Título: Para BC, compulsório maior não teve impacto no crédito
Autor: Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 25/05/2010, Finanças, p. C1

De Brasília

Em julho começam a retornar para os cofres do Banco Central pouco mais de R$ 30 bilhões em depósitos compulsórios, referente à última parcela da flexibilização feita pela autoridade monetária durante a crise de 2008. Esse foi o total de recursos usado pelos grandes bancos para comprar títulos e carteiras de crédito das instituições pequenas e médias, no auge da turbulência, como forma de escoar a liquidez, na época concentrada nos maiores. No início do ano, o BC renovou a permissão para essas operações interbancárias até 30 de junho, mas a expectativa agora é que a medida não seja renovada, já que a liquidez no mercado está praticamente normalizada. O próprio Banco Central, no último Relatório de Estabilidade Financeira, aponta que as instituições de menor porte apresentaram aumento do estoque de depósitos a prazo da ordem de R$ 15 bilhões no segundo semestre do ano passado e nova rodada de elevação foi identificada nos primeiros três meses deste ano. Houve, ainda, redução da dependência dos depósitos especiais, que contam com cobertura extra do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), conhecidos como DPGE. Outro ponto favorável é a volta das operações de compras de carteiras tradicionais sem recursos do compulsório. Os depósitos, no entanto, não devem retornar de forma imediata para o BC. Os encaixes devem se dar ao longo dos próximos meses, ou até anos, já que boa parte dessas compras foi feita com prazos entre um e três anos e os novos recolhimentos serão feitos à medida que as carteiras forem vencendo. Essa é uma das últimas etapas do cronograma de retirada dos estímulos dados durante o auge da crise financeira global. Desde o início do ano, o BC já recolheu R$ 70 bilhões, dos quase R$ 100 bilhões em compulsórios liberados entre outubro e dezembro de 2008. Uma alteração feita durante a crise não deve ser revogada. O BC criou um redutor para cálculo dos depósitos a prazo. Antes, as alíquotas eram aplicadas de forma linear, independentemente do porte da instituição. Hoje, os bancos com patrimônio de referencia (PR) abaixo de R$ 2 bilhões são liberados dos depósitos, enquanto os bancos com PR entre R$ 2 bilhões e R$ 5 bilhões têm um redutor de R$ 1,5 bilhão. Com isso, praticamente a totalidade dos recursos depositados no BC a título de compulsório pertence aos dez maiores bancos. Na visão do Banco Central, a liberação dos compulsórios foi um dos principais instrumentos usados para equalizar o acesso ao capital e restabelecer a dinâmica dos mercados na crise. O chamado "seguro prudencial" está praticamente recomposto, o que reforça o sistema em caso de novas crises financeiras daqui pra frente, acredita a autoridade. O total recolhido, que chegou a oscilar em torno de R$ 170 bilhões, voltou para R$ 275 bilhões, de acordo com o último dado disponível do BC. Com o fim da permissão para compra de carteiras, o montante deve superar os R$ 305 bilhões. A avaliação da autoridade monetária é que o impacto do recolhimento dos R$ 70 bilhões foi praticamente neutro sobre a oferta de crédito na economia e, portanto, sobre a demanda. Essa próxima parcela também não deve mexer muito com o mercado, avalia Renato Oliva, presidente da Associação Brasileira de Bancos, que representa os médios. Além de o retorno ser gradual, os recursos podem ser depositados em títulos, o que significa pequena queda de rentabilidade para as instituições. Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, no entanto, é difícil medir o efeito que a recomposição de compulsório teve até agora para a expansão da demanda. Ele acha, porém, que os bancos estão com menos recursos para emprestar e isso deve mexer com a oferta de crédito. "R$ 70 bilhões não é pouca coisa", afirma. Para ele, o BC ainda deve estar atento às condições da crise na Europa. Já houve um certo agravamento na liquidez mundial, diz, e uma eventual piora poderia fazer a autoridade manter a permissão para compra de carteiras. "Essa liberação diz respeito à cautela em relação ao sistema. Tem menos a ver com expansão de crédito e mais com risco entre os bancos." (FT)