Título: Abert defende limite a estrangeiro na rede
Autor: Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 08/07/2010, Política, p. A6

de Brasília

A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) defendeu ontem, em audiência pública na Câmara dos Deputados, entendimento da Advocacia Geral da União (AGU), que afirma que a limitação da participação em 30% para o capital estrangeiro em empresas jornalísticas vale também para a internet. De acordo com o parecer nº 479, elaborado pela consultoria jurídica junto ao Ministério das Comunicações, "a norma constitucional não limitou seu alcance a determinada categoria das empresas jornalísticas e de radiodifusão - seja para as empresas físicas propriamente, seja para as virtuais, isto é, aquelas que desempenham sua função por intermédio, por exemplo, da internet".

O documento, aprovado em maio de 2010, foi elaborado em resposta à consulta da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara, feita em novembro do ano passado, sobre a aplicação das restrições do artigo 222 da Constituição Federal, e da Lei 10.610 de 2002, também aos sites e portais da internet. O artigo diz que pelo menos 70% do capital de empresas jornalísticas deve pertencer a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos.

O parecer concluiu que não compete ao Ministério das Comunicações fiscalizar esse segmento específico, estando limitado às empresas de radiodifusão, mas fez questão de ressaltar que, mesmo fora do escopo, "ratifica-se a tese" de que o artigo 222 "aplica-se às empresas jornalísticas que desempenham seu mister por intermédio dos portais e sites da internet".

Para o advogado Gustavo Binenbojn, consultor da Abert, o documento completa o entendimento de que sites e portais também estão sujeitos à limitação de capital estrangeiro. "Isso decorre da literalidade da Constituição, da interpretação sistemática do texto da Constituição e sobretudo do sentido finalístico do texto, que é de um ambiente aberto, amplamente democrático, que não se preocupe com o controle do que as pessoas dizem, mas também não permita que no Brasil o que nos vamos saber, ver e ouvir seja editado por interesses alheios a nossa realidade", afirmou em audiência pública sobre o tema, ontem, em Brasília.

No entendimento da Abert caberia agora ao presidente da República, por meio de decreto, determinar quem seria o responsável por fiscalizar a aplicação da lei no caso da internet.

Édio Henrique de Almeida José e Azevedo, consultor jurídico do Ministério das Comunicações, ressaltou que a discussão apresentada na Câmara está apenas no começo e que "a sociedade ainda vai debater quais os contornos serão delineados com relação aos novos meios de comunicação social". Ele afirmou, no entanto, que o artigo 222 da Constituição "trata de empresas jornalísticas e empresas de radiodifusão e não faz qualquer limitação a meio. Agora, a interpretação deve ser feita em um caso concreto", completou em entrevista ao fim do evento.

A audiência pública foi proposta pelo deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO). Os debates giraram em torno de duas representações feitas na Procuradoria-Geral da República, uma da Abert e da Associação Nacional de Jornais (ANJ) contra o portal de notícias Terra, que pertence ao grupo espanhol Telefónica, e outra da ANJ contra o jornal "Brasil Econômico". Ambas pedem que o Ministério Público emita um parecer em relação à atuação de empresas estrangeiras no Brasil.

Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, advogado que representou a Terra Networks Brasil, afirmou que uma coibição irá limitar o número de empresas no mercado. "Não consigo ver como a informação, a cultura nacional e a identidade nacional podem ser privilegiadas restringindo os canais de difusão. Se coibir ou limitar a participação de capital estrangeiro, haverá um número menor de veículos do que se tem hoje. O Terra sai do mercado, porque inegavelmente tem capital estrangeiro."

O advogado do "Brasil Econômico", Celso Cintra Mori, afirmou que o periódico não é controlado por estrangeiros, mas sim pela brasileira nata Maria Alexandra Mascarenhas Vasconcelos, apesar de ela residir em Portugal. Segundo ele, o pai da executiva é português, mas naturalizado há mais de dez anos no Brasil.

A ANJ, entretanto, entende que essa é apenas uma forma de "burla à Constituição", disse Ricardo Pedreira, diretor-executivo da associação, e que na verdade o controle é do grupo português Ongoing. Segundo ele, a ANJ recusou a filiação do "Brasil Econômico" e vai deliberar sobre o jornal "O Dia", comprado pela mesma empresa. "Diante da mudança do controle acionário, pelo mesmo grupo português, que no nosso entendimento é o dono de fato do jornal "Brasil Econômico", a ANJ vai ter, à luz do seu estatuto, de deliberar em relação a esse filiado já de tanto tempo."