Título: Mercosul e UE já preparam reunião
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 13/05/2010, Especial, p. A16

A União Europeia (UE) e o Mercosul deverão ter no fim de junho ou começo de julho a primeira reunião do pós-relançamento da negociação do acordo de livre comércio birregional, na prática ignorando a oposição da França ao entendimento. A vontade entre os dois blocos é de avançar rapidamente. Se isso vai ocorrer, é outra história. A França, peso-pesado da cena europeia, atraiu nove países para espernear contra a retomada da negociação e mais ainda contra a possibilidade de um acordo, que vê como desastroso para a combalida agricultura europeia.

A questão agora é se o presidente Nicolas Sarkozy terá coragem de criar confusão na Cúpula UE-Mercosul, prevista para relançar a negociação, na segunda-feira em Madri. Se os franceses se opuserem, o problema será entre os europeus, porque o Mercosul já disse que está pronto para negociar.

A França faz mais barulho, mas a maioria dos 27 países europeus está a favor e quer o acordo com o Mercosul. E são países como a Alemanha, Grã-Bretanha, Itália e a própria Espanha que, silenciosamente, estão dando as cartas. Por isso a Comissão Europeia aceitou relançar a negociação em Madri.

A primeira reunião entre os dois blocos, a ter a data confirmada, vai definir o calendário da fase final da negociação. Se Bruxelas não colocar ofertas na mesa, restará ao Mercosul tirar as consequências.

Em todo caso, no mesmo dia os franceses vão mobilizar ministros de Agricultura, em Bruxelas, na segunda-fera, para exigir da UE estudo sobre o impacto de um acordo. Certos negociadores consideram que, enfim, os franceses "rasgaram a máscara" e mostram quem é realmente o obstáculo ao acordo.

A mensagem da França na prática é de que a UE já concedeu demais na negociação de Doha, na Organização Mundial do Comércio (OMC), e não tem mais a oferecer na negociação birregional.

O problema é sobretudo no setor de carnes, onde o Mercosul, e especificamente o Brasil, tem peso preponderante. Nada menos de 82% da carne bovina importada pela UE vem do bloco do Cone Sul e 64% no caso da carne de frango. Das exportações de 2,3 bilhões no ano passado com carnes para o mercado europeu, o Brasil obteve 1,5 bilhão.

Na OMC, pela proposta que resta na mesa de uma negociação que ninguém sabe quando será terminada, a UE deverá oferecer cota (com tarifa menor) entre 250 mil a 330 mil toneladas de carne bovina, grande parte dela para o Brasil e Argentina.

Para ter uma ideia das dificuldades na negociação birregional, o Mercosul pediu em 2006 cota de 300 mil toneladas para carne bovina e na ocasião Bruxelas acenava com 150 mil toneladas.

Bruxelas já indicou que UE e Mercosul ganhariam, cada, 4,5 bilhoes por ano a mais, com a liberalização birregional. Mas a França alega que um entendimento com o Mercosul será catastrófico para Irlanda, Luxemburgo, Reino Unido, Bélgica, Áustria, Eslovênia, França e Suécia, no caso de carne bovina. E para Hungria, Chipre e Polônia no setor de aves.

Ontem, os países que se juntaram aos franceses foram a Irlanda, Grécia, Hungria, Áustria, Luxemburgo, Polônia, Finlândia, Romênia e Chipre. A situação está mais difícil em meio à crise. A Grécia, à beira da falência, aderiu aos protestos contra um acordo com o Mercosul.

O comunicado para o encontro dos líderes da UE-Mercosul não estabelecerá prazo para concluir a negociação. Mas os espanhóis chegam a falar em fechar o acordo até dezembro, o que parece difícil no atual contexto político da Europa.