Título: Campanha com todas as regalias
Autor: Jeronimo, Josie
Fonte: Correio Braziliense, 09/07/2010, Política, p. 2

Com a votação da LDO, deputados e senadores ganham, na prática, licença para abandonar as atividades parlamentares e entrar na briga por votos. Salários e benefícios nos próximos três meses, contudo, continuam intactos

André Dusek/AE Parlamentares fizeram o que chamaram de esforço concentrado para votar projetos pendentes e a Lei de Diretrizes Orçamentárias O Congresso cumpriu ontem a última tarefa que ainda prendia os parlamentares em Brasília. Ao aprovar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), deputados e senadores ganharam a sonhada carta de alforria para se ausentar da capital do país em busca de votos em seus estados com a anuência das Casas. O recesso começa oficialmente no dia 17, mas, com a aprovação da LDO, os parlamentares ganharam uma semana a mais de férias do Legislativo. De 17 de julho a 5 de outubro, primeira terça-feira depois das eleições, os parlamentares devem comparecer a quatro sessões, o equivalente a R$ 12.300 por dia trabalhado, levando em consideração o montante do salário de três meses, que receberão integralmente, apesar das faltas. Benefícios como passagens aéreas e ressarcimento de gasolina também serão pagos como se os parlamentares estivessem trabalhando normalmente.

Para cair de vez na campanha, oposição e governo trabalharam em sintonia e sem demora construíram acordo para desengavetar uma série de projetos e realizar um mutirão de votações na Câmara e no Senado. O esforço concentrado da quarta-feira desencalhou grande parte do trabalho acumulado durante a Copa do Mundo, quando as Casas funcionaram com quorum mínimo de 11 a 30 de junho. Levantamento realizado pelo Correio aponta que 1.734 faltas foram registradas nas oito sessões deliberativas realizadas na Câmara durante o torneio, principalmente quando a Seleção Brasileira ainda estava nos gramados.

Quase metade dos deputados desapareceram durante a Copa. A média de comparecimento foi de 284 parlamentares, o equivalente a 55% do total. Treze nem deram as caras no plenário no período do campeonato. No Senado, a operação sumiço foi semelhante. A média de presença nas cinco sessões deliberativas abertas na Copa foi de 48 senadores. Em uma das reuniões, José Sarney (PMDB-AP) presidiu o plenário com 34 dos 81 senadores presentes.

Na prática, o recesso eleitoral dos parlamentares teve início em junho. A saída encontrada por deputados e senadores para disfarçar o abandono das Casas é o mutirão de votações, com o chamado esforço concentrado. O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), é direto ao prever o sumiço dos parlamentares nos próximos meses. Não vou vir aqui para fazer discurso, vou pedir votos, afirmou Virgílio. O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), também admite o esvaziamento. Voltaremos à pauta normal depois das eleições, comenta o líder do governo.

Alguns parlamentares já se precaveram para passar pelo menos quatro meses longe do Senado. Os senadores José Agripino (DEM-RN), Raimundo Colombo (DEM-SC), Garibaldi Alves (PMDB-RN) e a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) requisitaram licença, mas usaram o artifício de apresentar atestado médico para o Senado conceder afastamento de 121 dias sem a necessidade de convocar um suplente para assumir a vaga.

Não vou vir aqui para fazer discurso, vou pedir votos

Arthur Virgílio (AM), líder do PSDB no Senado

O número

R$ 12,3 mil

Quantia que os parlamentares receberão em cada um dos quatro dias que devem trabalhar de 17 de julho a 5 de outubro

Presença

Atuação dos parlamentares durante a Copa do Mundo 1.734 faltas durante o torneio Média de 55% de deputados na Câmara No Senado, o comparecimento ficou em 59%

Benefícios durante as férias Os deputados receberão em salário, durante o recesso e o período eleitoral, R$ 49.200

A cota parlamentar de aproximadamente R$ 30 mil para passagens, hospedagem e gasolina será paga normalmente

Deputados que não apareceram durante a Copa Albano Franco (PSDB-SE) Carlos Sampaio (PSDB-SP) Gerson Peres (PP-PA) Jader Barbalho (PMDB-PA) José Aníbal (PSDB-SP) José Fernando Aparecido (PV-MG) Marco Antônio (PRB-PE) Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS) Severiano Alves (PMDB-BA) Ratinho Júnior (PSC-PR) Pedro Eugênio (PT-PE) Paulo Roberto Pereira (PTB-RS) Olavo Calheiros (PMDB-AL)

Licitações flexíveis

O governo conseguiu incluir no texto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) um dispositivo que afrouxa regras de licitação e desapropriação de imóveis para obras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. O documento aprovado ontem pelo Congresso prevê o início de obras sem licença ambiental formal. Com a medida, uma simples autorização de órgãos de fiscalização, mesmo sem a análise do projeto, pode liberar uma grande obra. Atualmente, para iniciar qualquer empreendimento que possa agredir o meio ambiente, o responsável tem que passar por três fases de licenciamento: o prévio, o de instalação, que analisa o projeto, e o de operação, que dimensiona os impactos na natureza. Contratos emergenciais também foram autorizados pelos parlamentares.

A intenção do governo de retirar do Congresso parte do poder de analisar a paralisação de obras irregulares foi derrotada. Os parlamentares rejeitaram parte do trecho do relator Tião Viana (PT-AC) que criava regras para a atuação das Casas na análise de obras com problemas. Os parlamentares mantiveram o texto aprovado na Comissão de Orçamento que indica uma possibilidade de aumento real para o salário mínimo. A LDO também prevê aplicação do mesmo índice de reajuste do mínimo aos aposentados. O mesmo princípio de ganho real do salário mínimo será aplicado aos aposentados vinculados ao regime geral de previdência, afirmou Tião Viana. No projeto do orçamento, que o governo tem que mandar ao Congresso até 31 de agosto, o Executivo terá que prever margem que garanta o aumento real dos vencimentos a partir de 1º de janeiro. A intenção do governo era situar o salário em R$ 535, mas o relator da LDO apresentou proposta de R$ 550. As centrais sindicais pressionam para que o novo mínimo seja de R$ 570. A decisão final caberá ao novo presidente da República. (JJ)