Título: Disputa ameaça projeto indiano na Bolívia
Autor: Moura, Marcos de; Souza
Fonte: Valor Econômico, 12/05/2010, Internacional, p. A10

de São Paulo O que deveria ser o maior investimento já feito por uma empresa estrangeira na Bolívia transformou-se numa confusão, com troca de acusações e ameaças de cancelamento do projeto. Além das disputas com o governo, a gigante indiana Jindal ainda não conseguiu equacionar dois elementos-chave para o negócio: de onde virá a energia para o futuro complexo siderúrgico e de que forma a produção será escoada. Em 2007, a mineradora assinou um acordo com o governo Evo Morales que previa investimentos de US$ 2,1 bilhões ao longo de oito anos para a exploração da mina de ferro de Mutún. A mina, que teria uma das maiores reservas de minério de ferro do mundo, fica em Puerto Suárez, perto da fronteira com a cidade mato-grossense de Corumbá. Este seria o maior aporte já feito pela Jindal num único projeto. Mutún é o único projeto da empresa na América Latina. Pelo acordo, nos primeiros cinco anos, US$ 1,5 bilhão seriam investidos. A produção de ferro começaria de fato após essa primeira fase. Mas, diz a empresa, os prazos só podem começar a correr quando o governo cumprir exigências contratuais: emissão de licenças ambientais e a concessão das terras da mina para a empresa dar início às atividades. As licenças ambientais foram emitidas. O problema são as terras. "Até hoje, não temos acesso a 60% da área destinada à construção do complexo siderúrgico. Por isso, o prazo para investimento não está correndo", disse ontem ao Valor Jorge Gallardo, gerente para assuntos legais da Jindal na Bolívia e um dos negociadores com La Paz. Mas, no mês passado, a Empresa Siderúrgica Mutún (ESM), criada por Morales para atuar ao lado da Jindal, decidiu dar um ultimato à multinacional. Descontou garantias bancárias no valor de US$ 18 milhões que, segundo o contrato, poderiam ser sacados se a empresa não cumprisse seus investimentos. A Jindal classifica execução das garantias como "ilegal" e "ilegítima" e como algo que afetou os "interesses econômicos" da empresa, disse Gallardo. "A empresa precisa de segurança jurídica e não pode aceitar uma cobrança ilegal, não pode aceitar ser sancionada", diz ele, alegando que o investimento ainda não saiu porque o governo não fez sua parte. A empresa vem negociando com o governo Morales, mas não conseguiu até agora chegar a bom termo. Chegou a cogitar levar a cobrança para uma arbitragem internacional, mas voltou atrás e diz que antes disso tentará resolver a disputa pelo diálogo. Uma das ideias da empresa é que US$ 18 milhões sejam abatidos de impostos que ela terá de pagar quando estiver operando, disse Gallardo. "A empresa não quer isso, mas, se não chegarmos a um acordo, poderemos desistir do contrato." A agência de informação oficial da Bolívia, ABI, noticiou que a multa para desistência seria de US$ 800 milhões. A empresa insiste que são US$ 18 milhões. O governo considera a possibilidade de resolver a questão das terras por meio de um decreto presidencial, mas diz que as garantias não serão devolvidas. O aço que for produzido em Mutún abasteceria a Índia, a China, América do Sul e EUA. A hidrovia dos rio Paraguai e Paraná seria uma opção ainda não decidida para levar o aço até um porto brasileiro. E a energia para o projeto, ponto também em aberto, poderia vir de uma termelétrica a ser construída ou até mesmo do Brasil, especula Gallardo.