer a tese de que o backhaul é público, o governo, por meio da Telebrás, poderia intervir em cidades onde há monopólio de oferta de banda larga. Ela poderia determinar à operadora que possui essa rede que a ceda a um concorrente pelo valor de R$ 230 o Mbps, por exemplo. Pagando esse valor à operadora e vendendo o serviço de acesso ao usuário por R$ 35 por Mbps, o provedor teria receita bruta de R$ 12 por usuário. Se houver desoneração de impostos, esses valores podem cair mais.

Para as teles, a elevada carga tributária permanece como o maior entrave o avanço do PNBL. "O principal obstáculo é a dicotomia entre a baixa renda dos consumidores e o elevado tributo embutido no preço do serviço, de 43%", diz Cesar Rômulo Silveira Neto, superintendente-executivo da Associação Brasileira das Telecomunicações (Telebrasil). Recentemente, a Oi apresentou à Casa Civil um projeto que previa desoneração de R$ 27 bilhões. Na visão do governo, porém, o plano com a Telebrás não teria incentivos superiores a R$ 2,5 bilhões numa primeira fase.

Para as teles ingressarem no programa, o governo vai oferecer recursos do BNDES em condições que ainda serão divulgadas.

Sob o plano de que a Telebrás definiria as condições para as teles compartilharem suas redes com outros provedores, foi proposta a adoção de métodos de arbitragem para mediar eventuais conflitos entre as empresas e evitar procrastinações sem sentido.

Segundo um documento da Anatel - apresentado em uma reunião do comitê organizado pela Presidência da República para debater o plano e ao qual o Valor teve acesso -, a agência de telecomunicações poderia adotar, também, outros procedimentos regulatórios para auxiliar na expansão do projeto.

Um deles é fazer a licitação de uma faixa de frequência de 450 megahertz (MHz), que teria um alcance maior e poderia chegar à zona rural do país. Outra ação seria retomar o leilão da banda de 3,5 gigahertz (GHz) e da banda H de telefonia, que expandiria a oferta de conexão por via móvel e aumentaria a competição no setor.