Título: O investimento público cresce pouco, apesar do PAC
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 05/07/2010, Opinião, p. A10

Uma análise acurada da evolução dos gastos públicos nos dois mandatos do governo Luiz Inácio Lula da Silva mostra que os investimentos, mesmo com o lançamento do badalado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), pouco avançaram. Na verdade, como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), os investimentos voltaram praticamente ao nível do último ano da gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em 2002, o governo anterior aplicou nessa rubrica o equivalente a 0,8% do PIB. No ano seguinte, primeiro da administração Lula, a despesa caiu drasticamente - para 0,3% do PIB, o nível mais baixo da história - e só começou a se recuperar quatro anos depois.

Naquele momento, a contração tinha uma justificativa plausível: o país saiu da crise de 2002 com uma situação fiscal delicada, o que levou o novo governo a adotar medidas de austeridade.

No ano passado, o atual governo gastou 1% do PIB em obras de infraestrutura e em outros investimentos, o seu melhor resultado até agora. Comparado ao derradeiro ano da gestão anterior, o avanço foi, no entanto, de apenas 0,2% do PIB (cerca de R$ 6,5 bilhões).

Com o lançamento do PAC, em 2007, o governo Lula, de fato, recolocou o tema do investimento na agenda, mas o comportamento dos outros itens da despesa nos anos recentes revela que, na prática, as prioridades de gasto foram outras.

Quando assumiu o governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encontrou uma folha de pessoal (incluídos os encargos sociais) que custava anualmente 4,8% do PIB ao erário. Nos primeiros anos de sua gestão, essa despesa cresceu fortemente em termos nominais, mas diminuiu como proporção do PIB. No segundo mandato, ela cresceu, inclusive pelo segundo critério, retornando, em 2009, aos 4,8% do PIB registrados em 2002.

É bom lembrar que, desde o fim de 2006, e com a única exceção de 2009, ano em que a economia teve crescimento negativo de 0,2% por causa da crise financeira internacional, o PIB brasileiro vem crescendo de forma acelerada, a taxas superiores a 4,5% ao ano. O produto maior reduziu, em termos relativos, a dimensão dos gastos com o funcionalismo público.

O que se deve observar nesse caso, porém, é que o governo perdeu uma oportunidade extraordinária de conter essa despesa e aumentar outras, mais importantes e urgentes, como os investimentos em infraestrutura.

De 2002 a 2009, o governo elevou de 6,4% para 9% do PIB as chamadas transferências de renda. Estão nessa categoria os benefícios previdenciários, o seguro-desemprego, o abono salarial, os benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) e o Bolsa Família, entre outros programas sociaisa governamentais.

Com algumas ressalvas (como a concessão de aumentos reais para aposentados que ganham mais de um salário mínimo por mês), esse movimento foi, sem dúvida, meritório. Ajudou a tirar milhões de pessoas da indigência e a diminuir as desigualdades sociais e a pobreza existentes em todas as regiões do país.

O problema é que a maioria dos itens que compõem as transferências de renda é de caráter permanente, isto é, não pode ser reduzida de forma discricionária pelo governo.

Enquadram-se nessa categoria também as despesas com pessoal. Nos últimos oito anos, os gastos primários da União - que não incluem o pagamento dos juros da dívida pública - saltaram de 15,7% para 18,2% do PIB, uma evolução de 2,5 pontos percentuais. As transferências de renda, por sua vez, aumentaram, no período, mais do que isso - 2,6% do PIB.

Os números mostram, dessa forma, que, dado o fato de que a carga tributária brasileira já está no limite do tolerável pela sociedade, o espaço para aumento dos gastos públicos é limitado ou muito próximo de zero.

Uma das consequências óbvias dessa realidade é que o terreno para elevar os investimentos em infraestrutura é praticamente inexistente. Diante de despesas incomprimíveis, resta aos administradores cortar o que é discricionário, como os investimentos e outras despesas correntes.