Título: Planalto cede a ruralistas em índice de produtividade
Autor: Zanatta , Mauro
Fonte: Valor Econômico, 13/05/2010, Política, p. A11

Sob pressão da bancada ruralista e do PMDB, o governo desistiu de promover a atualização dos índices de produtividade agropecuária usados como parâmetro nos processos de desapropriação de terras para a reforma agrária.

A forte resistência da bancada ruralista no Congresso e a rejeição unânime de parlamentares pemedebistas foram decisivas para o recuo tático do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas pesou ainda mais o receio de provocar embates ideológicos prejudiciais à campanha da candidata oficial ao Palácio do Planalto, a ex-ministra Dilma Rousseff, cuja identificação com os movimentos sociais do campo desagrada lideranças ruralistas.

Outro fator importante para o recuo do presidente Lula foi o distanciamento de líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). "O custo político era alto demais. E não podemos fazer marola em ano eleitoral", resumiu um ministro do governo. Além disso, diz ele, a medida só vigoraria em 2012. Os novos índices obrigariam produtores rurais a elevar a produção rural, mesmo em anos de crise, para cumprir requisitos de utilização da terra (GUT) e de eficiência da exploração (GEE).

A desistência de Lula foi mal recebida pelos movimentos. "Depois que ele mandou um ministro anunciar e não assinou, perdeu-se a chance naquele momento. Desistir, agora, não chega a nos surpreender", diz o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Alberto Broch. "Mas não significa que vamos deixar de cobrar essa dívida do Estado, goste o Lula ou não. É uma coisa que divide a sociedade e vamos pautar, mesmo que ele diga que não vai assinar".

Em agosto de 2009, Lula havia fixado prazo de 15 dias para a publicação de uma portaria interministerial com a revisão dos índices. Mas os ruralistas reagiram e o PMDB fechou questão contra a revisão para evitar que suas digitais fossem impressas na medida antipática aos eleitores rurais. À época, o PMDB já comandava o Ministério da Agricultura, responsável por formalizar a atualização dos índices.

A senha para a desistência do governo foi a exacerbação dos debates provocados pelo anúncio do Plano Nacional de Direitos Humanos, no início do ano. O plano foi atacado por aliados no Congresso e acabou alterado para agradar parte da bancada ruralista, além de outros interesses setoriais.

Para pressionar o governo a desistir, os ruralistas aprovaram, na Câmara e no Senado, projetos de lei que retiravam o poder do Executivo sobre a revisão dos índices. Mesmo assim, a equipe técnica do governo considerava a atualização bastante razoável porque teria alcance restrito a poucos municípios do país. Na média geral das principais culturas, 90% dos municípios teriam novos índices inferiores ou iguais às médias históricas apuradas pelo IBGE nos últimos dez anos. A proposta do grupo de trabalho dos ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário, alteraria os índices mínimos em apenas 369 dos 4.842 municípios onde se produz soja no país. Ou seja, modificaria as exigências em apenas 7,6% desses municípios. A proposta incluiria somente 1,2% dos 5.512 municípios produtores de milho (640), 11% dos 4.442 localidades onde cultiva-se laranja (488) e 2,7% de cana-de-açúcar (146).

A filtragem realizada pelo governo considerava a média da produtividade do IBGE.