Título: Pastas de ex-ministros candidatos acumulam irregularidades
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2010, Política, p. A7

A prisão pela Polícia Federal, na quinta-feira, do superintendente regional do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) no Ceará, Joaquim Guedes Neto, acusado de participar de um esquema de fraude de licitações para beneficiar a Delta Construções, é mais um exemplo de problemas enfrentados por ministros que assumiram o cargo em março, depois das desincompatibilizações. O Dnit é ligado diretamente ao Ministério dos Transportes, comandado atualmente por Paulo Sérgio Passos. Passos assumiu em março, no lugar de Alfredo Nascimento (PR), que deixou a Pasta para concorrer ao governo do Amazonas.

Há duas semanas, o governo demitiu parte da diretoria dos Correios por ineficiência administrativa. A decisão foi tomada após Hélio Costa (PMDB) deixar o Ministério das Comunicações para concorrer ao governo de Minas. O ex-presidente da estatal, Carlos Henrique Custódio, não conseguiu resolver o impasse com os franqueados, não abriu concursos para repor vagas e não solucionou os gargalos na entrega das correspondências no Nordeste.

A demissão foi uma decisão conjunta do presidente Lula, da chefe da Casa Civil, ministra Erenice Guerra e do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. "Não dava para comandar os Correios a partir do Palácio do Planalto", disse uma auxiliar do presidente. Na quinta-feira, o atual presidente da estatal, David José de Mattos, adiou para novembro a realização do concurso público. A troca, porém, não preservou os Correios da administração política. Estava com o PMDB de Hélio Costa e passou, com Mattos, ao PMDB de Tadeu Filipelli (DF), ao PTB de Gim ARgello (DF), e ao PT de Erenice Guerra (Casa Civil).

No caso do Ministério dos Transportes, Paulo Sérgio Passos terá que defrontar-se ainda com outros problemas. O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou irregularidades na duplicação da BR-452, ligando as cidades goianas de Itumbiara e Bom Jesus e nas obras da BR 101/NE nas fronteiras da Paraíba com o Rio Grande do Norte e com Pernambuco. O mesmo tribunal havia apontado, em fevereiro, uma suspeita de superfaturamento nas obras da Ferrovias Transnordestina, no trecho ligando as cidades de Aguiarnópolis e Palmas (ambas em Tocantins). A denúncia envolvia a Valec, estatal criada para administrar a construção da ferrovia e a construtora Norberto Odebrecht, vencedora da licitação.

As pendências deixadas pelos ex-ministros aos sucessores não se limitam ao Ministério dos Transportes e Comunicações. No Ministério da Agricultura, o TCU detectou um colapso no sistema de armazenagem de grãos pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Como publicado pelo Valor em fevereiro, os técnicos do tribunal encontraram uma "estrutura sucateada, falta de gestão e controle sobre ativos armazenados e diferenças graves nos volumes contabilizados pela matriz da estatal e suas superintendências regionais nos Estados".

A auditoria revelou a contratação irregular de empresas de armazenamento inscritas no cadastro de inadimplentes da União, além de prejuízos aos cofres públicos causados pela perda de recursos em processos de desvios de estoques públicos.

A situação da Conab e do Ministério da Agricultura é peculiar. O ex-ministro Reinhold Stephanes (PMDB) deixou a Pasta em março para concorrer à reeleição à Câmara pelo Paraná. Em seu lugar, assumiu o também pemedebista Wagner Rossi. Ele é afilhado político do candidato a vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff, Michel Temer (PMDB-SP). E era presidente da Conab quando o TCU apontou os problemas na armazenagem de grãos pela estatal.

Rossi e Temer protagonizaram uma cena curiosa durante cerimônia na sede da Embrapa, em Brasília. Rossi discursou sobre a importância da empresa estatal de pesquisa agropecuária para o desenvolvimento do Brasil e do mundo. Apresentou vários números com o desempenho da Agricultura durante o governo Lula, comparando o setor com os oito anos de governo Fernando Henrique Cardoso e disse que "falar sobre o campo" causava-lhe profunda emoção. Logo em seguida, a palavra foi passada ao mentor político da indicação, Michel Temer. "Meu caro Rossi, estou surpreso com o conhecimento que você tem desta área".