Título: Efeito dominó do euro?
Autor: Antonio Perez
Fonte: Valor Econômico, 06/05/2010, Investimentos, p. D1

Os efeitos da crise europeia e do euro no mercado brasileiro, especialmente na bolsa, devem se prolongar por mais tempo do que o imaginado inicialmente. O problema da Grécia já contagiou outras economias frágeis da Europa - Portugal, Espanha, Irlanda e Itália - e o risco maior é que mais países sejam atingidos, num efeito dominó. Para o investidor, a recomendação é resistir ao pânico de sair da bolsa em um momento ruim, após uma forte queda. Ao mesmo tempo, também não é hora de fazer grandes compras, uma vez que os preços das ações podem cair ainda mais no curto prazo, alertam analistas.

O pacote armado em conjunto pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e a União Europeia não resolve totalmente o problema da Grécia, que terá que reestruturar parte da dívida, avalia Roseli Machado, responsável pela Fator Administração de Recursos (FAR). Além disso, há todo o custo social do ajuste fiscal exigido, que pode levar o país a uma crise política. O risco de contágio para outros países da União Europeia é real, afirma ela, lembrando que, em julho, vencem cerca de ¿ 100 bilhões de títulos da dívida de Portugal, Espanha e Itália. "Será um teste sobre a disposição dos credores em financiar esses países." Para ela, o problema europeu deve afetar mais o crescimento mundial, a menos que haja uma ruptura na rolagem das dívidas.

Já no Brasil, a bolsa está mais ligada à Ásia, que está de certo modo descolada da crise. "A China vai tentar reduzir o ritmo, mas, mesmo assim, vai crescer bastante, sustentando um bom preço para as commodities."

Para Roseli, a bolsa pode sofrer um pouco mais no curto prazo, especialmente nos próximos três meses. Mas, em um horizonte de dois a três anos, não há dúvida de que o mercado brasileiro vai subir. Ela lembra que há outros problemas que pesam na bolsa no momento, como as megaofertas da Petrobras e do Banco do Brasil, previstas para este ano. "Se não fosse a oferta e Petrobras tivesse acompanhado a recuperação da Vale, o Ibovespa teria batido 80 mil pontos", diz. Para ela, há boas opções de ações, para quem pensa no médio prazo, no Ibovespa e, principalmente, na segunda linha.

No ano, a ação ordinária (ON, com voto) da Petrobras cai 17%, enquanto a preferencial (PN, sem voto) série A da Vale sobe 5,61%. Sob efeito de Petrobras, o Ibovespa recua 5,36% no ano, percentual que, em dólar, vai a 7,74%. O que tem segurado o índice são os papéis de mineração - como Vale e MMX -, e mercado interno, como Souza Cruz e Cielo. Ontem, o Ibovespa fechou praticamente estável, com alta de 0,07%, a 64.914 pontos.

A leitura do mercado é de que o pacote de ajuda evita o calote no curto prazo, mas não elimina a perspectiva de que a Grécia não tenha condições de pagar a dívida no médio prazo, afirma Roberto Padovani, estrategista sênior de investimentos para América Latina do banco WestLB.

O agravante é o risco de contágio, com dúvidas sobre a Itália e Espanha, às quais a Alemanha tem muita exposição. O resultado pode ser o baixo crescimento da Europa, que afetará o PIB mundial, as commodities e respingará nos emergentes, sobretudo no Brasil. "A história do ano é de volatilidade, com ciclos de otimismo e frustração", afirma.

Mas o mercado não está entrando em uma tendência de queda, ressalta Padovani. Para o estrategista, é natural que haja oscilações mais fortes após um expressivo movimento de recuperação, como o do ano passado. "Sou otimista com a economia mundial e brasileira, mas vai haver muita volatilidade."

Nesse ambiente, é melhor trabalhar com aportes menores em renda variável. O investidor também pode aproveitar o vaivém com operações de curto prazo. Padovani não vê espaço para quedas mais fortes do mercado e, portanto, o investidor já pode começar a formar posições.

Ele mantém a perspectiva de Ibovespa aos 85 mil pontos no fim do ano e acredita em uma arrancada no quarto trimestre, quando o cenário global estará mais claro e já se saberá quem vai ser o próximo presidente brasileiro. "Sem tantas dúvidas lá fora, os investidores vão começar a antecipar o crescimento de 2011", afirma. "O lado doméstico do Ibovespa vai continuar se beneficiando do mercado aquecido e o lado externo vai se apoiar na alta das commodities".

A recomendação para o investidor em bolsa é não fazer mudanças drásticas, afirma Eduardo Jurcevic, superintendente de Investimentos do Grupo Santander Brasil. "Não é hora de fazer loucuras, sair vendendo ações por conta de um cenário pontual", diz. Ele acredita que a instabilidade do mercado vai continuar no médio prazo, mas a corretora do Santander mantém a previsão de um Ibovespa nos 80 mil pontos no fim do ano. "O que pode acontecer é aumentar a procura dos investidores por fundos com principal protegido", diz. Na renda fixa, ele sugere diversificar em fundos DI e crédito privado pós-fixado, aproveitando a tendência de subida dos juros.