Título: Bens duráveis ajudam a segurar inflação
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 28/07/2010, Brasil, p. A5

Os preços de vários bens de consumo duráveis mostram-se bastante comportados nos últimos meses, em alguns casos registrando quedas expressivas no acumulado do ano. As cotações de televisores, por exemplo, caíram 8,94% de janeiro a julho. Até mesmo os veículos novos registram deflação de 0,26% no período, mesmo com o fim da vigência do Imposto de Produtos Industrializados (IPI) reduzido em março. O tombo é especialmente forte em produtos eletrônicos - além de televisores, aparelhos de som e de DVD, microcomputadores e máquina fotográfica têm quedas consideráveis no acumulado do ano.

Câmbio valorizado, redução dos preços de importação e estoques excessivos - no caso de automóveis - explicam o fenômeno, segundo analistas. De janeiro a julho, os bens duráveis subiram 1,1%, bem menos que os 3,26% registrados pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo - 15 (IPCA). Segundo números do economista Fábio Ramos, da Quest Investimentos, os grupos de eletrônicos, com deflação de 4,7% no período, e de autos, com tombo de 0,5%, puxam a inflação de duráveis para baixo.

O comportamento recente dos preços de automóveis surpreendeu os analistas. Com o fim dos estímulos fiscais no segundo trimestre, a expectativa era de que haveria uma alta mais significativa das cotações. No IPCA-15, que mostra a evolução dos preços entre a segunda quinzena do mês anterior e a primeira do mês de referência, os veículos novos subiram 1,57% em maio e 0,04% em junho, voltando ao terreno negativo em julho, quando houve queda de 1,16%. Em 2009, os preços haviam recuado 6,8%, na esteira da redução do IPI.

Para Ramos, o nível elevado de estoques do setor é um fator importante para explicar esse resultado. Entre março e junho, os inventários de automóveis cresceram 57%, atingindo 318,8 mil unidades. "O segmento tenta desovar os estoques. Há notícias de feirões de automóveis."

O economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles, também vai nessa linha. "O setor está muito estocado. Talvez tenha havido exagero nas estimativas sobre a demanda."

Também contemplados com a redução do IPI, alguns eletrodomésticos da linha branca mostraram comportamento diverso dos automóveis. Depois do fim dos incentivos fiscais em 31 de janeiro, os preços de refrigeradores e máquinas de lavar roupa subiram, acumulando alta de 9,73% e 7,36% no ano, pela ordem. Segundo Teles, os preços desses bens subiram em grande parte porque haviam caído em 2009, em função da redução do IPI. Os refrigeradores tiveram deflação de 6,9% no ano passado. "Esse é o movimento normal. Não tenho informação quanto a estoques no setor, mas o resultado sugere condições de mercado mais equilibradas."

Para Ramos, a queda forte de preços de produtos como microcomputadores e televisores pode ser explicada em parte pela evolução tecnológica, que ajuda a baratear os bens. De janeiro a julho, as cotações dos micros caíram 5,08%, enquanto os aparelhos de DVDs tiveram baixa de 3,88%, sempre de acordo com o IPCA-15. "Sáo produtos que em geral têm registrado deflação nos últimos anos", diz Teles.

O dólar barato e sem grandes oscilações nos últimos meses contribui para o comportamento benigno dos bens duráveis, por favorecer a importação de bens finais e também de componentes, destacam os analistas.

A evolução dos preços de importação em dólares também ajuda a manter os duráveis comportados, destaca Ramos. No primeiro semestre, as cotações das compras externas de bens duráveis recuaram 3,6%, segundo números da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). "É um fator que pode contribuir para segurar os preços desses produtos", concorda a analista Laura Haralyi, do Itaú Unibanco.

Ramos reduziu ontem a sua estimativa para a variação de bens duráveis neste ano, de 3,5% para 2,7%. "Espero que esse grupo suba de 0,2% a 0,3% por mês até o fim do ano", acredita ele, projetando reduções menos intensas de produtos eletrônicos daqui para frente. "Mas é possível que seja até algo mais baixo. Não acredito em deflação, mas a alta média mensal pode ser mais para 0,1% a 0,2% do que para 0,2% a 0,3%", diz Ramos, para quem as cotações de veículos podem ter alguma até até o fim do ano. Para o IPCA "cheio", ele espera uma alta de 5,3% no ano, ainda acima do centro da meta, de 4,5%.