Título: G-20 adota em Toronto uma posição menos fiscalista
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 28/06/2010, Internacional, p. A11

Os Estados Unidos, o Brasil e outros emergentes não conseguiram convencer as grandes economias europeias, em especial a Alemanha, a manterem suas políticas fiscais expansionistas para sustentar a retomada do crescimento mundial, em encontro do G-20 realizado nos últimos dois dias em Toronto.

Mas, na declaração final da reunião, há uma clara mudança de tom em relação aos documentos anteriores, com mais ênfase no crescimento, e não no ajuste fiscal. É algo bem diferente da posição "fiscalista" da reunião de ministros da Fazenda do G-20 no começo do mês em Busan, na Coreia do Sul.

No comunicado final do G-20, ficou definido que os países devem cortar seus déficits pela metade até 2013 e procurar quedas nas suas dívidas públicas a partir de 2016. Nada impede, porém, que Alemanha e Reino Unido sigam com as suas respectivas estratégias de apertar já as suas política fiscais.

"É claro que ninguém pode obrigar um país individualmente, como a Alemanha, a mudar sua política econômica", afirma uma fonte da delegação brasileira. "Mas a mudança de tom está lá no documento e é resultado de mais de 30 horas de trabalho." No texto final do encontro, está definido que eventuais apertos fiscais devem ser "favoráveis ao crescimento econômico".

Formalmente, o centro das discussões macroeconômicas do G-20 foi a política fiscal. Mas, na essência, o que estava em jogo era o quanto a nossa taxa de câmbio vai se valorizar em razão das decisões de política econômica tomadas por países da Europa.

O interesse brasileiro e americano é que a Alemanha não corte agora os seus déficits públicos, como já estão fazendo. Do ponto de vista prático, o aperto fiscal no velho continente significa menos consumo nessas economias, mais excedentes para exportar para países como Brasil e menos demanda por, por exemplo, produtos brasileiros. "O nosso recado foi dado", disse o ministro da Fazenda brasileiro, Guido Mantega.

O aperto fiscal, para a Alemanha, é uma forma de reconquistar a confiança dos mercados e eliminar eventuais riscos inflacionários. A tese alemã é que o aperto fiscal reforça a confiança dos consumidores. Os alemães são particularmente preocupados com a inflação, por causa da experiência hiperinflacionária que levou Hitler ao poder nos anos 30.

No sábado, pouco antes da abertura do G-20, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deixou claro o desconforto brasileiro com o aperto fiscal europeu. "Não é desejável que carreguemos nas costas os países avançados", disse Mantega, que representou o presidente Lula no G-20. "Se, em vez de estimularem o crescimento, esses países derem atenção especial para o ajuste fiscal, eles estarão fazendo o ajuste às nossas custas."

O comunicado do G-20 não mencionou, por outro lado, a valorização da taxa de câmbio chinesa, outro ponto de interesse do Brasil. Em um esboço do comunicado divulgado no sábado, chegou a ser incluída uma menção elogiosa ao recente movimento da China, que indicou há pouco mais de uma semana que vai valorizar sua moeda, o yuan. Mas, por pressão dos chineses, que consideram esse apenas um tema de interesse interno, o trecho acabou suprimido.

"Deve-se perguntar aos chineses porque eles não quiseram essa menção", disse Mantega.

O Brasil, hoje, tem uma posição um pouco mais clara na defesa da valorização do yuan.

Para evitar atritos com a China, com quem o Brasil compartilha alguns interesses comuns, como o aumento do poder aos países emergentes nos organismos multilaterais, o ministro Guido Mantega disse na reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI) no começo de abril que não via problema com a moeda chinesa, mas sim com a americana.