Título: STF sinaliza voto a favor de esqueleto
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 10/06/2010, Brasil, p. A5

O Supremo Tribunal Federal (STF) sinalizou, ontem, uma clara tendência favorável ao pagamento de R$ 10 bilhões pelo governo em quintos e décimos para servidores públicos comissionados dos três poderes. Sob a alegação de que a União entrou com a ação errada para impedir o pagamento - um mandado de segurança contra decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) -, o relator da causa, Eros Grau, foi contrário ao pedido do governo.

O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. Mas, além de Grau, outros quatro ministros afirmaram, durante debate no tribunal, que não haveria como aceitar a ação proposta pela Advocacia-Geral da União (AGU) para barrar o pagamento dos quintos.

Como são 11 ministros no total, os servidores já teriam pelo menos cinco votos. Estão a um voto de garantir a maioria absoluta e, a se confirmar essa tendência, o governo vai ter de pagar a conta. Será uma herança para o próximo presidente, a ser eleito em outubro. O STF está julgando mandado de segurança da AGU contra decisão do TCU que, em 2005, reconheceu a necessidade de pagar quintos aos servidores. Os quintos foram instituídos pelo governo Collor, em 1990, pela Lei nº 8.112, e equivalem a um quinto do salário a cada 12 meses de trabalho por servidores em cargos comissionados. O benefício foi mantido durante o governo Itamar Franco. O governo Fernando Henrique Cardoso tentou extingui-lo por medidas provisórias. Mas uma sucessão de MPs editadas entre 1995 e 2001 acabou criando dúvidas jurídicas a respeito da validade do benefício, que ora era extinto, ora recolocado em prática. Com isso, ele é requerido até hoje por servidores.

Durante o julgamento de ontem, Gilmar Mendes alertou que a questão é bastante séria e envolve despesa de R$ 10 bilhões a ser paga pelo governo a servidores do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. O ministro criticou o fato de o TCU ter mudado a sua posição inicial. Em 2003, o Tribunal de Contas foi contrário ao pagamento, mas, dois anos depois, foi favorável.

"Não é todo o dia que o TCU muda o seu entendimento pressionado pelos seus servidores", disse Mendes. "Uma MP disse claramente que os quintos estavam extintos e, depois, voltam a valer. Estamos a falar de uma conta de R$ 10 bilhões. É uma conta incorporada que se paga a cada mês", continuou. "Eu nem por R$ 20 bilhões cederia diante da imposição da Constituição e das normas", respondeu o relator do processo, ministro Eros Grau. "Esse argumento não me incomoda, ministro."

Para Grau, a União não poderia ter impetrado mandado de segurança contra decisão do TCU, mas outra ação. "A União, se tivesse interesse efetivo, teria outros instrumentos processuais para ativar", disse. "Eu não vou ensinar " Pai Nosso " ao vigário, mas esse não é o caminho", completou Grau.

Outros ministros concordaram com o relator. "Eu não me lembro dessa Corte ter julgado mandado de segurança da União contra decisão do TCU", afirmou Marco Aurélio Mello. "Decisão meramente interpretativa não pode ser atacada por mandado de segurança", completou Carlos Ayres Britto.

O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, argumentou que a decisão do TCU valeria apenas para os seus servidores e, se o governo entender que não deve, não precisaria pagar. "O TCU, a meu ver, não impôs coisa alguma para a administração", enfatizou Peluso. A ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha manifestou concordância com Peluso.

Mendes pediu aos ministros que pensem nas consequências práticas do julgamento. "O efeito prático é que todas essas instituições passam a pagar e não vamos nos iludir: a União não terá meios de impugnar", insistiu o ministro.

Como ele pediu vista, os demais, apesar dos comentários contrários ao pedido da AGU, vão aguardar para formalizar os seus votos. Apenas Grau proferiu voto formal até aqui e ele, que vai se aposentar em agosto, ainda deixou um alerta para Mendes. "Eu não estarei mais aqui, mas espero que Vossa Excelência seja voto vencido", disse Grau. Não há prazo para Mendes retomar o julgamento.