Título: BC agora avalia se já é hora de encerrar ciclo de elevação da Selic
Autor: Safatle , Claudia
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2010, Finanças, p. C2

Quando parar. Esse é, agora, o cerne da discussão sobre os rumos da taxa básica de juros (Selic), depois que o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, na reunião de quarta-feira, atenuar o processo de aperto monetário. Após duas elevações de 0,75 ponto percentual , o comitê optou por mais 0,50 ponto percentual, elevando a Selic para 10,75% ao ano. A grande preocupação do governo, nesse momento, é em relação ao tamanho da desaceleração da economia.

Ninguém deseja que a combinação da retirada dos estímulos ao crescimento e do aumento dos juros derrube demais o Produto Interno Bruto (PIB) daqui para o fim do ano, atrapalhando a consagração dos oito anos do governo Lula e prejudicando o início de uma nova administração federal. Muito menos a direção do Banco Central, cuja função é manter a inflação na meta com a menor perda possível de produto, quer coroar a era Henrique Meirelles com uma overdose de juros capaz de minar o crescimento futuro. O projeto é encerrar o exercício com um crescimento do produto, na margem, ao redor dos 5% a 6%.

Nos 45 dias que separaram as duas últimas reuniões do Copom, muita coisa aconteceu. "Foram mudanças dramáticas", disse uma fonte qualificada do governo, ao explicar por que era natural esperar do BC uma postura mais cautelosa e aparentemente incoerente se confrontada com a ata da penúltima reunião. Internamente, os índices de preços começaram a murchar. O IPCA ficou em zero em junho e a prévia do IPCA-15 para julho indica deflação.

Não se trata de uma redução pontual, pois os núcleos de inflação também estão recuando, o que indica ser essa uma desinflação consistente. Os preços dos serviços, fonte de preocupação dos analistas, também já dão sinais de enfraquecimento.

A economia doméstica se mostra, hoje, afastada do vigoroso crescimento do primeiro trimestre, quando o PIB apresentou aumento de 2,7% em relação ao quarto trimestre do ano passado e de 9% na comparação com o primeiro trimestre de 2009.

A economia mundial também padece. A exposição do presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, esta semana, em depoimentos no Congresso americano, foi um elemento importante para consolidar a decisão do Copom. Bernanke chegou a admitir que talvez seja necessário mais medidas de estímulo ao crescimento e considerou o cenário "incomumente incerto".

Economistas do governo brasileiro ressaltam, ainda, as transformações ocorridas no pós crise de 2008 sobre os canais de transmissão das políticas internacionais sobre a economia local e das ações de política monetária do Banco Central do Brasil sobre o setor real.

Os efeitos da elevação dos juros domésticos estão mais eficientes, tornando a política monetária mais eficiente no combate à inflação. No exterior, esses canais, segundo os especialistas, também estão mais intensos. O que no primeiro trimestre parecia uma recuperação sólida da economia mundial, hoje se mostra frágil. As empresas globais, que antecipavam compras e formavam estoques nos primeiros meses do ano, nesse momento adiam novas encomendas. Os impactos dessas mudanças ocorridas nos últimos 45 dias sobre a inflação no país não são desprezíveis, assinalam as fontes do governo.

A desaceleração da economia brasileira nos últimos três meses se deve, por enquanto, só à retirada dos estímulos fiscais e monetários concedidos depois do "crash" de 2008. Segundo a avaliação oficial, o aumento dos juros que começou em abril ainda não exerceu qualquer influência sobre o nível de atividade, o que só deverá aparecer a partir de novembro. Há, assim, fortes razões para se discutir quando parar e mesmo se já não é hora de parar.