Título: Governo vai definir que áreas serão repassadas à Petrobras
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Fonte: Valor Econômico, 28/06/2010, Brasil, p. A4

O ministro de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, acha exageradas as dúvidas do mercado financeiro com relação aos investimentos projetados pela Petrobras no seu plano estratégico e o aumento da participação relativa do refino nos investimentos totais previstos para 2010-2014, antes mesmo de se aumentar a produção. Em entrevista ao Valor, Zimmermann disse que os planos da Petrobras sempre foram considerados muito grandes e que as descobertas no pré-sal fazem com que seja importante para o Brasil que eles aconteçam. "Todo o plano é compatibilizado e não tem absurdos primários como esse, de aumentar o refino e não ter o que refinar. Está tudo sincronizado."

Ele não vê nenhum problema no fato de a capitalização da Petrobras, marcada para setembro, ocorrer no meio da campanha eleitoral. "A capitalização segue independentemente da eleição."

Zimmermann explicou que ainda não há decisão no governo sobre as áreas que serão transferidas para a Petrobras no processo de cessão onerosa, negando informação de que seriam cedidas áreas unitizáveis perto dos campos de Tupi, Guará e Iara, além do reservatório Franco, encontrado em área da União. E deixou claro que a decisão será do governo. "A Petrobras tem a proposta dela, o governo tem outra". A seguir, os principais pontos da entrevista.

Valor: Em relação à capitalização da Petrobras, que agora ficou para setembro, a dúvida é se ninguém tinha lido antes o artigo 3 que faz essa exigência. O que houve?

Márcio Zimmermann: Não é isso. A Agência Nacional do Petróleo vem há tempo fazendo o processo de contratação da certificadora. Ela lançou o edital, a licitação acabou dando vazia e eles acabaram fazendo uma contratação direta, baseados em um parecer jurídico. E com uma grande certificadora mundial, com quem negociaram para que ela termine até agosto.

Valor: Por que não foi feito antes? Se a Petrobras quer fazer a operação em julho, por que ANP não começou há quatro meses?

Zimmermann: A Petrobras decidiu isso no mês passado, fazer o processo em julho. Mas a legislação é bem clara, a ANP tem que fazer o levantamento.

Valor: Então não havia como fazer a capitalização em julho, como se falava na semana passada?

Zimmermann: Não. A Petrobras havia tomado uma decisão na reunião de maio do Conselho. Mas agora é só ajuste de datas.

Valor: Mas no meio da campanha? Se o laudo da ANP ficar pronto dia 22 de agosto, com os 60 dias vamos estar no meio da eleição.

Zimmermann: É um assunto importante. A capitalização segue independentemente da eleição. Tem um processo correndo. O Banco do Brasil vai lançar uma capitalização agora e a Petrobras tem a expectativa de que seja em setembro.

Valor: E o Plano B de que se está falando?

Zimmermann: Isso eu não conheço. É do Ministério da Fazenda, não do de Minas e Energia. A Fazenda é que deve ter.

Valor: Vocês não conhecem?

Zimmermann: Não. Eu não vou discutir Plano B.

Valor: O plano estratégico da Petrobras está parecendo muito robusto, muito inaplicável e mexe com a estrutura financeira dela negativamente. Isso não preocupa?

Zimmermann: Há três anos, quando analisavam o plano da Petrobras, achavam muito grande também. Com o pré-sal, você tem volumes grandes de investimento, o que é importante para o Brasil que aconteça.

Valor: Mas por que fazer refino primeiro antes de explorar essas reservas? Aumentou a participação relativa do refino dentro dos investimentos totais, mais que a exploração e produção.

Zimmermann: Tudo tem um cronograma ajustado e nisso a Petrobras tem expertise muito grande. Está tudo sincronizado. Não tem nada entrando antes do que tem que entrar. Todo o plano é compatibilizado e não tem absurdos primários como esse, de aumentar o refino e não ter o que refinar. Está tudo sincronizado.

Valor: Não seria possível, por exemplo, esperar cinco anos, fazer caixa e depois aumentar a capacidade de refino?

Zimmermann: As decisões que ela tem que tomar demandam tempo. Você não implanta estalando o dedo. E não se esqueça que tem muito tempo que o Brasil não implantava refinarias. Trinta anos.

Valor: Quem negocia com a Petrobras os contratos de cessão de área? A Petrobras vai ganhar áreas unitizáveis junto de Tupi, Guará e Iara, além do reservatório que a ANP chamou de Franco? Aí se misturariam contratos de concessão e cessão onerosa na mesma área...

Zimmermann: Isso, no fundo, é uma estratégia de governo. Você sabe como vai ser feita a capitalização. Vai ter que dar áreas para garantir os 5 bilhões de barris de petróleo. Vamos analisar, ver o total do que seria equivalente a 5 bilhões para a Petrobras. Mas essa estratégia ainda não está definida, com relação a quais poços, quais blocos. Isso vai ser dado para a certificadora da ANP avaliar.

Valor: Mas se já descobriram Franco e Libra, que segundo a ANP podem ter mais de 10 bilhões de barris, porque ceder outros?

Zimmermann: São duas alternativas. Existem várias.

Valor: Quais?

Zimmermann: O que acho importante, até para evitar confusão, é que está se estudando uma quantidade de blocos, de reservatórios potenciais que vão ser avaliados ainda e precificados.

Valor: A Petrobras não fez isso?

Zimmermann: Isso é estratégia de governo, não da Petrobras. A Petrobras tem a proposta dela, o governo tem outra.

Valor: Qual a diferença?

Zimmermann: Não sei, não vi ainda. Eu não tenho a nossa.

Valor: Quem do governo?

Zimmermann: O Ministério de Minas e Energia. Mas eu não sentei com o secretário de petróleo e gás, não levei o assunto ainda para discutir com a Casa Civil e nem com o próprio presidente.

Valor: Existem cobranças sobre a ANP de que que ela estaria sendo lerda, atrapalhando a capitalização e que já deveria ter feito a contratação antes. Qual é o papel da agência dentro desse processo todo?

Zimmermann: Não tenho ouvido falar mal dela e acho que não vai atrapalhar nada. Ela tem o seu papel, tem autonomia, ficou responsável de contratar essa empresa e está assinando o contrato agora. O próprio fato da licitação que ela fez ter dado vazia, por outro lado não atrapalhou os prazos. Ela assinou agora, como assinaria. Ela foi ágil nesse sentido.

Valor: O diretor-geral da ANP já disse que deve propor que uma dos reservatórios encontrados - Franco ou Libra - seja oferecido para partilha de produção. Pode ser?

Zimmermann: Quando me apresentarem o trabalho, vou discutir. Mas há muita especulação.

Valor: São dois reservatórios, se um vai ser cedido à Petrobras, o que se fará com o outro?

Zimmermann: Podemos levar para uma rodada de partilha. Esses poços do pré-sal têm blocos que podemos levar a leilão. A única coisa que eu tenho é que separar agora uma parte porque ali envolve o processo da União colocar recursos na Petrobras. Se vai ser esse ou aquele não dá para dizer ainda.

Valor: O governo já está sendo procurado pelas empresas?

Zimmermann: Há uma expectativa das empresas sobre quando será a rodada. Vamos ter a 11ª Rodada, que é regime de concessão, e vamos ter uma decisão logo para ver se fazemos este ano. Precisamos tomar a decisão até agosto para leiloar em novembro. Nós estávamos mais preocupados com a aprovação de todo o marco regulatório do pré-sal.

Valor: Vai ter concessão no mar ou ele está fechado para sempre, como temem algumas empresas?

Zimmermann: Vamos ter concessão em áreas do mar tipo foz do Amazonas, que pega o Pará e Maranhão, que são novas fronteiras. Você lembra que levamos o ano passado e aí retiramos, porque deu um pequeno problema ambiental lá na bacia do Solimões.