Título: Governo reforça controle de fundos
Autor: Prestes, Cristine
Fonte: Valor Econômico, 30/04/2010, Finanças, p. C1

O governo federal estuda uma forma de aumentar o controle sobre investimentos feitos por fundos estrangeiros na compra de ativos no Brasil. O objetivo é evitar que recursos provenientes de atividades ilícitas sejam "lavados" em território nacional. O tema está sendo analisado pelo Ministério da Justiça em conjunto com o Conselho de Controle de Atividades Financeira (Coaf), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central (BC).

De acordo com o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., a ideia de criar mecanismos para evitar a lavagem de dinheiro por meio de fundos estrangeiros que investem no país, através da compra de ativos, surgiu durante a crise econômica iniciada nos Estados Unidos em 2007, quando o governo percebeu que, apesar da falta de liquidez no sistema financeiro mundial, não houve descapitalização dos bancos no Brasil. "Quando fomos ver o porquê, percebemos que os bancos haviam afrouxado o cumprimento das regras de compliance", diz Tuma Jr.

A tipologia da lavagem de dinheiro por meio de fundos estrangeiros conta com o sigilo oferecido pelos paraísos fiscais a empresas offshore - segundo Tuma Jr., 80% da lavagem no Brasil ocorre por meio dessas companhias. De acordo com secretário, após o início da crise foram identificados indícios de lavagem por meio de fundos estrangeiros, que estão sendo investigados sob sigilo. "Temos feito alguns trabalhos nesse sentido", afirma. Entre os fundos investigados, há casos de recursos de brasileiros obtidos de forma ilícita e enviados para fora ilegalmente, e que retornaram ao Brasil ao serem repassados a offshores e posteriormente a fundos que investiram em ativos nacionais. "Com a crise os bancos afrouxaram o compliance no recebimento desses recursos", diz. "E essa é uma situação que já foi identificada em vários países do mundo, não apenas no Brasil."

De acordo com Lorenzo Parodi, especialista em lavagem de dinheiro da Deall Riscos e Inteligência, em muitos países a utilização de fundos para legalizar recursos provenientes de crimes é feita de forma sistemática. Segundo ele, nos últimos três anos surgiram diversos alertas sobre o uso de fundos para lavar dinheiro. Pelas regras de compliance seguidas pelo sistema financeiro, no Brasil e na maior parte do mundo, os bancos devem exigir de qualquer correntista informações sobre o titular da conta e a origem dos recursos depositados. No caso de fundos de investimento brasileiros, sujeitos às regras da CVM, os bancos exigem informações sobre as pessoas físicas beneficiárias desses fundos - o que dificulta a lavagem.

A mesma exigência, no entanto, não é feita por alguns paraísos fiscais em relação aos fundos neles criados. E esses fundos estrangeiros, por não captarem recursos no Brasil, mas apenas se destinarem a comprar ativos locais, não se submetem às regras brasileiras, mas às do país onde têm sede. Os bancos nacionais, por sua vez, embora tenham a obrigação de saber quem são os titulares das contas abertas por eles, não têm a obrigação de buscar o investidor de um fundo estrangeiro que abre uma conta no país - que pode ser uma offshore com sede em um paraíso fiscal, cujos titulares são protegidos pelo sigilo oferecido por esses países.

A criação de regras para evitar a lavagem de dinheiro por meio de fundos no Brasil ainda é uma ideia incipiente. Na opinião de Tuma Jr., a opção ideal seria obrigar os bancos a exigir dos fundos estrangeiros detalhes sobre seus investidores. "Isso já inibiria a lavagem", diz. O advogado José Eduardo Carneiro Queiroz, especialista em fundos do escritório Mattos Filho Advogados, no entanto, alerta para a necessidade de que normas nesse sentido sigam o padrão internacional. "É preciso tomar cuidado para não criar um ambiente regulatório que afugente o investidor", diz.