Título: Crise na Europa ameaça as exportações asiáticas
Autor: Anderlini, Jamil; Brown, Kevin
Fonte: Valor Econômico, 21/05/2010, Internacional, p. A13

Robin Harding, Financial Times, de Kuala Lumpur, Pequim e Tóquio

A crise econômica da Europa está tendo um grave efeito sobre companhias asiáticas, à medida que a desvalorização do euro torna as exportações mais caras num dos maiores mercados externos.

O maior temor das companhias, no entanto, é que a convulsão enfraqueça a recuperação da Europa da crise financeira global, o que poderá ter um efeito maior ainda sobre a demanda de importações.

Qi Zhongyi, diretor do departamento de informação da Câmara de Comércio da China para importação e exportação de maquinário e produtos eletrônicos, disse que muitas companhias chinesas sofreram "graves prejuízos" decorrentes da queda de 14,5 % do euro contra o yuan neste ano. "Não temos o número exato, mas as perdas claramente não estão confinadas à exportação de maquinário e de produtos eletrônicos", disse Qi.

A Suntech, listada na Nasdaq, uma dos maiores fabricantes de painéis solares do mundo, disse que espera ter prejuízo de até US$ 25 milhões no primeiro trimestre do ano, sobre um faturamento líquido de US$ 590 milhões.

A União Europeia é o maior mercado de exportação da China, responsável por 19,7%, ou US$ 262 bilhões, das remessas totais no ano passado. As exportações da UE à China estão em US$ 128 bilhões.

Tom Albanese, executivo-chefe da Rio Tinto, o conglomerado do setor de mineração, disse que a "externalidade" da crise europeia era a maior rival ao crescimento da China e, por consequência, das vendas da Rio Tinto à China. Albanese disse temer uma reedição da crise no setor bancário, com a paralisação dos mercados de crédito exercendo um impacto sobre o crescimento chinês, como ocorreu no quarto trimestre de 2008.

A depreciação do euro frente ao yuan poderia levar a China a postergar a esperada valorização do yuan em relação ao dólar até mais adiante no ano, uma ideia amplamente compartilhada por analistas na Ásia, acrescentou.

Por toda a Ásia, grandes exportadores contaram uma história semelhante, de preocupação com o euro. O lucro líquido da Sony previsto para o período até março de 2011, por exemplo, presume uma taxa de câmbio de 125 ienes para o euro, mas a taxa de mercado já havia subido para pouco mais de 113 ienes. Essa taxa poderá custar ao conglomerado de eletrônicos 90 bilhões de ienes neste ano.

Mesmo a Hello Kitty, a mascote mais querida do Japão, está em dificuldades. Sanrio, empresa dona da personagem, reviu sua perspectiva pelo temor de que a economia europeia possa estar apática "devido à prolongada inquietação financeira na zona do euro".

Jerry Shen, executivo-chefe da fabricante de computadores Asustek, de Taiwan, anunciou na semana passada que a receita do terceiro trimestre poderia ser afetada pela queda do euro. "No momento, a moeda é um grande problema", afirmou Shen.

Analistas observam de perto o setor de terceirização de serviços de tecnologia da informação na Índia. O analista Subhashini Gurumurthy, da Ambit Capital, disse que a maioria das empresas ganha entre 15% e 27% de sua receita na Europa. Em dólares, a previsão é de que essas receitas sejam afetadas negativamente entre 1,3% e 2,4% no trimestre a encerrar-se em 30 de junho, em comparação ao primeiro trimestre.

Alguns fabricantes asiáticos estão mais protegidos, por possuírem instalações de produção na Europa. A LG, da Coreia do Sul, tem duas fábricas de televisores na Polônia. A Samsung Electronics possui uma fábrica de TVs na Hungria e uma de telas de cristal líquido na Eslováquia. A Hyundai Motor tem uma fábrica na República Tcheca.

Outras empresas sustentam não estar sendo influenciadas pelas oscilações cambiais. A United Microelectronics, de Taiwan, segunda maior fabricante mundial de circuitos integrados, informou ontem não ter detectado até agora nenhum impacto e mostrou-se otimista quanto à demanda no segundo semestre.

Alguns economistas na Ásia acreditam, porém, que os problemas na Europa provavelmente terão impacto relativamente limitado na região.

O Goldman Sachs, por exemplo, prevê recuperação na cotação do euro, de US$ 1,23 para US$ 1,35, nos próximos três meses, e um crescimento de 1,4% no Produto Interno Bruto (PIB) da região do euro em 2010. "O impacto direto [das turbulências no câmbio e mercado de bônus] será bastante modesto na Ásia", afirmou Michael Buchanan, que trabalha em Hong Kong e é economista-chefe para a Ásia do Goldman Sachs.

Para alguns dos executivos mais experimentados na Ásia, essa visão parece otimista demais. Nobuhiro Endo, presidente da NEC, a fabricante japonesa de produtos eletrônicos, afirmou que o grupo sofreu pouco com a crise europeia. Mas afirmou que o impacto potencial é enorme.

"Não podemos ver nada neste momento, mas se isso se disseminar para outros países e os mercados começarem a encolher, com risco de algo semelhante a uma deflação e com mercados encolhendo cada vez mais, isso seria assustador", disse. "Teria um impacto imenso."