Título: Israel critica Brasil por Irã, mas fala em ajuda na paz
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2010, Brasil, p. A3

de Jerusalém

O Brasil pode ajudarIsrael a negociar um tratado de paz com a Síria, disse o presidenteisraelense, Shimon Peres, em conversa reservada com o presidente LuizInácio Lula da Silva, a quem sugeriu que o Brasil poderia fazercoincidir, em território brasileiro, visitas do presidente sírio,Bashar Al-Assad, e do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu.Al-Assad já recebeu convite para visitar o Brasil e, ontem, Netanyahuconcordou em fazer uma visita ao país ainda neste ano. A aproximação doBrasil com o Irã recebeu, porém, forte e unânime desaprovação dasprincipais forças políticas de Israel, que saudaram Lula com palavrasduras sobre as relações com os iranianos. Oministro de Relações Exteriores, o ultra-ortodoxo Avigdor Lieberman,teve a reação mais forte à insistência brasileira em evitar sanções aoIrã e negociar para que o país não use energia nuclear para finsmilitares. Lieberman boicotou a visita de Lula ao Knesset, o parlamentoisraelense, e a reunião de que participaria, com o brasileiro e oprimeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. Entre as razões doboicote, o jornal israelense Haaretz citou a recusa de Lula em visitaro túmulo do ativista criador do sionismo Theodore Herzle (Lulavisitará, nesta semana, o túmulo do ex-líder da Autoridade Palestina,Yasser Arafat). Os brasileiros argumentam que o compromisso, incluídode última hora, não fez parte de visitas recentes do presidente daFrança, Nicolás Sarkozy, nem do da Itália, Silvio Berlusconi. Apesarde referências elogiosas ao presidente brasileiro, o Irã dominou osdiscursos no Knesset. "Os países devem acordar da sonolência eenfrentar as bases satânicas do regime dos aiatolás", discursou o líderdo Knesset, Reuven Rivlin, ao saudar Lula. Ele pediu a Lula paraunir-se aos que reconheceram "o perigo iraniano", e alertou que aoposição a sanções contra o Irã, pelo programa nuclear do país, seriavista como "sinal de fraqueza". "Creio e creio que o senhor também acredite que esse regime tem valoresdiferentes dos que o senhor, sua cultura, e o povo do Brasilrepresentam", endossou Netanyahu, do partido direitista Likud, comoRivlin. "Eles usam crueldade, são contra as minorias; odeiam aliberdade, adoram a morte e vocês adoram a vida". Mais dura, a líder daoposição, Tzipi Livni, do Kadima, de centro, acusou o Irã, presididopor Mahmoud Ahmadinejad, de usar o conflito entre Israel e palestinospara promover a "doutrina do ódio". Ela disse saber dos valorespacíficos de Lula, mas cobrou dele "não somente criticar, mas apoiar assanções ao Irã nas Nações Unidas". Mesmocom a manifesta preocupação com o Irã e o boicote do ministro deRelações Exteriores (líder de um partido em expansão em Israel,tradicionalmente oposto a concessões aos palestinos e árabesisraelenses), as autoridades israelenses mantiveram um tom elogioso aLula e saudaram os acordos de cooperação entre os dois países.Netanyahu e Lula decidiram, por sugestão do israelense, um sistema dereuniões a cada dois anos entre os chefes de Estado e ministros deIsrael e do Brasil, a começar em 2010 com uma visita doprimeiro-ministro ao Brasil. Falandoao Knesset, Lula evitou improvisos, defendeu a busca de "alternativasracionais e duradouras", com "compaixão" e diálogo, para a paz noOriente Médio. Sem citar o Irã, condenou o terrorismo e o holocausto,lembrou o compromisso do Brasil e da América Latina contra as armasnucleares e defendeu a coexistência de um estado de Israel, soberano,seguro e pacífico, e um Estado palestino "soberano, pacífico, seguro eviável". Ao tocar nesse assunto, criticou o recente anúncio israelensede construção de 1,6 mil casas na região oriental de Jerusalém,reivindicada pelos palestinos como sua futura capital. Lulafoi aplaudido de pé pelos parlamentares, pouco mais de 70 dos 120membros do parlamento. "Foi um bom discurso, muito polido", comentou umdos principais aliados de Netanyahu, Yossi Peled, conhecido generalisraelense, que manteve, porém, a crítica à relação entre Brasil e Irã."Um monte de países prefere fechar os olhos. US$ 1 bilhão, US$ 2bilhões são mais fortes que qualquer ameaça", disse, ecoando a acusaçãoda oposicionista Livni, de que interesses econômicos garantemsustentação ao Irã. "Foi importante que ele lembrasse o direito aoestado Palestino. Teve mais palmas que George Bush", afirmou ovice-presidente do parlamento, Ahmad Tibi, do partido minoritário querepresenta os árabes. ShimonPeres publicamente pediu a Lula que aproveite seu encontro, hoje, com opresidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, paragarantir que Israel está comprometido com o processo de negociações e abusca da paz. O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, foievasivo ao ser consultado sobre o pedido de apoio do Brasil àsnegociações entre Israel e Síria. "O presidente da Síria já foiconvidado ao Brasil; quem sabe o outro pode, por coincidência...",comentou, recusando-se, depois a confirmar se há intenção de fazercoincidir as visitas de Netanyahu e Al-Assad.