Título: Pela primeira vez desde a Constituição, Supremo condena um parlamentar
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 14/05/2010, Política, p. A9

de Brasília

O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou, ontem, o deputado José Gerardo Oliveira de Arruda Filho (PMDB-CE) a dois anos e dois meses de prisão. Foi a primeira vez, desde a Constituição de 1988, que o STF condenou um político. A pena foi convertida no pagamento de 50 salários mínimos e na prestação de serviços comunitários. Zé Gerardo, como é conhecido, foi acusado pelo Ministério Público de ter desviado verba de um convênio. A verba de R$ 500 mil deveria ter sido utilizada para a construção de um açude, quando Gerardo era prefeito de Caucaia, município localizado na região metropolitana de Fortaleza, em 1997. Mas o dinheiro foi destinado para a construção de "passagens molhadas" - uma ponte que, durante a época da cheia, fica submersa pela água. O dinheiro foi liberado pelo Ministério do Meio Ambiente e, segundo o MP, deveria ter sido utilizado exclusivamente para a construção de um açude, e não para "passagens molhadas". A ação começou a tramitar no STF, em setembro de 2006. O julgamento, realizado ontem, gerou uma divisão entre duas correntes distintas na Corte. Os debates começaram no meio da tarde e entraram pela noite. Houve uma corrente que entendeu que, então prefeito, Zé Gerardo não teve controle direto sobre o desvio da verba. Esse controle deveria ter sido feito pelos secretários municipais. Por esse motivo, Zé Gerardo deveria ser absolvido. Os ministros José Antonio Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram neste sentido. Toffoli foi bastante incisivo ao dizer que, se seguir a linha de condenar chefes do Executivo por causa de irregularidades em convênios, o STF acabará condenando o presidente da República por atos cometidos por seus ministros. Mas, outra corrente de ministros concluiu que o prefeito teve conhecimento do desvio. "O prefeito assinou sucessivas prorrogações (do convênio)", enfatizou o presidente do STF, ministro Cezar Peluso. "Isso é um indício de que ele sabia, de que tinha conhecimento e autorizou o emprego (da verba) em desconformidade com o objeto do convênio. Assim, não me resta dúvida da autoria (do crime)", completou Peluso. Lewandowski também foi bastante enfático ao defender a condenação. Ao ouvir os argumentos de Toffoli de que chefes do Executivo não têm controle total sobre convênios ou contratos de suas secretarias, ele afirmou: "Fui secretário de um grande município por quatro anos e não se comprava nenhum prego sem que o prefeito soubesse". Antes de ser juiz, Lewandowski foi secretário de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de São Bernardo do Campo, entre 1984 e 88. Ao todo, sete ministros votaram pela condenação do deputado. Esses ministros divergiram quanto à aplicação da pena. Peluso e Marco Aurélio Mello defenderam a aplicação de pena de detenção inferior a nove meses. Já Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa e Eros Grau votaram pela pena de dois anos e dois meses de detenção. Ao fim, a pena foi convertida e, com isso, Zé Gerardo terá de pagar o equivalente a 50 salários-mínimos (R$ 25,5 mil) e prestar serviços comunitários. O deputado terá 15 dias para recorrer, após a publicação da decisão. Ele poderá alegar divergência entre os votos e pedir a reformulação da sentença. Mas, se a decisão for confirmada, Zé Gerardo ficará inelegível por cinco anos. Ele continua deputado, mas não poderá se eleger. (JB)