Título: Reforma marca divisão no Novo Mercado
Autor: Valenti, Graziella
Fonte: Valor Econômico, 08/07/2010, Eu e investimentos, p. D4

Foi preciso um ano e oito meses para que a BM&FBovespa alcançasse a proposta final para a mais profunda reforma do Novo Mercado e dos níveis de governança 1 e 2, criados há quase dez anos. Contudo, o resultado final sugerido difere substancialmente da proposta original e resultará numa divisão do principal segmento do mercado brasileiro.

As companhias votarão até 6 de agosto e o posicionamento de cada uma delas será público.

O motivo da demora da proposta, além da complexidade do tema, foi a necessidade de harmonizar as intenções da bolsa com o interesse das companhias. Foi durante as discussões, que envolveram 16 encontros, que a ideia original teve de se adaptar às necessidades das 105 empresas já listadas no Novo Mercado. Todo esse esforço ocorreu porque as sugestões não podem sofrer um terço de rejeição.

A BM&FBovespa propõe, conforme adiantou o Valor, que o Novo Mercado adote a obrigação que chamou de "oferta pública de aquisição de ações (OPA) por atingimento de participação relevante", que dispara quando um investidor alcança 30% do capital de uma empresa.

Quando o processo de revisão teve início, em outubro de 2008, com a formação da Câmara Consultiva para Revisão do Novo Mercado, a meta era que essa regra fosse adotada por todas as companhias que não possuem um controlador definido, ou seja, aquelas de capital "pulverizado".

Assim, a norma resolveria mais do que a carência da Lei das Sociedades por Ações, que só obriga oferta aos minoritários de ações ordinárias em caso de venda do controle e não abarca situações de formação de controle quando a empresa é dispersa na bolsa. A nova regra também padronizaria os estatutos das empresas que com a onda das aberturas de capital adotaram diversas modalidades das chamadas "pílulas de veneno".

Esses mecanismos foram livremente adotados pelas empresas com redações complexas, com limites de compra de participação baixos (a maioria entre 15% e 20%) e com grandes prêmios pré-definidos para as ofertas.

No entanto, a BM&FBovespa cedeu e, no fim das contas, quem já tem a pílula de veneno poderá ficar com ela. Só adotarão a nova norma dos 30% as empresas que não têm controlador nem pílula de veneno, além daquelas que entrarem no mercado após a aprovação da reforma. "Preservamos a história do Novo Mercado", disse Edemir Pinto, presidente da bolsa.

No fim de 2009, o BTG Pactual fez um estudo apontando que das então 104 empresas do Novo Mercado 51 tinham pílula de veneno. O mercado brasileiro tem cerca de 40 companhias em que os maiores acionistas não chegam a 51% do capital.

Da forma como foi proposto, o Novo Mercado terá três tipos de direito aos minoritários: o presente nas companhias com dono majoritário (oferta de 100% em caso de venda do controle); o das companhias com pílulas de veneno (o direito varia de acordo com o estatuto de cada empresa); e o daquelas companhias com obrigação da OPA de 30%.

Armínio Fraga, presidente do conselho de administração da BM&FBovespa, acredita que ainda assim a reforma significará "um grande avanço". Na opinião do executivo, essa revisão ajudará a preservar a posição de liderança global do país na sua capacidade de atrair capital.

Contudo, uma das grandes vantagens propagadas a respeito do Novo Mercado era exatamente a padronização dos direitos, o que deixará de existir.

A decisão final caberá a 105 empresas, segundo o presidente da bolsa, já que a BM&FBovespa não votará, por estar numa posição de conflito de interesses com o processo.

Gilberto Mifano, presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), acredita que a reforma sugerida "é a melhor possível neste momento".

A resistência encontrada pela bolsa foi nas companhias com pílula de veneno. Os percentuais adotados por essas empresas como gatilho para as ofertas está fortemente relacionado à participação que o principal acionista, muitas vezes o fundador, possui no negócio. Assim, elevar esse percentual (já que a maioria oscila entre 15% e 25%) permitiria a formação de grupo concorrente.

Para Mifano, com o tempo, as companhias poderão migrar para a proposta da bolsa, se quiserem. Fraga também é otimista. Ele acredita que esse "é o grande modelo" que vigorará daqui para frente, em referência à oferta dos 30%.

Para o Nível 2, a principal modificação que irá à votação é o aumento da oferta às ordinárias e preferenciais de 80% para 100%, no caso de venda do controle.