Título: Lucrativas, elétricas estrangeiras descartam vender ativos no país
Autor: Goulart, Josette
Fonte: Valor Econômico, 10/05/2010, Empresas, p. B1
de São Paulo
As companhias elétricas estrangeiras regidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Brasil viram seus lucros crescerem 230% acima da inflação, desde que se iniciou o governo Lula no ano de 2003. Mesmo em 2009, quando a crise fez com que o consumo de energia caísse e as principais elétricas de capital nacional registrassem queda nos resultados, as estrangeiras tiveram lucro real 5,5% maior do que o ano anterior. Tão lucrativas, não será a crise que agora se reaviva na Europa a incentivar qualquer movimento de saída do país para cobrir posições lá fora. Pelo contrário, elas esperam ganhar mais com o forte crescimento do consumo que já se verifica no primeiro trimestre deste ano. Sejam americanas ou europeias, elas querem ficar no país e expandir seus negócios principalmente em geração. Aquelas que possuem ativos de distribuição podem até não ter intenção de comprar outras companhias, mas tampouco querem vender as suas, frustrando os planos das companhias nacionais que almejavam crescer comprando esses ativos. E quem diz que estão aqui para ficar são os principais executivos de seis das maiores elétricas estrangeiras que estão hoje no Brasil. Juntas AES Brasil, Duke Energy, EDP, Endesa, GDF Suez e Iberdrola investiram aproximadamente R$ 48 bilhões desde que chegaram ao Brasil - a maior parte delas nos processos de privatização, há dez anos. Só no ano passado, juntas elas lucraram cerca de R$ 7,5 bilhões. "Se não saímos com a crise do racionamento quando perdemos muito dinheiro, não vai ser agora que vamos sair", diz o presidente da Endesa Brasil, Marcelo Llevénes, se referindo a um período em que as elétricas registraram prejuízos de bilhões de reais quando os consumidores reduziram em 20% o consumo de energia. Em março, a Coelce, empresa de distribuição da Endesa no Ceará, registrou um consumo 25% maior do que o ano anterior. A companhia ainda é dona da Ampla, que distribui energia no Estado do Rio de Janeiro. A afirmação do presidente Llevénes põe fim aos planos da Cemig de crescer comprando os ativos da Endesa. Outra companhia espanhola que joga areia nas intenções de consolidação do setor - e nesse caso nas ambições da CPFL, sob o comando da Camargo Corrêa - é a Iberdrola. "Em uma empresa de mais de 100 anos, passamos por muitas crises, e nem por isso a solução de nossos problemas foi vender os ativos" , disse o diretor-geral da empresa no país, Mario Ruiz-Tagle Larrain. A Iberdrola é dona de 39% da Neoenergia, onde a Previ tem a mesma participação. Abaixo da Neoenergia estão ativos das distribuidoras da Bahia, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Os planos de Cemig e CPFL também são frustrados pela AES. Dona da Eletropaulo, a maior distribuidora do país, a companhia americana reafirma seu desejo de adquirir os 49% hoje em poder do BNDESPar caso o banco coloque à venda sua parte na Brasiliana, dona da Eletropaulo e da AES Tietê. As duas companhias vêm dando muitas alegrias a seu principal acionista nos últimos anos. Depois de resolvida a pendenga de uma dívida não paga com o BNDES, a AES comemora o lucro constante que seus ativos registram no país. A companhia de geração do grupo, a Tietê, é um exemplo. Lucrou desde 2003 mais de R$ 4 bilhões, corrigidos pela inflação. A Eletropaulo lucrou no mesmo período R$ 3,3 bilhões. "Diferentemente da distribuição, em que os ativos se escassearam, na geração é possível crescer em função dos novos projetos", diz o presidente da AES Brasil, Britaldo Soares. A companhia de geração sob o controle da AES era sonho de consumo do grupo Odebrecht, que planeja ser a maior geradora privada do país em dez anos. A empresa também tentou comprar os ativos de geração da Duke Energy. Mas desde o início do ano sob gestão de um novo presidente, Armando Henriques, a companhia reforçou que quer voltar a investir no país. As duas americanas estão há dez anos sem fazer novos investimentos expressivos. A busca por novos e antigos ativos de geração, tanto das que já estão no setor há mais de uma década como a da novata Odebrecht, pode ser explicada pelos fortes resultados das companhias de geração, é só ver o caso da Tractebel, da francesa GDF Suez. Há mais de dez anos no Brasil, os novos investimentos dessas companhias estrangeiras não precisam mais vir de fora do país. Seus resultados no Brasil é que garantem novos investimentos. Os dados de investimentos estrangeiros diretos no país registrados pelo Banco Central, por exemplo, mostram que desde 2000, quando chegaram a R$ 7 bilhões, o investimento direto em eletricidade vem caindo fortemente. Mas isso não significa que as estrangeiras estão investindo menos. Os números mostram é que elas estão reinvestindo seus lucros. A EDP, por exemplo, desde 2004 investiu no país mais de R$ 5 bilhões, tendo como principal fonte de financiamento suas operações no país.