Título: Ação do concorrente seduz bancos
Autor: Lima , Aline
Fonte: Valor Econômico, 13/05/2010, Finanças, p. C1

Os executivos dos bancos não gostam de falar o que pensam de seus concorrentes. Mas uma ação pode dizer mais que mil palavras. E a ação, no caso, não se refere a uma atitude. Por meio de seus fundos de investimento, os bancos compram suas próprias ações e as de seus competidores. Uma análise das carteiras desses fundos parece fornecer boas pistas do que essas instituições pensam umas das outras.

O Itaú Unibanco, por exemplo, é, dentro da indústria de fundos, o maior investidor de papéis preferenciais (PN) do Bradesco, com R$ 666,42 milhões sob gestão. A gratulação é mútua. Pouco mais da metade dos recursos aportados pelo Bradesco em ações do setor bancário (R$ 472,32 milhões) tem como destino as preferenciais do Itaú Unibanco.

Essas e outras particularidades do setor bancário podem ser extraídas de um estudo inédito elaborado pela consultoria financeira Economática para o Valor. Foram analisados 8.962 fundos de investimento ativos registrados na Associação Brasileira de Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) - incluídos aí carteiras administradas, fundos exclusivos e dedicados a investidores institucionais -, a partir de informações enviadas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em dezembro de 2009, último dado disponível.

O levantamento, feito por meio de uma nova ferramenta desenvolvida pela consultoria para a análise de fundos, revela em quais ações do setor cada um dos bancos está apostando. Os papéis preferenciais do Itaú Unibanco aparecem, de longe, como os preferidos dos bancos. Eles encabeçam a lista do setor bancário, com um volume financeiro aplicado de R$ 4,07 bilhões - equivalente a 35,9% do total investido em papéis de bancos. Bradesco PN aparece na segunda colocação, com R$ 2,39 bilhões, seguido de perto das ordinárias (ON) do Banco do Brasil, com R$ 2,36 bilhões. A ação do Itaú lidera as apostas feitas pelos fundos do Bradesco e do Santander, além do próprio Itaú, e estão em segundo lugar na preferência dos fundos do Banco do Brasil. O BB também dá preferência a suas próprias ações.

Entre os bancos de varejo, Bradesco e Santander são aqueles que apostam menos em seus papéis. Nos fundos do banco da Cidade de Deus, as ações de sua emissão ocupam o terceiro lugar em volume entre os bancos (R$ 196,13 milhões), atrás de Itaú Unibanco PN e Banco do Brasil ON. A participação das units do Santander nos fundos de ações que o banco tem sob gestão é nula.

As participações acionárias detidas por meio de fundos estão longe de ter qualquer representatividade em relação ao capital total dos bancos. Portanto, os bancos estão distantes de correr o risco de ver um concorrente mandando dentro de casa. Para indicar um membro do conselho, um acionista precisa ter, no mínimo, 5% do capital total da companhia. Para efeito de comparação, os R$ 4,07 bilhões em ações preferenciais e os R$ 427 milhões em ações ordinárias do Itaú Unibanco nas carteiras de todos os fundos analisados representam apenas 2,87% do capital total do banco. "Ainda há bastante espaço para mais emissões", observa Einar Rivero, gerente de relação institucional da Economática.

Tampouco os bancos parecem exagerar na dose de ações próprias detidas por meio de seus fundos, em termos percentuais. Com o objetivo de evitar conflitos de interesse, a Instrução 409 da CVM prevê que "o fundo não poderá deter mais de 20% de seu patrimônio líquido em títulos ou valores mobiliários de emissão do administrador, do gestor ou de empresas a eles ligadas".

A quantidade de ações para livre negociação em bolsa (o chamado "free float"), ao que parece, não exerce influência direta na seleção feita pelos gestores. O capital preferencial do Bradesco, por exemplo, é mais pulverizado (98%) que o do Itaú Unibanco (89%).

Em alguns casos, o peso desses papéis na carteira dos fundos parece guardar alguma relação com a composição do Ibovespa, índice de referência da bolsa brasileira. O Itaú é o banco de maior peso no índice da bolsa e também o preferido dos fundos.

É provável que a escolha das ações de bancos recaia sobre aquelas que os analistas acreditam ter maior potencial de valorização. Procurados pela reportagem, os executivos responsáveis pela gestão de recursos dos maiores bancos do país não puderam atender à solicitação.

Mas relatórios assinados por analistas das áreas de corretagem desses grandes bancos oferecem uma pista de como as projeções para o comportamento de uma ação tendem a ser fator decisivo na hora da seleção - com a ressalva de que as avaliações, neste caso, não são da equipe de pesquisa da área de fundos.

Na corretora Ágora, do Bradesco, por exemplo, a ação preferencial do Itaú Unibanco é considerada "top pick" da carteira classificada como arrojada. Ela recebe preço-alvo de R$ 46,74 para o fim do ano, equivalente a um potencial de valorização de 24%. Nas palavras do analista Aloisio Villeth Lemos, "o Itaú Unibanco é considerado como um dos grandes players do mercado bancário, com retorno sobre o patrimônio anualizado elevado, associado à entrega de crescimento da carteira de crédito com baixo risco de inadimplência. Seus múltiplos [indicadores] são compatíveis para uma ação atrativa e com baixo risco de imprevisibilidade".